Desde que as notícias sobre o coronavírus se espalharam, a procura pelo filme “Contágio”, de 2011, disparou na internet. De acordo com o The Verge, em sites de torrent, a busca pelo longa aumentou mais de 12.500% em janeiro. Já em serviços de streaming oficiais, como no iTunes norte-americano, o filme é o nono mais alugado da semana, antes de “Frozen 2”, “Entre Facas e Segredos” e “Era Uma Vez Em… Hollywood”.
Na produção, dirigida por Steven Soderbergh e estrelada por nomes como Matt Damon, Gwyneth Paltrow, Kate Winslet e Jude Law, uma pandemia mortal toma conta do mundo. A história segue um grupo de personagens, que precisam se proteger de um vírus perigoso. A primeira paciente é Paltrow, que é infectada após fazer uma viagem de negócios para Hong Kong. Ela morre após ter uma convulsão nos braços de seu marido (Damon), que entra em quarentena. Winslet interpreta a médica especializada em doenças infecciosas. Já Law é um blogueiro com um esquema para lucrar em cima das pessoas mais vulneráveis.
Apesar da doença do filme ser muito mais grave do que a Covid-19, há diversos paralelos entre a ficção e a realidade. Em uma cena, o médico Sanjay Gupta interpreta a si mesmo e discute em um programa de TV os meios de prevenção. Agora, 11 anos depois, ele fez a mesma coisa, desta vez no mundo real, para a CNN.
Em entrevista à Variety, o roteirista do filme, Scott Z. Burns, falou sobre os bastidores de “Contágio” e o que ele aprendeu com o Centro de Controle de Doenças e Prevenção dos Estados Unidos sobre uma pandemia.
De acordo com Burns, ele passou dois ou três anos fazendo pesquisas relacionadas à ciência para escrever o roteiro do projeto. O escritor entrou em contato com epidemiologistas e virologistas. “Passei muito tempo conversando sobre como os vírus funcionam, e onde o próximo provavelmente apareceria no mundo”, revelou. O que mais o deixou pensativo neste estágio de colher informações, foi o fato de seres humanos estarem entrando em zonas que, até então, eram selvagens: “Quando cortamos árvores e invadimos o habitat onde os humanos ainda não viveram, isso nos coloca em contato com micróbios e animais, além de uma série de outros fatores que podem trafegar nessas doenças. Há vírus na vida selvagem que não afetam seres humanos. Mas se eles forem bem-sucedidos em morcegos ou porcos — mamíferos que tem temperatura corporal semelhante e outros atributos que seres humanos têm —, eles frequentemente usam isso como um ponto intermediário a caminho da população humana. Eu não dei valor completo a este caminho até começar a fazer a pesquisa”.
Burns também falou sobre a importância da saúde pública. “Tem muito a ver com a nossa obrigação uns com os outros. A ciência é ótima, mas o que também é ótimo é a responsabilidade compartilhada de mantermos uns aos outros saudáveis. Eu acho que essa é uma mensagem realmente importante, que eu espero que saia do filme. Se todos nós lavarmos nossas mãos, observarmos uma distância social e cuidarmos uns dos outros, isso faz mais do que quase qualquer coisa”, garantiu.
Ele foi bastante crítico à decisão do presidente norte-americano Donald Trump de cortar o orçamento do Centro de Controle de Doenças e Prevenção. “Fiquei apavorado. Todo cientista com quem eu falei quando trabalhei no filme, disse exatamente a mesma coisa pra mim: não é questão de ‘se’, mas de ‘quando’. Você pode convir que, na maior parte do tempo, os bombeiros vão ficar apenas sentados. Mas é muito difícil começar um departamento de bombeiros depois que a casa já está pegando fogo. Então, a noção de que nós vamos cortar essas coisas e vamos apenas tentar reconstruí-las quando nós precisarmos, é tola e perigosa”, afirmou.
Durante a criação do roteiro, era muito importante para Burns que ele e o diretor, ao lado dos cientistas, tentassem imaginar como se daria uma pandemia. No entanto, algo que ele não pensou, e aconteceu na vida real, é que a atual administração dos Estados Unidos cortaria o orçamento da ciência, e ainda tentaria “desacreditar” funcionários da área da saúde pública. “Isso é algo que, como roteirista, eu nunca poderia ter antecipado”, disse.
Para completar, Burns revelou o que está fazendo para se proteger do coronavírus: “Estou fazendo o que os médicos recomendam. Tenho lavado minhas mãos frequentemente. Estou evitando grandes aglomerações de gente. E eu acho que isso é tudo que nós podemos fazer até solucionar [o problema]. Infelizmente, porque a nossa resposta [à doença] foi atrasada, nós estamos bem para trás. E para completar, temos oficiais do governo dizendo que isto não é um problema, ou que não é uma coisa ruim.”
O roteirista terminou a conversa revelando do que tem mais medo no avanço da doença. “Eu acho que a parte assustadora é que, apesar de você poder dizer que a taxa de mortalidade é em torno de 1%, se 10 milhões de pessoas ficarem doentes, é muita gente que vai morrer. A maioria deles, mesmo que seja idosa, algumas das minhas pessoas favoritas tem mais de 70 anos. E nós precisamos protegê-las”, deixou o recado.