Brasileiro é preso pela imigração nos EUA enquanto buscava a filha na escola, e esposa grávida denuncia abuso: “É desumano”

Guilherme foi preso no dia 11 de julho. Sua esposa americana revelou como tudo aconteceu e destacou as atitudes dos agentes

O artista goiano Guilherme Lemes Cardoso e Silva, de 35 anos, foi detido pela imigração dos Estados Unidos no dia 11 de julho, em Sausalito, na Califórnia, onde vive com a esposa e a filha. Ele estava a caminho da escola para buscar a menina quando foi abordado por agentes da ICE (Serviço de Imigração e Alfândega dos EUA). Segundo a família, Guilherme foi preso sem mandado judicial por “suposta irregularidade em seu status migratório”.

Desde a prisão, o brasileiro está em um centro de detenção em Tacoma, no estado de Washington. A esposa dele, a maquiadora estadunidense Rachel Leidig, de 35 anos, está grávida de sete meses e se mostrou profundamente abalada com a situação. “Eu estava no trabalho quando recebi uma ligação do centro de detenção do ICE. Era o Gui — meu coração gelou”, contou ela à revista CRESCER.

De acordo com Rachel, os agentes abordaram o marido de forma agressiva: “Ele foi surpreendido por seis ou sete carros. Uma agente da ICE abriu a porta do carro dele e ordenou que saísse, dizendo que havia um mandado de prisão. Gui pediu para ver o mandado, mas ela respondeu que não precisava mostrar. Um outro agente o puxou para fora do carro, tomou seu celular — já que ele estava gravando a abordagem — e o empurrou contra o veículo para algemá-lo”. 

Rachel está grávida. (Foto: Arquivo pessoal)

Rachel afirmou que os agentes zombaram de Guilherme durante a ação. “Os agentes foram agressivos com ele até perceberem que Gui era uma pessoa instruída, trilíngue, e que exigia respeito. Durante todo o trajeto, os agentes continuaram fazendo piadas entre si, tirando fotos de Gui, além de lhe fazerem perguntas sobre sua vida pessoal e seu trabalho“, lamentou.

Depois da prisão, Guilherme foi transferido para Ferndale, onde passou dois dias sob condições degradantes. “As condições eram terríveis. Gui foi colocado com correntes que iam dos tornozelos aos pulsos, dormiu no chão e chegou a vomitar por causa da comida que lhe foi oferecida. Por lei, a ICE poderia mantê-lo nessas condições temporárias por até 12 horas, mas ele só foi transferido para o centro de detenção de Tacoma após 38 horas”, disse a esposa.

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A família contou que a própria justificativa para a detenção foi confusa. “Em seguida, um agente entrou e disse que não haviam encontrado nenhum mandado de prisão, mas que o visto de trabalho de Gui estava vencido. Depois, outro agente apareceu e afirmou que ele havia sido detido porque o visto de turismo havia expirado. Ele recebeu muita desinformação. Ele [Guilherme] não está no melhor estado mental, mas está se mantendo forte”, explicou Rachel.

O brasileiro foi preso no dia 11 de julho. (Foto: Arquivo pessoal)

No dia 18 de julho, Rachel conseguiu visitar o marido no centro de detenção. A experiência, segundo ela, foi marcada por maus-tratos e desorganização. “O tratamento geral foi terrível, e os agentes com quem lidei foram rudes e desrespeitosos”, disse.

Um dos funcionários teria se recusado a entregar os pertences do brasileiro, e ela precisou acionar o supervisor: “O ICE e aqueles que trabalham com o centro de detenção são tão desorganizados que cada interação com o sistema deles me faz sentir como se estivesse encurralada, batendo a cabeça contra a parede. Quando recebi os pertences do Gui, o telefone dele, que usou para gravar a abordagem, tinha ‘desaparecido'”. 

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Além do estresse emocional, Rachel contou que a situação tem gerado uma série de dificuldades práticas: “Sem apoio externo, é quase impossível para alguém navegar pelo sistema de imigração e receber o devido processo legal, que todos merecem. Isso é desumano, muitas dessas pessoas não são criminosas e estão sendo mantidas como animais enjaulados. Meu coração está partido pela injustiça diante dos meus olhos”.

Nos últimos meses, os EUA intensificaram medidas mais duras contra imigrantes. O país vem operando com centros de detenção superlotados e políticas de deportação acelerada. Um boletim legislativo do Immigration Forum, publicado em 27 de junho de 2025, apontou que a ICE chegou a 59 mil imigrantes detidos, operando a mais de 140% da capacidade autorizada (de 41.500 leitos).

Dados internos também indicam que quase metade dos detidos não tem antecedentes criminais, e menos de 30% foram condenados por algum crime, um contraste com a promessa do governo de priorizar a deportação de criminosos perigosos.

O parto da estadunidense será em outubro. (Foto: Arquivo pessoal)

Desde a prisão do marido, Rachel disse ter se dedicado integralmente à tentativa de tirá-lo da prisão. “Dediquei-me integralmente à pesquisa. Tive que me ausentar do trabalho. Tenho estado extremamente estressada e assustada, tentando me manter forte, mas também preocupada com a segurança do Gui e fazendo tudo o que posso para garantir que tenhamos a melhor chance de enfrentar o ICE”, afirmou. Guilherme tem uma audiência marcada para o dia 29 de julho, e a família espera que ele possa ser liberado mediante pagamento de fiança.

Além do impacto emocional, a gravidez de Rachel também tem sido atravessada por angústias. O bebê do casal está previsto para nascer no dia 25 de outubro: “Este é meu primeiro filho. Não quero receber nosso filho neste mundo sozinha. Não quero ter que criar meu filho sem o pai. Este deveria ser um momento feliz na minha vida, mas estou cheia de tristeza por não ter meu marido ao meu lado, vivenciando este momento comigo”.  

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Para Rachel, o caso do marido reflete falhas estruturais graves na política migratória dos Estados Unidos: “O sistema de imigração nos EUA está quebrado. O presidente está dizendo que está tentando deter e deportar criminosos, o que é mentira. Gui não é um criminoso, eles não tinham um mandado de prisão contra ele e ele não tem antecedentes criminais. Estávamos em processo e agora solicitamos oficialmente o green card dele”.

Ela afirmou que o marido é uma pessoa querida na comunidade onde vivem. “Ele é pai, marido e um artista visual talentoso e trabalhador. Gui é uma pessoa incrível, sua comunidade o ama. Isso parece mais racismo direcionado em nome de Trump. O ICE está mirando latinos, detendo qualquer um para aumentar seus números de detentos”, acrescentou.

As perseguições contra imigrantes vêm ocorrendo durante o governo de Trump. (Foto: Getty)

Rachel e Guilherme se conheceram em agosto de 2023, apresentados por um amigo em comum. Em fevereiro deste ano, ela descobriu a gravidez: “Fiquei animada, sempre quis ser mãe. Me concentrei na minha carreira durante a maior parte da minha vida adulta. Sou da Califórnia, mas morei em Nova York por dez anos. Voltei para a Califórnia pouco antes de conhecer o Gui, sabendo que queria um ritmo de vida mais tranquilo e uma família. Mal posso esperar para ser mãe, sinto que nasci para isso”.

O casal oficializou a união em 21 de abril deste ano, e iniciou o processo de legalização logo em seguida. “Eu entrei com uma petição para um I-130 (reivindicando um parente estrangeiro) no dia em que Guilherme foi detido [em 11 de julho] e o pedido oficial I-485 para um green card foi oficialmente protocolado na semana passada”, afirmou.

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Para ajudar com os custos legais do caso de Guilherme, uma amiga de Rachel criou uma vaquinha online na plataforma GoFundMe: “Enfrentar o sistema de imigração nos Estados Unidos é extremamente caro — é um sistema corrupto, e você precisa de uma equipe jurídica forte ao seu lado para ter qualquer chance de apresentar um caso sólido”.

“Além disso, temos um bebê a caminho. Desde que o Gui foi detido, não consegui trabalhar, porque lutar pela libertação dele e divulgar o que está acontecendo se tornou um trabalho em tempo integral. O Gui também está sem renda enquanto está detido. Somos imensamente gratos pelo apoio da nossa comunidade e de pessoas desconhecidas. Não estaríamos conseguindo fazer nada disso sem eles”, concluiu.

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