Caso Isabele: Menina atirou em amiga intencionalmente, diz polícia; Pai é indiciado por quatro crimes

Reviravolta no caso de Isabele Guimarães Ramos, morta com um tiro na cabeça no dia 12 de julho, com apenas 14 anos. Nesta quarta-feira (2), a Polícia Civil de Mato Grosso encerrou as investigações, e concluiu que o tiro não foi acidental, como a amiga da adolescente, e principal suspeita do crime, alegou inicialmente. Pelo contrário, as autoridades acreditam que a jovem tinha, sim, intenção de matar Isabele.

Para os delegados da Delegacia Especializada do Adolescente (DEA) e da Delegacia Especializada de Defesa da Criança e do Adolescente, a menina, que também tem 14 anos, teria carregado a arma, apontado para o rosto de Isabele a uma distância entre 20 e 30 centímetros, e atirado. “A adolescente, que é praticante de tiro esportivo, afirmou que, ao guardar as armas, uma delas teria caído e disparado. Segundo laudo, o estojo na verdade, estava em cima da cama e a menor teria ido com a arma carregada até a amiga”, explicou Wagner Bassi, delegado da DEA.

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“Considerando as incompatibilidades de todas as versões apresentadas pela adolescente na sequência dos fatos, a conduta da adolescente é dolosa (quando há a intenção de matar)”, completou. A Polícia Civil autuou a adolescente por ato infracionário análogo a homicídio doloso. O pai da jovem foi indiciado sob suspeita de homicídio culposo (sem intenção de matar), além de outros três crimes: posse de arma de fogo, por entregar a arma para a filha adolescente e fraude processual. As penas somadas podem totalizar 14 anos de detenção, além de multas.

Isabele Guimarães, de apenas 14 anos, foi morta após levar um tiro no rosto, enquanto estava na casa de sua amiga. (Foto: Reprodução/Instagram)

Outros detalhes sobre as investigações também vieram à tona. De acordo com as autoridades, três ligações foram feitas para o SAMU (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência), e apenas na terceira tentativa foi dito que Isabele tinha levado um tiro. Nas outras vezes, foi relatado que a adolescente caiu no banheiro. Em depoimento, a jovem que atirou contra Isabele contou que o tiro teria sido um acidente, após o estojo com as armas cair no chão. Porém, a perícia identificou que não há sangue no objeto, logo foi descartado que o estojo estivesse na cena do crime.

Reconstituição

O inquérito usou como base as imagens do circuito interno de segurança e os depoimentos dos envolvidos. O namorado da adolescente que atirou em Isabele agora é tratado apenas como testemunha. O rapaz foi até a casa da garota para que o sogro fizesse a manutenção de duas armas, sendo uma delas a utilizada na morte de Ramos. O garoto inseriu o carregador na arma, sem que a namorada o visse, e a guardou no estojo por volta das 21h50, e deixou a residência às 21h59.

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As imagens mostram que a adolescente pega o estojo fechado na sala da sua casa, vai para o quarto e deixa o objeto em cima da televisão. No banheiro, Isabele fumava um cigarro eletrônico escondido. A investigação indica que as duas ficaram no banheiro durante 1 minuto e 18 segundos. “Nesse intervalo de tempo, acontece um disparo”, explica Wagner Bassi.

A assessoria da defesa da família alegou que não teve acesso aos relatórios divulgados pelas autoridades nesta quarta-feira (2), mas declara que o indiciamento “não reflete a real dinâmica dos fatos”. O principal argumento do advogado Artur Osti consiste na mudança da posição do corpo de Isabele no momento em que recebia os primeiros socorros, o que segundo ele, afetou o trabalho da perícia.

Relembre o caso

Isabele Guimarães Ramos estava na casa de uma amiga em 12 de julho, num condomínio de luxo em Cuiabá, Mato Grosso, quando levou um tiro no crânio e veio a óbito. O caso, até então, seguia com muitas dúvidas e poucas respostas. De acordo com a adolescente suspeita de efetuar o disparo, a pistola teria sido acionada quando ela guardava a arma para seu pai –  negando que estivesse brincando com o objeto, ou tentando mostrá-lo para a amiga.

Segundo Rodrigo Pouso, advogado da família da jovem suspeita, o pai da adolescente estava na parte inferior de sua casa, e pediu para que a filha guardasse a pistola no andar superior, local onde estava Isabele. “Ela não atirou e em nenhum momento apontou. Foi um disparo acidental quando ela estava guardando a arma. A arma estava na casa porque o pai da adolescente ia testar para ver se compraria. Todas as outras armas são legais”, afirmou. Outras sete armas foram encontradas na casa em que Isabele faleceu.

A melhor amiga de Isabele Guimarães, também de 14 anos, teria disparado a arma e ocasionado a morte da jovem. (Foto: Reprodução/TV Globo)

“Tiro acidental” descartado

Na véspera de um mês da morte de Isabele Guimarães Ramos, foi divulgado o laudo oficial de balística da Perícia Oficial e Identificação Técnica (Politec), de Cuiabá. Segundo o G1, o disparo que tirou a vida da jovem de 14 anos não foi realizado sem que o gatilho fosse puxado – o que difere de versões anteriores sobre o caso. Segundo o laudo, assinado pelo perito Reinaldo Hiroshi dos Santos, a arma de fogo utilizada não pode produzir um tiro acidental.

Ao invés disso, a arma – da forma como foi recebida pela perícia – só se mostrou capaz de produzir um tiro ao estar carregada de munição, engatilhada, destravada e somente dispararia após o acionamento do gatilho. Todavia, o documento atestou que a arma AFQ1 tinha mecanismos incompletos ou deficientes, e contava com diversas modificações.

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De acordo com o portal de notícias, a perícia fez alguns testes para verificar se a versão da jovem – sobre o suposto “acidente” – seria possível. Para isso, inseriram um cartucho sem projétil e pólvora na câmera de carregamento da arma. Além disso, a arma AFQ1 foi balançada ao ar livre de diversas maneiras e posições, sendo também impactada contra uma superfície emborrachada. Após a testagem, veio o resultado de que o disparo não poderia ter sido “acidental”.

Entretanto, para a balística, há uma diferença entre “tiro acidental” e “tiro involuntário”. O tiro acidental ocorre quando o mecanismo de disparo – e o gatilho – não são acionados regularmente no momento do disparo. Já o tiro involuntário usa do mecanismo de disparo, mesmo que a ação não tenha sido intencional. Ou seja, existia a possibilidade da arma responsável pela morte de Isabele ter sido disparada involuntariamente – mas não de forma acidental.

Família de suspeita praticava tiro esportivo

Tanto a adolescente que teria feito o disparo, quanto sua família, são praticantes de tiro esportivo. Segundo o G1, a Federação de Tiro de Mato Grosso (FTMT) afirmou que a suspeita pela morte de Isabele pratica o tiro há, pelo menos, três anos. Os nomes dela e de seu pai aparecem em “squads” (ou grupos) que participavam de competições da organização nos últimos anos, e eles estavam presentes em aulas.

Desde sua trágica morte, Isabele Guimarães Ramos tem recebido uma série de homenagens. (Foto: Reprodução/Arquivo Pessoal)

Além deles, outros membros da família também participavam desses grupos de tiro, e seriam praticantes ativos do esporte, assim como o namorado da adolescente que teria efetuado o disparo. Apesar da afirmação da FTMT, o advogado da família alega que a jovem amiga de Isabele praticava o esporte há apenas três meses.

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Após o trágico episódio, o pai da adolescente suspeita foi preso em flagrante e indiciado pela Polícia Civil por posse e porte ilegal de arma, e também por ter fornecido a arma para a filha. Sua fiança teve o valor alterado diversas vezes. Ele pagou a quantia final – que não foi revelada pelas autoridades – e foi solto.

Sangue humano identificado nas peças de roupa

Em agosto, a perícia realizada pela Polícia Civil identificou marcas de sangue nas roupas da amiga da adolescente, que é a principal suspeita de ter atirado contra a vítima. Um top cropped que era usado pela jovem suspeita na ocasião foi examinado detalhadamente ao que constataram pequenas marcas de sangue. “Amostras colhidas de uma das manchas pardo-amarronzadas da blusa descrita em ‘A’ (cropped) e de uma porção posterior da barra da saia descrita em ‘C’ apresentaram resultado positivo para a presença de sangue humano”, diz um trecho do laudo que o portal G1 teve acesso.

Pequenas manchas no top foram analisadas, e o resultado identificou que se tratava de sangue humano. Foto: Reprodução.

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As peças de roupa foram entregues às autoridades pela mãe do namorado da suspeita. O advogado de defesa da adolescente investigada relatou que a jovem e sua irmã foram para a casa do rapaz, localizada no mesmo condomínio, depois que tudo aconteceu. Lá, a adolescente trocou de roupa e tomou banho, alegando que estava “se sentindo sufocada”.

Peças foram deixadas na casa do namorado da adolescente que atirou em Isabele. Foto: Reprodução.