Nesta quarta-feira (20), começou a circular nas redes sociais um vídeo em que um vendedor ambulante de açaí desmaia após ser algemado e preso por policias militares, no centro de São Paulo. Houve até mesmo boatos de que ele teria falecido. No entanto, a informação não procede, e na tarde de hoje, o ambulante Geová de Oliveira Lima deu sua versão da história, em entrevista ao G1. A Polícia Militar e mais órgãos de segurança também se posicionaram.
As imagens agonizantes aconteceram na última sexta-feira (15), quando o ambulante, de 48 anos, foi acusado por fiscais da prefeitura de vender seus alimentos de forma irregular na Praça da Sé. Ele estava com sua mulher e a filha. A abordagem foi gravada pela filha, que registrou toda a confusão que teve início quando o carrinho de Geová foi apreendido. Apontando o dedo para o vendedor, um oficial ordena: “O senhor vai respeitar a gente, beleza?!”.
Uma gritaria se inicia momentos depois, quando ouvimos gritos desesperados pedindo aos oficiais que parem. “Para. Está machucando ele. Você está machucando ele”, clama a mulher. “Solta. Está matando ele, gente. Vai matar ele”, continua. Em questão de minutos, Geová foi algemado e imobilizado no chão, deixando os presentes temerosos de que ele perdesse a vida. “Deixa respirar… ele”, pede outro homem. “Por favor, não faça isso. O meu marido vai enfartar”, suplica a companheira do vendedor.
A angústia fica nítida nos pedidos desolados da mulher de Geová que, em prantos, fica assustada ao ver o homem ser contido até perder a consciência. “Não tá respirando”, comenta ela. “Gente, eles tão matando meu marido, gente. Ele não tá conseguindo respirar… Ele vai matar ele”, acrescenta a senhora, que também percebe: “Ele tá sangrando”.
[Alerta: Imagens sensíveis e fortes a seguir!]
https://twitter.com/em_com/status/1351944009023893508?s=20
Segundo a Polícia Militar, a Prefeitura de São Paulo e a Secretária de Segurança Pública, o homem não tinha autorização para fazer suas vendas na região e foi preso por dano, desobediência e resistência. De acordo com o G1, o boletim de ocorrência do caso atesta que Geová teria danificado veículos da prefeitura, desobedecido policiais e resistido à prisão – apesar de aparecer caído no chão no vídeo.
Vendedor ambulante diz ter sofrido convulsão em abordagem
Ao G1, Geová afirmou que estava apenas retornando para sua casa. “Eu tenho autorização para vender na Avenida São João, também no Centro, mas como estava chovendo naquele dia, voltei para a casa com minha família. Moramos na Sé. Um cliente perguntou se eu estava vendendo, a fiscalização viu, achou que eu estava trabalhando em local proibido e quis pegar meu triciclo e a mercadoria. Mas eu não estava mais trabalhando”, defendeu-se.
Foi então que um agente da prefeitura teria o agredido: “Deu uma voadora e um soco… Aí me revoltei, peguei uma tábua e quebrei o vidro da perua dele”. Na sequência, um grupo de PMs que passava pelo local conteve o vendedor, quando ele diz ter sofrido uma convulsão. “Aí os PMs se juntaram, me colocaram no chão e puseram o joelho em cima do meu pescoço. E depois um deles pôs cassetete no meu pescoço, me convulsionei e meu olho virou. Minha boca sangrou e apaguei”, completou.
O ambulante também lamentou a dura abordagem da polícia. “Muita agressão. Tomaram minha mercadoria, tomaram meu carrinho. Um PM apontou a arma para minha filha de 16 anos porque ela estava filmando”, relatou. “O que aconteceu comigo não quero que aconteça com outro vendedor ambulante. Eu trabalho como ambulante para poder morar numa ocupação de prédio. Senão vou virar morador de rua… Tenho problema cardíaco, pressão alta e tomo remédios. Os PMs não podiam ter feito isso comigo. Quantos e quantos Geovas morrem aí asfixiados pela polícia e não sabemos”, declarou.
Geová também lastimou o prejuízo de R$ 4 mil que diz ter sofrido e explicou que ainda não conseguiu retornar ao trabalho, devido às dores: “Eu não voltei a trabalhar porque meu carrinho e mercadoria continuam apreendidos pela prefeitura. Além disso estou com muitas dores. Eles [PMs] me torceram muito no chão. Estou sentindo dor na coluna, no pescoço. Foi um monte de policial em cima de mim”.
Ministério Público e Corregedoria da PM vão apurar as cenas
Em comunicado, a PM de São Paulo pontuou que o “homem foi detido por policiais militares que apoiavam a fiscalização e o caso registrado na delegacia da Polícia Civil pelo crime de dano, resistência e desobediência. O ambulante foi liberado após o registro da ocorrência”. Há também a informação de que policiais teriam sido hospitalizados durante a abordagem, após serem atingidos por objetos que teriam sido arremessados por presentes.
A Ouvidoria da Polícia, por sua vez, teve acesso às imagens e pediu que a Corregedoria da Polícia Militar e o Ministério Público de São Paulo apurem a conduta dos agentes envolvidos. “A Ouvidoria da Policia está requisitando à Corregedoria da Polícia Militar e ao Ministério Público de São Paulo que apurem as circunstâncias das ações dos policiais envolvidos e apliquem as sanções previstas em lei”, disse Elizeu Soares Lopes.
O que diz a Secretaria de Segurança Pública
A SSP-SP reforçou, em nota, a versão de que Geová teria sido contido por sua reação à abordagem dos fiscais. “Policiais militares davam apoio aos fiscais do município que abordaram o ambulante. A documentação apresentada não permitia a venda da mercadoria do local”, diz um comunicado da secretaria. “Quando foi informado que seria necessário a apreensão do itens, ele ficou nervoso, pegou uma placa de madeira e atingiu o pára-brisa de um dos veículos… O vendedor não se acalmava e precisou ser contido por policiais militares. Ele foi encaminhado ao 1ºDP, onde o caso foi registrado como dano”, completou o texto.
Prefeitura de São Paulo se posiciona
Assim como os outros órgãos, a Prefeitura disse que Geová não poderia trabalhar no local, e não tratou da abordagem da Polícia. “A Prefeitura de São Paulo, por meio da Subprefeitura Sé, esclarece que o ambulante não possuía autorização para trabalhar no local. Ao ser abordado, o ambulante atacou os fiscais da Subprefeitura e depredou dois veículos desta administração regional, até ser contido pela PM”, disse um comunicado.
Web se revolta
Pelas redes sociais, muitos ficaram indignados com a atitude da PM, especialmente pelo boato de que Geová teria falecido após a abordagem. Mesmo que as especulações sobre a morte e o infarto sejam falsas, foram vários os perfis que manifestaram sua revolta com o que aconteceu ao trabalhador. Confira algumas das reações:
Ao invés de prender bandido vai bater em trabalhador…
— Telma (@telmamello) January 20, 2021
que horrível o vídeo do cara dono do carrinho de açaí. meu deus do céu. polícia troculenta!!!
— Vivian Sena (@_viviansena) January 20, 2021
O crime, vender açaí na rua, a cada dia fica mais difícil não odiar a polícia
— cleysoncafe (@cleysonCafe) January 20, 2021
Estão rolando cenas fortíssimas de um senhor que foi agredido pela pm e infartou após ficar indignado por ter seu sustento, um carrinho de açaí, apreendido no Centro de São Paulo. A mulher que filma a ação chega a gritar informando que ele tem problema no coração, mas ñ adianta
— Preta Ijimú (@Nailahnv) January 20, 2021
A polícia matou mais um trabalhador com truculência
Ele ainda não foi identificado, mas tinha um carrinho de açaí, a Polícia Militar de SP e agentes da prefeitura foram lá apreender o ganha pão dele e agiu com violência, o homem teve infarto e morreu
Tem vídeos, mas n postarei pic.twitter.com/de0rOpmJ8f
— Levi Kaique Ferreira (@LeviKaique) January 20, 2021