Família sentiu “gosto estranho” em bolo antes de passar mal, no RS; reportagem aponta atitude de autora do doce

Delegado responsável pelo caso revelou que produtos do bolo podem ter sido reutilizados após apagão

O viúvo de Maida Berenice Flores da Silva, uma das três pessoas que morreram após comer um bolo durante uma confraternização familiar em Torres (RS), relatou ao “Fantástico” deste domingo (29) que nenhum dos parentes acredita que a responsável pelo preparo, Zeli dos Anjos, tenha premeditado as mortes.

Como toda família, existem divergências. Mas são divergências que, pelo que foi apurado até o momento, são muito pequenas. Nessa fase da investigação, nós não temos a convicção de que possa ter ocorrido um crime doloso“, declarou o delegado Marcos Vinicius Veloso, da Polícia Civil do estado.

Jefferson e Maida estavam casados há cerca de 30 anos, eram professores e se mudaram para Torres após a aposentadoria. Ela foi a primeira pessoa a morrer após comer o bolo. Jefferson teve sintomas mais leves e foi liberado logo depois. Contudo, a reportagem do “Fantástico” o encontrou no hospital da cidade para uma consulta, pois ainda sentia sintomas de intoxicação.

Segundo ele, a família prefere não gravar entrevistas. Uma vizinha, por sua vez, revelou que Zeli faz o bolo, com frutas cristalizadas, passas e glacê, todo Natal. “Sempre o marido que cozinhava. Ela disse que nunca foi boa de cozinha. O único doce que ela sabia fazer era o tal do bolo de reis, todo ano“, contou a comerciante Marila dos Santos.

A confraternização foi em um apartamento onde Maida morava com Jefferson. Zeli preparou o bolo no dia 23, antes do Natal. Três pessoas morreram: as irmãs dela, Maida e Neuza, e a sobrinha Tatiana. João, marido de Neuza e pai de Tatiana, não comeu o doce. O neto dele, de 10 anos, continua internado. Zeli também permanece internada. O delegado disse que aguarda a recuperação dela para um novo depoimento e tentar entender o que aconteceu no dia da preparação do bolo.

Três pessoas morreram após comerem o bolo, em Torres. (Foto: Reprodução/TV Globo)

Informações divulgadas pela polícia sobre os resultados dos exames iniciais revelaram a presença de arsênio no sangue de Zeli, de Neuza e do filho de Tatiana. Em nota, o Instituto Geral de Perícias relatou que essas informações não são oficiais. A polícia ainda aguarda os resultados de todos os exames para a confirmação, bem como a presença de outra substância nociva ao corpo humano.

Ao jornalístico, o presidente da Sociedade Brasileira de Toxicologia, Rafael Lanaro, explicou que o arsênio está presente naturalmente em alimentos, mas em quantidades que não são consideradas perigosas. “Não se tem relatos de casos de intoxicação pela forma orgânica, que são aquelas encontradas em frutos do mar. Em peixes, principalmente“, detalhou Lanaro. A substância também é utilizada em painéis solares e luzes LED, bem como na medicina, para tratamento oncológico.

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Apagão e produtos estragados

O delegado Marcos Vinicius explicou que, de acordo com depoimentos, houve um apagão em Arroio do Sal, cidade da responsável pelo bolo. Sem energia, muitos itens da geladeira dela estragaram, entretanto, alguns teriam sido reaproveitados. “Segundo o que nós estamos verificando nas investigações, alguns desses itens, como uvas passas e frutas cristalizadas, podem ter sido reutilizados no bolo. Isso um mês depois“, contou.

Marcos Vinicius informou que ainda é preciso aprofundar as investigações para entender se esse seria o motivo de ter sido encontrado arsênio no sangue das vítimas e da própria autora do doce. “Quem comia, logo sentia o gosto estranho. Tão logo o menino de 10 anos comeu e também reclamou do sabor, ela colocou a mão em cima do bolo e falou: ‘Agora ninguém mais come’. E as pessoas começaram a passar mal naquele momento“, disse o delegado.

Zeli com as duas irmãs, Maida e Neuza, e o marido falecido. (Foto: Reprodução/Redes Sociais)

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Exumação do marido

Zeli, de 61 anos, mudou-se com o marido, Paulo, para a casa de veraneio em Arroio do Sal após as enchentes de maio atingirem a sua residência em Canoas. Segundo outro vizinho, a convivência era “muito boa”. “Os dois caminhavam na praia. Ele era pescador, meu amigo. Ele pescava na rede. E ele sempre passava com a esposa“, relembrou o aposentado Sérgio José de Souza.

Paulo morreu em setembro, depois de uma suposta intoxicação alimentar. Após a tragédia do bolo, a morte dele será investigada. “Ele vai ser exumado. Vai passar por uma necropsia pelos nossos peritos médicos legistas, a fim de identificar também substâncias como venenos, toxinas e mesmo medicamentos que podem ter provocado essa situação“, afirmou a perita do Instituto Geral de Perícias do estado, Lara Regina Soccol Gris.

Assista à reportagem completa:

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