Entrevista: Iza fala sobre turnê que estreia hoje, revela medo antes de ‘Pesadão’ e relembra ‘boom’ de início da carreira

Estrela em ascensão, a carioca Iza dá nesta sexta-feira (10) mais um importante passo na carreira. A menina que, dois anos atrás, se divertia ao mostrar o vozeirão em covers no Youtube, estreia sua primeira turnê: “Dona de Mim”. No palco da Audio, em São Paulo – com direção do experiente Raoni Carneiro –  Iza interpretará faixas próprias, a maioria do disco de estreia.

Antenada com o mercado internacional, a cantora de 27 anos diz ter cuidado pessoalmente de detalhes do figurino e da comunicação visual, e não hesita quando perguntada se bebe da fonte de ícones como Lady Gaga e Beyoncé. “Eu venho dessa geração. Sou formada em Pop. Muitos anos ali, em frente à TV, dançando os clipes. A gente cresceu vendo Backstreet Boys, Britney, Christina. É uma coisa que a gente cresceu ouvindo, gostando ou não. E eu sou consumidora mesmo disso“, conta ao hugogloss.com.

Para além da inspiração, é nítido e interessante como conseguiu evidenciar seu estilo próprio e sua identidade musical, com pouco tempo de estrada. No disco, primariamente da chamada black music, passeia com naturalidade pelo R&B; soul e blues, ritmos que lembra de ouvir com seu pai, na infância. Seu maior hit até o momento, ‘Pesadão’, é visto como um divisor de águas, que demandou coragem.

Iza e Marcelo Falcão, parceiro na faixa que a projetou para o Brasil inteiro (Foto: Divulgação / Rodolfo Magalhães)

Eu e a gravadora não sabíamos o que ia acontecer com essa música. Porque sabíamos que era muito diferente do que estava tocando na rádio em relação à sonoridade e à letra. Eu estava com muito medo realmente do que poderia acontecer. No fundo, depois que deu certo, percebi que só precisava ser verdadeira comigo mesma. Eu fiquei muito feliz que as pessoas me abraçaram. Foi aí que me vi dona de mim“, celebra.

Dona de si, dona de uma beleza estonteante e de uma história inspiradora, Iza dá voz não só ás suas composições, mas também a muitas jovens. Nesta entrevista, a artista fala sobre preconceito, sobre o processo de aceitação de sua identidade e comenta os recentes casos de feminicídio e agressão contra mulheres, que colocaram o tema no centro dos debates do país.

HG – Como estão os preparativos, os ensaios e a ansiedade para a estreia da turnê logo mais à noite?

IZA – Nossa, eu estou ansiosa desde o dia em que a gente definiu a data de lançamento da turnê. Está sendo um momento muito gratificante para mim. É algo que eu estava esperando há muito tempo. Porque eu comecei a cantar no Youtube, inclusive o Hugo Gloss teve uma participação na minha carreira que é absurda. O Paulo Gustavo também postou no mesmo dia, mas o Hugo postou um vídeo meu de uma vez, e eu lembro que eu tinha 8 mil seguidores na hora que ele postou. No dia seguinte, sei lá, já tinha multiplicado por 10. Fui pra 100 mil seguidores de uma vez só. Muita gente começou a acompanhar o meu trabalho a partir dali. E com o Hugo compartilhando, eu comecei a fazer show!

HG – Que máximo! Amamos saber disso… seu talento merecia ser compartilhado. Qual foi o cover?

IZA – One Dance, do Drake. Foi um buzz bizarro! Eu comecei a fazer o show naquela época que ele compartilhou, mas era tudo cover. Eu estava começando a me entender musicalmente, tinha acabado de largar meu emprego, estava tudo muito novo para mim. Aí agora, finalmente, depois desse tempo todo fazendo show com covers, eu tenho um show para chamar de meu. É um show que eu tenho músicas minhas, um show que eu estou concebendo e montando tudo. Eu sou virginiana, sou muito perfeccionista. Tem muita coisa que eu estou me envolvendo e que tem tirado o meu sono. Está tudo dando certo, mas eu sou muito ansiosa. Então, eu sonho que estou fazendo o show, sonho que estou ensaiando. Está complicado (risos). Eu já ensaio há bastante tempo. Um mês, ensaiando massivamente todos os dias.

HG – Tem muita coreografia?

IZA – Tem coreografia, eu tenho umas backing vocals. Eu acho que, musicalmente, meu show fica mais completo com as vozes. Eu gosto dessa coisa com as harmonias de timbre, eu gosto de cantar muito com as minhas backing vocals. Tenho tido a oportunidade de fazer isso em alguns programas de TV. Eu tinha três deles nos meus shows, agora eu tenho quatro e a gente está criando harmonias novas. Então, a gente tem que ensaiar as coreografias, e todas as harmonias. Tem os arranjos musicais também que eu estou interferindo sempre. Tem a direção de palco que eu também tô fazendo em conjunto com a minha equipe. Tem toda a questão do figurino, dos vídeos, da comunicação visual do show. Eu trabalhei com isso por muito tempo e me preocupo muito. Eu acho que é uma coisa que amarra a história do show. Enfim, estou exausta (risos).

HG – A gente compartilhou esses dias, em primeira mão, o teaser da turnê e eu percebi uma vibe meio ‘Lady Gaga meet Beyoncé’. Tem algo delas, além desse vídeo?

IZA – Eu venho dessa geração. Eu sou formada em Pop. Muitos anos ali, em frente à TV, dançando os clipes. A gente cresceu vendo Backstreet Boys, Britney, Christina. É uma coisa que a gente cresceu ouvindo, gostando ou não. E eu sou consumidora mesmo disso. E eu sempre assisto muito a turnês e shows. Óbvio que eu me inspirei em todas elas: Demi, Selena, Katy Perry, principalmente Lady Gaga, que amo muito. Lady Gaga, Rihanna e Beyoncé, que são as minhas três favoritas. Eu acho que [eu me inspirei] em relação à linguagem. Não é “Ah, peguei e fiz igual”. É a linguagem mesmo, essa coisa de contar uma historia durante o show.

HG – Em termos de repertório, o que a gente vai ouvir?

IZA – Praticamente todas as músicas do meu álbum. Tem algumas que eu não vou tocar. “É Noix” e “Corda Bamba” não vão estar no show porque Veveta não podia, nem o Thiaguinho, por questões de agenda.

HG – Mas depois pode ser que role, né…?

IZA – É, pode ser, a gente sempre conta com isso, né?! Fiquei tão feliz com o Marcelo [Falcão], o Rincón [Sapiência] e a Glória [Groove] participarem do show. Eu tô muito feliz, mas infelizmente eles (Ivete Sangalo e Thiaguinho) não puderam estar. E essas músicas são legais por conta deles.

HG – Alem de faixas do disco, você vai relembrar como tudo começou, com algum cover?

IZA – Sim! São dois covers no show. Eu vou fazer um que eu já fiz e outro que vou cantar pela primeira vez.

HG – Conta para a gente!

IZA – Só posso falar que é da Alcione, o que eu nunca fiz, essa diva brasileira! O que eu já fiz é “Bad Romance”, da Lady Gaga…

Ansiosos para ouvi-la, cantando Marrom! (Foto: Divulgação / Gabryel Sampaio)

HG – ‘Dona de Mim’ é um trabalho que mostra muito de sua versatilidade, você lançou mão de R&B; reggae; pagode; soul; blues; capoeira… Como você chegou nesse resultado, o que você ouvia quando criança… o que te trouxe até aqui?

IZA – Eu acho que, durante o processo do álbum, a equipe foi muito bacana, porque perguntou tudo o que eu gosto de cantar. E a gente tocou R&B; jazz, blues, tem musica brasileira, berimbau… Tudo o que eu queria colocar nesse álbum e tudo o que eu queria cantar. Eu cresci ouvindo soul; jazz e R&B, principalmente, por causa do meu pai que é apaixonado por essas coisas. Então, eu cresci ouvindo Stevie Wonder, Michael Jackson, George Harrison, Donna Summer, Diana Ross, Nina Simone, mas meu pai também amava samba, então eu cresci ouvindo samba também em casa. São ritmos negros, basicamente. Era o que eu ouvia e eu acho que foi o que eu consegui fazer nesse álbum.

HG – O disco tem ao todo 7 participações, de gente grande como Ivete Sangalo e Marcelo Falcão. Tem alguém que você queria, mas que acabou não rolando?

IZA – Cara, tem uma que não rolou. Toda vez que eu faço parceria eu penso em artistas que eu admiro muito e que contribuiriam para a minha carreira musicalmente falando. O legal de fazer parcerias é você crescer. Queria muito ter gravado com Ponto de Equilíbrio, que não deu tempo, mas vai rolar.

HG – E quais são as colaborações dos seus sonhos?

IZA – Liniker e Karol Conka. Amo!

HG – Você já lançou dois singles desse trabalho, ambos muito bem sucedidos. Qual será o próximo?

IZA – A gente ainda tá conversando sobre isso. Nós já temos alguns materiais prontos de clipe, mas ainda está em avaliação.

HG – E quando você se percebeu “Dona de Si”? E o que é pra você, isso?

IZA – Foi quando eu defini que ‘Pesadão’ seria minha música de trabalho. Eu lancei ‘Te Pegar’ no início de 2017 e depois eu fiquei um tempo pensando em qual seria a minha sonoridade. ‘Te Pegar’ é uma musica que eu amo de paixão, mas na real eu não sabia se essa era a minha liberdade mais profunda. Eu fiquei um tempão procurando, teve um monte de música para tentar achar o meu som. Quando a gente fez “Pesadão”, a gente tinha muita certeza que era essa música. Mas eu e a gravadora, não sabíamos o que ia acontecer com ela. Porque sabíamos que era muito diferente do que estava tocando na rádio em relação à sonoridade e à letra. Eu estava com muito medo realmente do que poderia acontecer. No fundo, depois que deu certo, percebi que só precisava ser verdadeira comigo mesma porque se eu não fosse verdadeira comigo mesma e as pessoas gostassem daquilo, eu ia ser obrigada a repetir isso para o resto da vida. E eu acho que é muito importante, você ser verdadeiro com o que você é. Eu fiquei muito feliz que as pessoas me abraçaram. Foi aí que me vi dona de mim. Quando lembro do processo criativo de ‘Pesadão’, sinto que ser você é sempre a melhor opção. E hoje eu lido assim com qualquer coisa. Porque se eu não for fiel a mim mesma, vai dar errado.

HG – E esse processo de entendimento, de descobrir quem você é e o seu estar no mundo, é um processo que para algumas pessoas é mais fácil e para outras, mais delicado. Você acha que o preconceito pode impactar nesse nosso processo de aceitação e construção da identidade?

IZA – Conforme o tempo foi passando, eu fui me blindando disso, se alguém foi preconceituoso comigo, eu juro que não vi. Mas lá atrás com certeza que eu tinha esse medo. Por isso que eu alisava o cabelo, porque eu tinha medo de ser eu. Cabelo crespo era dito como cabelo ruim. Eu ouvi muito isso quando era criança. A começar pela minha aparência, eu tentava não ser eu. Eu entendia que eu era diferente do resto. E isso é muito complicado, principalmente quando você é adolescente. Então, acho que no inicio da minha formação, eu senti o preconceito na pele. Mas conforme o tempo foi passando, eu fui ficando tão focada naquilo que eu queria, que eu não vi o que aconteceu.

HG – Você acha que isso pode ter te prejudicado em algum momento?

IZA – Acho que qualquer coisa que machuca na pele, a nossa auto-estima, a nossa confiança, prejudica a gente e de várias formas. Emocionalmente, por exemplo. Acho que naquele momento me sentia muito magoada com algumas situações que aconteciam na escola, no shopping, com os olhares das pessoas, com coisas que acontecem com qualquer jovem negro no país, mas hoje em dia não mais.

HG – E você entendia isso quando criança?

IZA – Quando era criança não, mas a partir dos meus 9 anos eu passei a entender que era por causa da minha cor. Quando eu era mais novinha, não.

HG – E que conselho você daria para essa Iza de 9 aninhos?

IZA – Eu acho que eu diria pra ela que tudo isso passa e que existem pessoas ignorantes no mundo, mas que o mais importante é não deixar que essas pessoas mudem quem nós somos. Que nada é mais importante do que quem nos somos.

Maravilhosa é pouco! (Foto: Divulgação / Gabryel Sampaio)

HG – O que ou quem não entra no seu bonde pesadão?

IZA – Tem coisas que não podem entrar. Não suporto pessoas com falta de empatia, não suporto arrogância, não suporto incompetência, não suporto inconveniência, não suporto preconceito no geral.

HG – E quem você queria muito no seu bonde pesadão?

IZA – Quem eu colocaria no meu rolê… Cara, eu acho que eu gostaria de estar com a Liniker, sou louca por ela. Tenho uma fixação por ela.

HG – Maravilhosa! Mas você não pensa, por exemplo, em Rihanna, Beyoncé…?

IZA – Não, eu não sou Alice, né. Eu penso em coisas reais. (risos)

Ela pode até não pensar MUITO alto, mas é certo que ainda vai longe… (Foto: Divulgação / Gabryel Sampaio)

HG – Você é uma voz muito importante hoje, muito ouvida pelas jovens e se posiciona, com frequência sobre questões sociais. Nos últimos dias, casos de comoção nacional colocaram o feminicídio e a violência contra a mulher no centro dos debates. (E a reação das pessoas em relação a isso) Você já passou, ou presenciou, algo do tipo?

IZA – Nunca passei, nem presenciei, mas eu não sei nem o que eu faria. Óbvio que eu me meteria no meio, não deixaria que acontecesse. Mas eu nunca passei, graças a Deus, nem nunca vivenciei.

HG – E o que você acha que nós podemos fazer para que mais vidas não sejam tiradas e mais mulheres não sejam agredidas?

IZA – Eu acho que a principal coisa é conscientizar as mulheres de que elas são vítimas sim, mas que, muitas vezes, acabam colocando a culpa da agressão em quem é agredido. De diversas formas. Não só em relação à agressão física, mas a agressões verbais e a outros tipos. Muitas das vezes, se questiona muito a vítima: ‘Mas o que você estava fazendo?’; “Onde você estava?”… Nada! Nada que uma mulher faça é motivo para que seja vítima de agressão. Acho que é muito importante que a gente ajude a desconstruir esse costume que se tem de não se colocar no lugar da vítima. De achar que talvez a vítima tenha também um pouco de culpa nesta situação. Muitas mulheres sofrem violência doméstica por anos, e aí se questiona por que não saíram de casa, por que não denunciaram, e tem muito mais envolvido. São pessoas que passam por pressões psicológicas também, não é tão simples assim. Eu acho que quando a gente começar a entender que a culpabilização da vítima também é uma agressão, talvez as coisas comecem a mudar.

*Com colaboração de Nathália Duarte