Gerson, do Flamengo, acusa Índio Ramírez de racismo em partida; jogador é afastado, e Mano Menezes demitido após defesa preconceituosa

O jogador Gerson, do Flamengo, acusou o colombiano Índio Ramírez, do Bahia, de racismo na partida do Campeonato Brasileiro entre os dois times neste domingo (20). Os vídeos do momento mostram o flamenguista nervoso e “peitando” o jogador adversário ao ouvir algo que não gostou, quando o jogo ainda estava nos 7 minutos do 2º tempo. Depois disso, Gerson ainda teve um bate-boca com Mano Menezes, ao ver que o técnico do Bahia tentava defender o seu atleta. A partida terminou 4×3 para o time carioca.

Ao final do jogo, Gerson fez um relato forte em que revelou qual foi a ofensa disparada pelo colombiano. “O Ramírez, quando a gente tomou acho que o segundo gol, não me lembro, ele reclamou com o Bruno [Henrique]. Eu fui falar com ele, ele falou bem assim para mim: ‘Cala a boca, negro’“, afirmou o jogador ao canal “Premiere”.

Eu nunca falei nada disso, porque eu nunca sofri, mas isso aí eu não aceito. Não aceito. E eu nunca falei de treinador, mas o Mano, ele tem que saber respeitar. Estou vindo falar aqui em nome de todos os negros que existem no Brasil“, desabafou, mandando uma mensagem direta ao técnico do Bahia.

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Ele reiterou que essa situação é inédita em sua carreira. “Eu tenho vários jogos no profissional. Eu nunca vim na imprensa falar nada, até porque eu nunca sofri esse preconceito, e nunca fui vítima. Mesmo sendo eliminado de Libertadores, Copa do Brasil, eu nunca sofri esse preconceito. O Mano até falou: ‘Ah, agora você é vítima, né? O Daniel Alves (jogador do São Paulo que teve desentendimentos com Gerson em jogos entre os dois times) te atropelou e você não falou nada’. Claro, porque teve respeito, entre eu e ele“, relatou.

Em imagens liberadas pelo programa “Troca de Passes”, do SporTV, é possível ouvir a discussão entre o jogador do Flamengo e Mano Menezes. “Me chamou de negro“, reclamou Gerson, ao que o técnico respondeu: “Agora virou malandragem“. “Malandragem? Malandragem, não. Ele falou! Pergunta pra ele se não falou! Você me respeita!“, rebateu o meia.

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Mano, então, se dirigiu ao quarto árbitro. “Rogério… Não vai expulsar ele? Está mandando tomar no c*. Foi na cara do juiz que mandou tomar no c*. Se aconteceu… Se estamos errados, estamos errados. A gente não quer estar certo estando errado. Mas aquele menino não iria fazer isso com o Gerson. Eu conheço o jogador, chegou agora, é um guri“, tentou defender.

Quanto tempo parou o jogo? Quanto tempo parou o jogo agora por causa do Gerson? Tem que tomar bico do Daniel [Alves] mesmo. Tem que tomar bico do Daniel, que é mais malandro que tu. Ele quer mandar em todo mundo… Quer mandar no jogo“, reclamou o técnico. Assista:

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Pronunciamento de Mano

Em seu Twitter, Mano Menezes tentou mais uma vez minimizar a situação, sem admitir o absurdo que aconteceu. “Sobre o jogo de hoje: Mano condena qualquer ato de racismo e reitera que a violência contra quem comete não é caminho para solucionar a questão. E apoia qualquer avaliação e julgamento justo para que o futebol seja sempre referência positiva na nossa sociedade. Crescemos juntos“, escreveu.

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Providências do Bahia

Após todos os acontecimentos, o Bahia decidiu demitir Mano. Através de um comunicado nas redes sociais, o clube anunciou o desligamento. “O Esporte Clube Bahia comunica que Mano Menezes não é mais o técnico do Esquadrão“, escreveu. Inicialmente, o time disse que averiguaria a situação de Índio. “Nesta mesma ocasião aproveitamos para anunciar que, em relação à grave acusação de racismo envolvendo o colombiano Indio Ramírez, o clube se posicionará em breve após finalizar a apuração do caso“, afirmou.

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Horas mais tarde, numa nova nota, o Bahia anunciou a suspensão do jogador. “O atleta Indio Ramírez nega veementemente a acusação e a ele está sendo dada a oportunidade de se defender de algo tão grave. O clube entende, porém, que é indispensável, imprescindível e fundamental que a voz da vítima seja preponderante em casos desta natureza. Assim, decidiu afastar imediatamente o jogador das atividades da equipe até a conclusão da apuração. O presidente Guilherme Bellintani ligou para Gerson a fim de prestar solidariedade“, disse.

Desabafo de Gerson

Depois da partida, Gerson usou suas redes sociais para fazer um longo desabafo, em que garantiu que não deixará esse caso passar batido. “‘Amo minha raça e luto pela cor’. O ‘cala boca, negro’ é justamente o que não vai mais acontecer. Seguiremos lutando por igualdade e respeito no futebol – o que faltou hoje do lado contrário. Desde os meus 8 anos, quando iniciei minha trajetória no futebol, ouço, as vezes só por olhares, o ‘cala a boca, negro’. E eles não conseguiram. Não será agora“, pontuou.

‘Não basta não ser racista, é preciso ser antirracista’. Não adianta ter o discurso, fazer campanha, e não colocar em prática em todos os aspectos da vida, inclusive dentro de campo. O futebol não é algo fora da sociedade e um ambiente onde barbaridades como o ‘cala a boca, negro’ podem ser aceitas“, continuou o jogador, de forma certeira.

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É uma pena nós, negros, termos que falar sobre isso semanalmente e nenhuma atitude no esporte ser tomada a respeito. E é mais triste ainda ver a conivência de outras pessoas que estão dentro de campo e que minimizaram e diminuíram o peso do ato de hoje no Maracanã. É nojento conviver com o racismo e ainda mais com os que minimizam esse crime“, criticou.

Não vou ‘calar a minha boca’. A minha luta, a luta dos negros, não vai parar. E repito: é chato sempre termos que falar sobre racismo e nada ser feito pelas autoridades. Racismo é crime. E deve ser tratado desta maneira em todos os ambientes, inclusive no futebol. Não me calaram na vida, não me calaram em campo e jamais vão diminuir a nossa cor“, finalizou Gerson.