Em 2015, quando Adam McKay estreou seu premiado “A Grande Aposta”, o elenco super estrelado da produção saltou aos olhos de todos. Agora, ele parece decidido a elevar ainda mais o próprio patamar. Em “Não Olhe para Cima”, que estreia no dia 23 na Netflix, o diretor conseguiu reunir nomes como Leonardo DiCaprio, Jennifer Lawrence, Meryl Streep, Cate Blanchet, Jonah Hill, Timotheé Chalamet, Ariana Grande, Mark Rylance e Chris Evans.
A história acompanha Dr. Randall Mindy (DiCaprio) e Kate Dibiasky (Lawrence), dois cientistas que têm a difícil missão de alertar a humanidade sobre um cometa que está em rota de colisão contra a Terra, com dimensões suficientes para aniquilar nosso planeta. Após serem descredibilizados pela mídia, eles procuram pela presidente dos EUA, Orlean (Streep) — que está mais preocupada com a própria imagem durante o período de eleições, do que com problemas sociais de fato. Os astrônomos então travam uma luta árdua contra fake news, desinformação, negacionismo, lideranças corruptas e empresários que se aproveitam da catástrofe.
Apesar dessas questões estarem em debate neste exato momento por conta dos impactos do coronavírus, o roteiro foi escrito e concluído antes da pandemia. O longa ganhou um novo significado, e Adam McKay analisou tal reviravolta em entrevista a Bruno Rocha, nosso Hugo Gloss. O jornalista também conversou com DiCaprio, Streep e Lawrence, que discutiram sobre as relações entre política e ciência, e a importância da defesa da Floresta Amazônica, e das populações indígenas.
“Eu escrevi o roteiro, a Jennifer embarcou como a Kate Dibiasky, uma candidata a PhD e então, bem no meio da nossa observação do filme, veio a pandemia, e nós vimos muito do que estava no roteiro acontecer. Para mim isso ajudou, no sentido de que eu comecei a perceber que o filme era realmente sobre como nós invadimos e lucramos com as formas como nós nos comunicamos. Como por redes sociais, mídias de transmissão, etc. Tudo agora é uma troca de vendas em oposição a um discurso real. Então, foi muito interessante ir da escrita de um roteiro e depois ver ele tão diferente destes eventos. Mas nos fez querer fazer o filme ainda mais”, avaliou Adam.
Durante a pandemia, muitos líderes ao redor do mundo, inclusive no Brasil, negaram a existência ou gravidade do coronavírus, colocando a ciência em descrédito e, infelizmente, nos deixando em situações catastróficas. Questionada por Gloss, Meryl fez uma reflexão de que o problema também está na forma com que as pessoas acabam elegendo seus representantes.
“Eu acredito que em partes, é sobre como nós elegemos os nossos líderes. Que “Nós os elegemos, talvez, pelas razões erradas. Talvez por como eles se apresentam, porque eles parecem fortes, ou eles representam algo que nos faz sentir… que irá sacudir o status quo. Mas normalmente, o que acontece é que as pessoas entram no poder e eles se casam com o status quo… E há muito egoísmo. Parte da minha personagem neste filme é uma líder – existem diferentes tipos de líderes, alguns estão interessados no bem-estar do seu povo, e alguns estão interessados no bem-estar próprio. Primariamente e minuciosamente… Em acumular poder, manter o poder, e manter os seus números de votação altos. Portanto… Eu interpreto este tipo de líder. Mas graças a Deus nós temos outros. Graças a Deus, nós temos”, refletiu.
Jennifer Lawrence foi taxativa: “Política não tinha que ser envolvida na ciência e ciência não deveria ser politizada. Essas coisas são fatos, e quando a ciência é politizada, pessoas morrem. Nós vimos isso com a Covid-19, e nós estamos vendo isso com a crise climática”.
“Não Olhe Para Cima” também nos faz repensar sobre como o homem negligencia o meio ambiente e se desconecta da realidade iminente, de um mundo com recursos finitos e mudanças climáticas extremas, ocasionadas pela ação humana. Aqui no Brasil, por exemplo, o governo de Jair Bolsonaro autorizou na última semana, sete projetos de garimpo de ouro na região de São Gabriel da Cachoeira, uma área praticamente intocada da Amazônia. O desmatamento da floresta atingiu em 2021, o pior índice em dez anos, o que preocupa DiCaprio.
Ativista feroz e a par da situação de nosso país, ele ressalta o quão importante é proteger não só a Floresta Amazônica, como as pessoas que ali vivem. “Primeiramente, quando falamos sobre o Brasil e a Amazônia, é o nosso dever proteger… Não somente proteger a Amazônia, mas proteger os indígenas de lá, que são literalmente a última guarda de proteção do que é não somente um dos mais lindos e importantes lugares para a biodiversidade no Planeta Terra, mas sem a proteção da Amazônia, e de algumas florestas boreais e florestas tropicais do mundo, nós nunca iremos combater esta crise”, afirmou.
“Nós precisamos agora, mais do que nunca, de líderes que acreditam na ciência. Porque a ciência vai nos tirar dessa. Realmente é isso. E foi uma honra interpretar um personagem como o Randall, porque de muitas formas, ele está tentando articular a urgência deste problema para o mundo todo, mas ele não está sendo ouvido. E é isto que sentimos da comunidade científica em relação à crise climática. E muito do que a comunidade científica sente, ‘nos ouçam!’, ‘este é o nosso lugar de especialização’! Nós devotamos nossas vidas a esses problemas, e existem respostas, existem soluções, uma das principais é proteger o mundo natural e lugares como a Amazônia”, observou o ator, indicado ao Globo de Ouro pelo papel.
Assim como DiCaprio, Lawrence também avaliou sua personagem — que ao longo do filme é classificada como histérica e louca, apenas por lutar por aquilo que acredita. Hugo Gloss apontou para o tratamento diferente recebido pela cientista em comparação com Randall, e questionou se a estrela já havia passado por situações do tipo, que escancaram o machismo.
“Eu com certeza já lidei com o sentimento de ter sido exageradamente avaliada somente por ser uma celebridade, e só sentindo como se tudo que você fala é ou tirado de contexto. Eu definitivamente compreendo esse sentimento. A Kate é difamada porque ela está falando a verdade. Ela está falando uma verdade dura que ninguém quer ouvir, e que os assusta… E, sabe, eu acho que nós não gostamos de ouvir coisas que nós não queremos ouvir. E ao invés de atacar as pessoas responsáveis por esse grande desastre, é mais fácil atacar a pessoa que está trazendo os fatos”, encerrou Jennifer.
Assista à entrevista na íntegra: