Phelipe Ferreira, um dos brasileiros vítimas de tráfico humano em Mianmar, usou as redes sociais para relatar sua fuga e confirmar que está na Tailândia, aguardando a repatriação. Ele e Luckas Viana dos Santos escaparam na madrugada de domingo com a ajuda da ONG “The Exodus Road” e do Exército Democrático Karen Budista (DKBA), um grupo armado formado por dissidentes das Forças Armadas locais.
De acordo com a coordenadora da organização, Cíntia Meirelles, os criminosos, ligados à máfia chinesa forçavam os reféns a aplicarem golpes financeiros, estabelecendo uma meta mensal de US$ 100 mil (aproximadamente R$ 576 mil). Quem não atingisse o valor era submetido a torturas físicas e psicológicas, incluindo choques elétricos e jornadas de trabalho de mais de 18 horas.
“Só avisando para vocês que eu e o Luckas estamos bem. A gente está aguardando a nossa repatriação aqui na base militar da Tailândia. Passando para agradecer a todo mundo que orou por nós e torceu por nós. Sem a oração e a ajuda de vocês, não teríamos conseguido”, disse Phelipe.
O jovem contou que ele e Luckas estão esperando até amanhã para serem levados à Bangkok pela embaixada: “Pessoal que está me mandando mensagens, eu não consigo responder todo mundo porque estou sem celular. Estou pegando o celular de algumas pessoas aqui para entrar em contato com a minha família. Quando eu conseguir chegar ao Brasil, eu respondo todo mundo e explico como foi, para quem tiver curiosidade. Nós estamos bem, eu e o Luckas. Ele agora está descansando um pouco. Amanhã, a embaixada vem buscar a gente para irmos para Bangkok e, depois, aguardarmos as documentações”.
Brasileiro resgatado de tráfico humano em Mianmar posta primeiro registro após fuga pic.twitter.com/rC9HzelIh6
— WWLBD ✌🏻 (@whatwouldlbdo) February 14, 2025
A gravação foi postada nos stories do Instagram do Phelipe e também compartilhada no TikTok por um amigo. Conforme relataram familiares, Phelipe e Luckas estão na cidade de Mae Sot, na Tailândia, hospedados em um hotel próximo à embaixada brasileira.
Como aconteceu a fuga
Phelipe Ferreira avisou ao pai que tentaria escapar no fim de semana. Por mensagens enviadas, ele detalhou o plano: atravessar um rio com outras 85 pessoas e correr por dois quilômetros. Ele pediu orações e se despediu, caso algo desse errado. Veja:

“Ora por mim e pede para minha vó, Iorrana e todo mundo orar por nós para que tudo dê certo. São 85 pessoas. Eu só quero que tudo dê certo. Eu te amo, pai. Se acontecer algo comigo, saiba que eu tentei ao máximo”, escreveu.
Antônio Carlos Ferreira, pai de Phelipe, contou que o filho conseguiu enviar mensagens por um número desconhecido, quando a máfia não o monitorava. “Ele me avisou sobre a fuga e a ONG também. Estávamos só na expectativa e, graças a Deus, o meu filho foi resgatado. Estou muito feliz, muito feliz mesmo. Você não sabe o que estou sentindo neste momento”, disse Antônio ao g1.
Cleide Viana, mãe de Luckas, também se mostrou aliviada, mas destacou que ainda há questões legais a serem resolvidas: “Graças a Deus, ele foi resgatado. Agora, temos uma outra etapa, porque a gente precisa de ajuda das autoridades para novos passaportes. Eles fugiram e receberam a ajuda da ONG para conseguirem sair de novo da máfia, mas eles não têm passaporte e não podem ficar como ilegais no país”.

Em nota, o Itamaraty expressou sua satisfação pela liberação dos dois brasileiros. “O Itamaraty, por meio de suas Embaixadas em Yangon, no Myanmar, e em Bangkok, na Tailândia, vinha solicitando os esforços das autoridades competentes, desde outubro do ano passado, para a liberação dos nacionais. O tema foi também tratado pela Embaixadora Maria Laura da Rocha, na ocasião na qualidade de Ministra substituta, durante a IV Sessão de Consultas Políticas Brasil-Myanmar, realizada em Brasília, em 28 de janeiro último. Em suas gestões, a Embaixadora Maria Laura da Rocha reforçou a necessidade de esforços contínuos para localizá-los e resgatá-los”, diz o comunicado.
Relembre o caso
Em outubro de 2024, os brasileiros Luckas Viana dos Santos e Phelipe de Moura Ferreira se viram vítimas de tráfico humano em Mianmar após aceitarem uma proposta de emprego internacional. Eles foram sequestrados rumo a uma “fábrica de golpes” no país asiático. Os brasileiros contaram que tinham uma rotina de mais de 15 horas de trabalho forçado, sob ameaças e castigos.
“Compartilhe fotos minhas em todas as redes sociais, minha vida corre perigo. Fale a todos o que aconteceu, todos precisam saber”, escreveu Luckas para os familiares. Em outra mensagem, ele contou que foi punido com choques, após descobrirem um de seus pedidos de socorro: “Só quero ir embora. Me ajude, tenho muito medo de morrer. Faz dois dias que não tomo banho. Nós trabalhamos mais de 15 horas por dia. Isso não é vida, não sei o que fazer. Eu quero ir embora ou morrer”.


“Eles agridem a gente toda hora. Nem falar comigo ele (Luckas) pode, porque eles proibiram desde que eu cheguei aqui. Nos falamos escondidos. Também não podemos demonstrar tristeza, senão nos punem. Se eu sumir já sabe que fizeram algo comigo. Só por favor não manda mensagem para os chineses, não quero que ninguém mais se machuque”, contou Phelipe para a sua irmã em dezembro.
“Eles vão tirar nossos órgãos. Como ficar calmo assim?”, escreveu Phelipe ao pai. Antônio revelou que o filho implorava para que o resgate chegasse logo, no entanto, ele se sentia “impotente” diante da falta de informações sobre o que estava sendo feito por parte das autoridades brasileiras e locais. Phelipe ainda contou à Antônio que acreditava que ele e Luckas seriam vendidos: “Eles tiraram umas fotos nossas. Acho que vão vender a gente”.
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