Titular da delegacia da mulher relata agressões do ex-marido, e relembra deboche: “Eu bato na delegada da Deam”

Juliana Domingues, da Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam), percebeu o abuso quando atendeu uma vítima de violência doméstica

A delegada Juliana Domingues, da Delegacia Especial de Atendimento à Mulher de Volta Redonda (Deam), atendeu uma vítima de violência doméstica e percebeu que, dentro de casa, também estava sendo vítima. O agressor seria o então marido, o tenente-coronel Carlos Eduardo Almeida Alves Oliveira da Costa, da Polícia Militar do Rio de Janeiro. O caso foi mostrado no “Fantástico” deste domingo (1º).

Juliana afirma ter apanhado de cinto e sido estuprada. Ela ainda relatou deboche e certeza de impunidade vindos do ex. “Ele falava para mim: ‘Você está vendo? Eu bato na delegada da Deam. E o que você vai fazer? Você vai fazer o quê? Você é uma reles delegada de interior. E eu trabalho com diversos desembargadores. Você acha o quê? A sua palavra contra mim é o quê?’”, lembrou. As agressões teriam acontecido entre 2021 e 2022.

A primeira delas, segundo a delegada, aconteceu já na lua de mel. “A gente se casou num castelo. Ele fez um casamento de princesa para mim. Então, para ele, eu era a mulher mais inteligente que ele havia conhecido, eu era a pessoa mais espetacular que ele tinha conhecido. Depois, eu passei a ser burra, eu passei a ser porca, eu passei a ser totalmente insuficiente”, disse.

A delegada tem dois filhos e não queria que eles a vissem sendo agredida pelo padrasto. “Uma vez, ele me bateu na frente do meu filho. Me deu um tapa no rosto. O meu filho estava com a cabeça abaixada, jogando. Eu pensei: ‘Graças a Deus, ele não viu’. Só que, depois, o meu filho falou para mim: ‘Eu vi que ele te bateu'”, lamentou Juliana.

Continua depois da Publicidade

Ela relatou, ainda, que foi estuprada pelo próprio marido mais de uma vez. “Ele me levou para o nosso quarto e aí estuprou. Fez sexo comigo contra a minha vontade. Eu chorei muito. Eu pedia para ele parar. Pior que ele não parou. Quando terminou, ele virou e falou: ‘agora você vai tomar o seu banho porque o teatro é às 16h’. Não foi a primeira vez que ele me estuprou. Eu passo por isso desde 2021”, desabafou.

A reviravolta veio após a delegada ouvir o depoimento de mulher que passava por situação parecida a sua. Ela, então, decidiu denunciar o ex-companheiro. Ela passou por dois exames de corpo de delito, com lesões na maçã esquerda do rosto, no glúteo e arranhões. O estupro, porém, não ficou comprovado.

Delegada Juliana Domingues relatou agressões do ex-marido. (Foto: Reprodução/ TV Globo)

Em depoimento, o tenente-coronel comentou que “tinha o hábito de usar cintos e outros instrumentos durante o sexo“, segundo o “Fantástico”. Ele teria dito que “tudo era consentido“. Carlos foi denunciado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro por estupro, injúria e violência psicológica contra a mulher, e o processo está sob sigilo no Tribunal de Justiça do Rio. A primeira audiência deve acontecer no próximo dia 17.

Hoje, Carlos é coordenador do Departamento de Segurança Institucional do Tribunal Regional Federal (TRF) da 2ª Região (Rio e Espírito Santo). No dia 9 de agosto, a equipe de reportagem fez o primeiro contato com ele, que afirmou que iria falar com o advogado e não retornou. Na última sexta-feira (30), o g1 tentou novamente, e ainda insistiu no sábado (31), seguindo sem resposta.

Continua depois da Publicidade

Delegada relatou culpa como motivo para denúncia

Juliana comentou que sentia vergonha da situação.“Eu já fui delegada de três unidades de Deams. Na época, eu era uma delegada de Deam. Então, isso me fez pensar muito. Antes, eu tinha vergonha, porque como que isso foi acontecer comigo? Eu sou uma delegada de Polícia. Eu trabalho com isso, e tudo isso aconteceu comigo”, confessou.

A delegada quer, agora, que sua história motive mulheres que estejam em situações parecidas. “Embora a vítima ache… eu achei isso, durante bastante tempo. Só que não é a sua culpa. Acho importante dividir a minha história, justamente porque eu sei que, infelizmente, muitas mulheres estão passando pelo que eu passei. E, na posição em que eu estava, mesmo assim, eu tive medo e vergonha”, admitiu.

“Então, eu sei que elas têm medo, que elas têm vergonha, que elas têm culpa. Mas, com a minha história, eu quero dizer para elas que elas não se sintam assim. Que existe ajuda, existe rede de apoio, e que elas têm que ter força de vontade para sair dessa situação”, garantiu, concluindo o relato.

Siga a Hugo Gloss no Google News e acompanhe nossos destaques