Na semana passada, o caso do pequeno Nicolas Areias Gaspar, de 2 anos, que era considerado desaparecido em Santa Catarina sob suspeita de tráfico de pessoas, chamou atenção do Brasil inteiro. Em entrevista ao Fantástico, neste domingo (14), a mãe do bebê, que não teve sua identidade revelada, alegou ter tido “um surto” e então decidido entregar o filho a Marcelo Valverde e Roberta Porfírio.
O dominical detalhou o caso, que teve início no dia 30 de abril, quando Nicolas desapareceu em Santa Catarina. A partir da denúncia dos familiares, a polícia começou uma investigação, que culminou no encontro do menino pela Polícia Militar, na tarde de segunda-feira passada (8), num carro no Tatuapé, zona leste de São Paulo.
Nicolas estava acompanhado por Marcelo Valverde Valeze e Roberta Porfírio de Souza Santos, que foram presos preventivamente, acusados de tráfico de pessoas. Segundo informações da Folha de S. Paulo, a Polícia Civil de Santa Catarina afirmou que o marido de Roberta também está sendo investigado, sob a suspeita de que o casal teria tentado adotar a criança de forma clandestina. A esposa de Marcelo também é alvo de investigação.
Ao programa, a mãe de Nicolas disse ter conhecido Valverde durante a gravidez, em 2021, em um grupo do Facebook de apoio a mães. A informação foi confirmada pela defesa do homem na semana passada. Na época, Marcelo teria revelado que ele e a esposa estariam tentando ter um filho, mas que haviam sofrido uma série de abortos espontâneos.
“Ele contou a história dele, das tentativas [para engravidar] com a mulher dele, que tiveram diversos abortos, que eu tive uma gravidez inesperada e dessa situação foi gerando uma confiança”, afirmou. “Ele falava que se eu botasse uma criança no mundo para sofrer, aquilo iria me gerar um carma, gerar carma na criança, então ele foi usando tudo o que ele podia”, apontou a mãe de Nicolas.
A jovem de 22 anos, por sua vez, não contou com o apoio do pai do menino, já que seu nome não consta na certidão de nascimento e ela é mãe solo. Foi no dia 23 de abril deste ano que a mãe de Nicolas retomou o contato com Marcelo, que disse, desta vez, que ele e a mulher já tinham conseguido engravidar. No entanto, Valverde contou conhecer outra mulher, Roberta, que gostaria de ter um bebê.
Valverde foi responsável por organizar o encontro das duas, marcado para 30 de abril, na praça de alimentação de um shopping em São José (SC), mesmo dia do desaparecimento de Nicolas. Na ocasião, Roberta se atrasou e foi quando a mãe da criança recebeu uma transação em PIX de R$ 100, para cobertura de transporte para outro local, bem como sua alimentação. A transferência está sendo investigada pela Polícia Civil de Santa Catarina, que deve pedir a quebra de sigilo bancário dos envolvidos no caso para identificar outras possíveis transações financeiras entre os suspeitos.
Já no novo ponto de encontro, ambas conversaram dentro do carro de Roberta, acompanhadas por Marcelo. Ao dominical, a jovem contou que não foi alvo de ameaças e não recebeu qualquer vantagem financeira. De acordo com a entrevista, ela entregou o filho espontaneamente, após sucumbir à pressão psicológica. “Eu teria que tomar a decisão ali mesmo, então, por pressão e manipulação, que eu já estava ali, acabei cedendo, tive um surto e resolvi entregar a criança a ele, mas sem pensar que poderia ser uma quadrilha de tráfico ou algo do tipo”, afirmou.
Após entregar Nicolas, a mãe teria pedido para não voltar para casa. Roberta então pagou a estadia da jovem em um hotel. A mãe só retornou à sua residência no dia seguinte, 1º de maio, quando Nicolas já estava em Balneário Camboriú. Nas horas que sucederam a entrega, a moça recebeu imagens do garotinho brincando com outras crianças na areia.
Quando Porfírio afirmou que deixaria o estado e levaria Nicolas para São Paulo, onde ela mora, a jovem se deu conta do que havia ocorrido. “Foi naquele momento que começou o arrependimento e a cair a ficha do que tinha feito”, confessou ela ao programa da TV Globo. “Espero que ele me perdoe e veja que foi um momento que eu passei de problema“, acrescentou. Assista:
Desesperada, ela tentou tirar sua própria vida, e no dia 2 de maio, acabou internada na UTI de um hospital. A hospitalização impediu que seus familiares se dessem conta do que havia acontecido com o pequeno. Já no dia 5 de maio, a avó de Nicolas deu falta da criança e então saiu em sua busca, com a ajuda do tio do garoto.
Após registro de boletim de ocorrência na Polícia Civil, o menino foi incluído no programa SOS Desaparecidos da Polícia Militar de Santa Catarina. “É feito uma faca, no teu peito, a dor. Não consegue puxar, para tirar aquela dor, sabe? É muito desesperador”, disse a avó na reportagem.
Desde que foi encontrado, Nicolas está sob custódia do Conselho Tutelar, recebendo cuidados em uma casa de acolhimento em São Paulo. O pequeno deve retornar à Santa Catarina nesta segunda-feira (15). Lá, em um primeiro momento, Nicolas ficará em um abrigo institucional em São José, na Grande Florianópolis.
Os avós maternos revelaram que pretendem pedir a guarda de Nicolas. Ainda segundo a investigação, mensagens de texto indicam que a jovem sofreu assédio para entregar o filho desde o seu nascimento, há dois anos. Entretanto, a defesa de Marcelo nega que o homem tenha feito isso.
Relembre o caso
Nicolas foi encontrado no dia 8 de maio em São Paulo, acompanhado por Marcelo Valverde e Roberta Porfírio. As autoridades identificaram que a placa do carro de Roberta havia sido alterada. Ao serem questionados pelos agentes, Marcelo e Roberta afirmaram que estavam indo ao Fórum do Tatuapé, com o intuito de “regularizar a situação” da criança, que havia sido supostamente doada pela mãe. A polícia apreendeu o veículo, bem como os celulares da dupla.
Os agentes acompanharam os dois até o Fórum e confirmaram que, de fato, a Promotoria de Justiça aguardava a chegada da dupla para realização dos trâmites. A advogada de Porfírio também estava no local. Já no Fórum, Roberta e Marcelo foram ouvidos pelo promotor de Justiça, que então orientou as autoridades a conduzirem os dois para a delegacia.
A Polícia Civil disse ter sido informada, ainda, de que Marcelo e a esposa, que se chama Juliana, estariam aliciando a mãe do bebê a entregar a criança, sem o procedimento legal de adoção. Segundo o artigo 242 do Código Penal, o ato de registrar o filho de outra pessoa como próprio é descrito como crime, e a pena prevista é de dois a seis anos de reclusão.
Marcelo e Roberta foram indiciados pelo crime de tráfico de pessoas. Representantes da dupla negam a acusação e, de acordo com a advogada Fernanda Salvador, que defende Roberta, o menino teria sido entregue pela mãe para que fosse cuidado “por um tempo” por sua cliente.
Salvador alegou, ainda, que Marcelo e Roberta pretendiam entregar Nicolas para um promotor da Infância e Juventude do Fórum do Tatuapé. “A gente achou prudente entregar [a criança] no fórum porque [a mãe] nos disse que estava em um ambiente tóxico, de vulnerabilidade”, afirmou a advogada. “Como ela é habilitada para processo de adoção, achamos prudente entregar a criança no fórum”, detalhou.
As advogadas Laryssa Nartis e Khatarine Grimza, responsáveis pela defesa de Marcelo, confirmaram que ele conheceu a mãe de Nicolas em um grupo do Facebook para mulheres interessadas em doar crianças. Ele teria apresentado-a a Roberta. “Ela falou que, caso ele não pegasse a criança, ela poderia cometer uma loucura. Ele não tinha mais contato com a mãe, ela é que veio procurá-lo agora”, afirmaram as advogadas, que negaram qualquer assédio por parte de Valverde à mãe do menino.
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