Lucimar, filha da idosa de 75 anos que teve o corpo encontrado no último sábado (7), já em estado avançado de decomposição, orava pela mãe há meses. Inquilinos do mesmo prédio de quatro andares, localizado Vila da Penha, Rio de Janeiro, contaram que as falas eram “desconexas, mas intensas e em alto e bom som”. O síndico chegou a pedir ajuda a unidades públicas de tratamento psicológico.
O cadáver de Maria Auxiliadora de Andrade Santos ficou seis meses trancado em um quarto do apartamento em que ela morava com a filha. A idosa faleceu em 28 de março, conforme Lucimar relatou em seu depoimento à polícia. As orações, por sua vez, passaram a chamar a atenção dos vizinhos somente quatro meses depois.
“No início era de manhã cedo. A gente a ouvia fazendo orações em um tom de voz alto. Conforme os dias foram passando, foi aumentando tanto a frequência quanto o volume do clamor dela. Até que, no final de julho, ela gritava orações confusas. Não dava para entender exatamente o que era dito, durante as madrugadas inteiras”. explicou um morador ao jornal Extra, nesta quinta-feira (12).
“O nosso prédio só tem onze apartamentos. A maioria dos moradores é de pessoas idosas. Acabou virando um problema e até uma preocupação”, acrescentou. Ele informou, ainda, a medida tomada pelo síndico do prédio para tentar resolver a situação, mas que não obteve êxito.
“A ideia era tentar uma assistência social ou um acompanhamento psicológico, mas o pedido não estava sendo feito por ninguém da família e era necessário levar a mulher para uma avaliação na unidade. A situação acabou não sendo resolvida, e a gente meio que teve que ir aprendendo a conviver com todo aquele clamor conturbado”, lamentou.
Vizinhos não desconfiavam de morte
O vizinho destacou que Lucimar e Maria moravam em um apartamento no térreo, e eram vistas com frequência pelos demais moradores. “Pareciam ter uma boa relação, vi muitas vezes as duas andando juntas pelo bairro. Teve um período que a Maria Auxiliadora ficou doente, a gente via a Lucimar levando ela de cadeira de rodas, mas desde o início do ano, ela sumiu. A gente só não imaginou que tinha acontecido uma coisa dessas. Ninguém sentiu cheiro nem desconfiou de nada”, afirmou.
Ele também mencionou um possível histórico na família da mulher de pessoas com problemas psicológicos, incluindo um irmão de Lucimar. Falecido há poucos anos, ele teria sido um militar aposentado por questões de saúde. “Por alto, a gente ouvia e percebia que ele tinha algum transtorno psiquiátrico, mas não tinha intimidade o suficiente para saber mais a fundo. E, com essa situação das orações, chegamos a pensar que ela também poderia estar iniciando algum quadro nesse sentido”, ressaltou o morador, por fim.
Ao jornal O Globo, a mesma pessoa disse que o único detalhe que os moradores teriam percebido era que o apartamento passou a ficar sempre fechado. “Também passou a ser cada vez mais raro ver a Lucimar, ela já não transitava tanto pelo prédio. Não a encontrava na rua. A gente só ouvia. Mas as contas do condomínio, por exemplo, estavam em dia e nunca soubemos de nenhum relato ou problema desse tipo de ela estar devendo alguma coisa”, pontuou.
No último domingo (8), um dia após o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) encontrar o cadáver, a filha da idosa teria intensificado ainda mais a altura e o tempo das orações. Segundo o vizinho, a voz dela podia ser ouvida até da calçada: “Ela gritava. Não dava para saber o que exatamente ela estava dizendo. Ficou o domingo todo, durante o dia e noite, fazendo as orações sem parar”.
“Para gente, foi um dia tenso com o som que estava vindo do apartamento dela. Fazia a gente lembrar do caos e do susto que tivemos no sábado, quando acharam o corpo já em decomposição. Foi tudo muito triste de presenciar. Mas depois, na segunda-feira, ficou um silêncio e as luzes do apartamento apagadas. Em seguida, descobrimos que ela já não está mais aqui no prédio. A filha dela a levou, mas não sabemos para onde, mas ela garantiu que a mãe está bem”, esclareceu ele.
Sobre o caso
O corpo da idosa foi encaminhado para o Instituto Médico Legal (IML) do centro do Rio. A Polícia Civil informou que a perícia foi realizada no local, e acrescentou que o caso está sendo investigado pela 27ª DP (Vicente de Carvalho). A corporação pretende esclarecer as causas e circunstâncias do óbito.
Lucimar foi ouvida pelas autoridades e liberada. Ela aguarda a conclusão do caso em liberdade, já que não há provas de seu envolvimento na morte da mãe. De acordo com o jornal ‘O Dia’, a mulher disse que é evangélica e que orava intensamente, com a esperança de que Maria Auxiliadora ressuscitasse.
Siga a Hugo Gloss no Google News e acompanhe nossos destaques