Após cinco dias ouvindo 24 testemunhas (sendo 13 de acusação e 11 de defesa), a ex-deputada Flordelis começou a ser ouvida na etapa final do julgamento pela morte de seu marido, o pastor Anderson do Carmo, no fim da manhã deste sábado (12). Além dela, estão previstos outros quatro depoimentos ainda hoje.
A política foi denunciada pelo Ministério Público por arquitetar o homicídio de Anderson. Ela também foi apontada como a responsável por reunir e convencer o executor direto do crime (seu filho, Flávio dos Santos Rodrigues) e os demais acusados, a participarem do assassinato e encobertá-lo como um latrocínio.
Durante a audiência, segundo o g1, ao ser questionada sobre o que teria motivado o crime contra o pastor, Flordelis alegou que Anderson cometeu supostos abusos, inclusive contra ela. “Hoje sim. É muito difícil para mim falar, mas foi a ciência dos abusos que aconteceram dentro da minha casa”, declarou. “Ele [Anderson] era tudo para mim, ele era a minha vida. Mas eu não acreditava que ele fosse capaz de ter esse tipo de atitude, por tudo que eu fazia por ele”, continuou.
Ao longo do depoimento, a ex-deputada detalhou, aos prantos e soluços, agressões e abusos cometidos por Anderson durante as relações sexuais. “Ele me batia. Alguns filhos entravam na frente. Ele só parou de me bater quando um pastor muito amigo dele me tirou do quarto e se colocou para conversar com ele a sós”, disse ela.
“Depois ele voltou a ficar agressivo, na área sexual. Ele só sentia prazer se me machucasse, e me machucava. Ele só chegava às vias de fato se me machucasse”, pontuou. Flordelis declarou que mesmo tendo sofrido abusos nas mãos de Anderson, ela sofre muito com a morte do marido. “Metade da Flordelis morreu junto. Eu morri junto”, disse ela.
Denunciada como a mandante da execução, a ex-deputada e missionária responde por homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, emprego de meio cruel e de recurso que impossibilitou a defesa da vítima), tentativa de homicídio, uso de documento falso e associação criminosa armada. Às lágrimas, a acusada reafirmou sua inocência e insistiu que não teve envolvimento no crime. “Eu não tenho que pagar pelos erros de ninguém. Há três anos estou pagando por uma coisa que eu não fiz. Eu estou sendo chamada de mandante do assassinato da pessoa que eu mais amei nessa vida”, afirmou.
A ex-deputada também falou sobre seus filhos, que já foram condenados pelo crime, mas reforçou que não poderia confirmar, de fato, que seriam os autores do homicídio. “Eu não posso acusar ninguém, eu não estava presente no local, eu não vi. Eu não posso afirmar. Meu filho Flávio foi sentenciado e meu filho Lucas foi sentenciado”, afirmou.
Acusação
No primeiro dia do julgamento, a promotoria leu o que considera indícios da participação de Flordelis no assassinato. Entre as evidências reunidas pela acusação, foi revelado um diálogo dela com um dos filhos adotivos. A conversa é considerada por testemunhas, entre elas o delegado Alan Duarte, como prova de que a pastora preferiu cometer o crime do que se separar, para evitar escândalos na igreja.
Duarte também narrou supostas tentativas de envenenamento que não deram certo e que teriam sido promovidas por Marzy Teixeira, filha adotiva de Flordelis. O delegado afirmou que houve, ainda, uma tentativa de contratação de pistoleiros para executar o pastor.
Rayane dos Santos, neta de Flordelis, prestou depoimento após a ex-deputada. A mulher negou qualquer participação no crime, e insistiu que os depoimentos que citam que ela teria perguntado a várias pessoas da família sobre pistoleiros para matar Anderson foram fabricados. “Eu nunca entendi. Depois de assistir o depoimento deles aqui, eu cheguei numa conclusão que foi totalmente orquestrado, porque não tinha motivo nenhum para pedir o número de um bandido. Não existiu”, alegou.
Rayane então citou um incidente de abuso contra Kelly e declarou que o ocorrido deveria ter sido denunciado às autoridades. “Acho que deveria ter sido feita a coisa certa. Todo mundo se juntado, denunciado, falado”, declarou. Ela revelou, ainda, que contou sobre o episódio para Flordelis, mas que a esposa de Anderson “não acreditou”.
A mulher alegou também ter sido vítima de abusos de Anderson do Carmo. Os ataques teriam ocorrido no apartamento funcional da ex-deputada em Brasília. “No dia seguinte, eu fiquei com aquilo na cabeça, mas o medo de me abrir para alguém e eu perder a chance de estar em Brasília para trabalhar me fez ficar lá”, acrescentou. Para Rayane, tudo poderia ter sido resolvido na base do diálogo. “Se conversado poderia ter sido resolvido. Não estaria sem meus filhos, não estaria sentada aqui hoje”, emocionou-se ela.
Interrogatório
Durante o interrogatório, André Luiz, filho adotivo do casal, também se declarou inocente. O homem é acusado de homicídio, tentativa de homicídio e associação criminosa armada, mas disse não estar envolvido na morte do pastor e negou ter visto qualquer agressão física de Anderson contra Flordelis.
“Agressão física não. Meu pai era rígido ao falar”, disse André, que respondeu somente às perguntas dos advogados de defesa e dos jurados, mas não da acusação. Ao ser questionado sobre quem era seu exemplo de caráter, ele citou a ex-deputada. “Minha mãe Flor”, declarou.
Por fim, o homem reforçou que Flordelis era “completamente dependente” do marido durante o relacionamento. “Minha mãe só fazia algo se meu pai a orientasse. Ele dizia o que falar, quando falar, a quem ela deveria se aproximar, de quem ela deveria se afastar”, explicou ele.
Em seu depoimento, o homem observou que na madrugada em que o pastor foi assassinado, ele acreditou que estivessem sendo vítimas de um assalto, No entanto, André alegou ter ficado em choque com aquele momento, inclusive sem conseguir dar instruções ao Samu. “Não consigo. Ramon pega o telefone da minha mão, ele vê a minha situação e pega o telefone. Eu não consigo ver aquela situação e vou para o meu quarto”, disse ele.
O réu negou que tenha dado qualquer quantia em dinheiro para contratar um matador para cometer o crime contra o pai adotivo. Ele também disse que nunca testemunhou tentativas de envenenamento contra o pastor.
Próximos passos
Além da ex-deputada federal, são julgados ainda sua filha biológica Simone dos Santos, a neta Rayane dos Santos e os filhos afetivos André Luiz e Marzy Teixeira. Os trabalhos no plenário do Tribunal do Júri de Niterói, na Região Metropolitana do Rio, começaram hoje às 10h30 e devem ser concluídos depois que todos responderem aos questionamentos do MP, da assistência de acusação, da defesa, dos jurados e da juíza.
Marzy Teixeira da Silva, filha adotiva de Flordelis, responde por homicídio triplamente qualificado, tentativa de homicídio e associação criminosa armada. Ela teria recebido a quantia de R$ 5 mil de Simone dos Santos Rodrigues para encomendar a morte do pastor Anderson do Carmo. A investigação aponta que Marzy procurou por um matador de aluguel na internet.
Já Rayane dos Santos Oliveira, neta biológica de Flordelis e filha de Simone, responde por homicídio triplamente qualificado e associação criminosa armada. O MP afirma que a deputada não apenas encomendou a morte de Anderson, como também solicitou que a neta procurasse pessoas para assassiná-lo.
Simone dos Santos Rodrigues, filha biológica de Flordelis, responde por homicídio triplamente qualificado, tentativa de homicídio e associação criminosa armada. Em depoimento, ela confessou ter pagado R$ 5 mil pela morte do pastor, motivada pelas constantes investidas sexuais de Anderson.
Após o fim do interrogatório, o julgamento dará início aos debates entre a acusação e a defesa. Cada um terá duas horas e meia para defender a condenação ou absolvição dos réus. Caso o Ministério Público ache necessário, será permitida a réplica e tréplica, com outras duas horas para cada.
Depois dos argumentos de defesa e acusação, a juíza questionará se os jurados estão habilitados a julgar. Em caso positivo, serão formuladas as perguntas que serão votadas pelos sete jurados – quatro homens e três mulheres -, para decidir se os réus são culpados ou inocentes. O processo acontecerá em uma sala especial, na qual a magistrada, o Ministério Público, a defesa e os jurados se reunirão para as deliberações, que podem durar por tempo indeterminado.
Após a conclusão, todos retornam para a proclamação da sentença pela juíza Nearis Carvalho Arce, que deve ocorrer até este domingo (13).
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