Don’t touch, is art! Aguinaldo Silva avaliou a nova fase das novelas da TV Globo e revelou não ser o maior fã dos remakes que a emissora vem fazendo. Em entrevista ao colunista Ricky Hiraoka, do Splash UOL, o autor de grandes obras como “Roque Santeiro” (1985), “Vale Tudo” (1988) e “Tieta” (1989) contou se aprovaria uma nova versão de seus projetos. Ele ainda abriu alguns bastidores inéditos de “Senhora do Destino” (2004) e deu uma opinião sincera sobre a escalação de influenciadores nos elencos.
Para o escritor, os folhetins estão passando por uma fase delicada por causa da internet, e a televisão está cometendo um erro ao “querer agradar os públicos das redes sociais”. “Eu tenho visto muitas novelas que os personagens são entregues a influencers. Não dá para escalar influencer para fazer novela. Essas pessoas não são atores e não funcionam. Numa novela que você precisa construir um personagem e dar credibilidade a ele, se você não for um bom ator, você não consegue”, justificou.
“A TV vai se dar conta que é preciso de uma reviravolta no atual cenário das novelas, que é um gênero muito produtivo do ponto de vista financeiro”, ele acrescentou. O elenco, entretanto, não é o único desafio que as novelas enfrentam. Isso porque, segundo Silva, o público sente falta da qualidade das obras antigas. “Quando decidem fazer remake de ‘Vale Tudo’, isso já é uma forma de afirmar que as novelas boas eram as de antigamente, que tinham ritmo e bons diálogos”, afirmou.
Sobre o possível remake do clássico de 1988, ele garantiu que não está completamente satisfeito. “Eu sou contra remakes. A novela existe naquele momento, depende do autor, do elenco, da disposição do público para que tudo dê certo. Todos os remakes foram sempre menos interessantes que os originais”, ressaltou o roteirista.
Ele ainda comentou sobre algumas atrizes que estão sendo cotadas para viver a vilã Odete Roitman, interpretada por Beatriz Segall na versão original. “As pessoas que veem novelas vão ver uma Odete Roitman que não é Odete Roitman. Quem vai fazer Odete? Cassia Kis poderia fazer, por exemplo. A própria Gloria Pires faria uma boa Odete, mas não está na idade ainda. Mas não tem jeito. Odete sempre vai ser Beatriz Segall. Eu te confesso que se tivesse que escalar o elenco desse remake, pediria demissão. As pessoas vão assistir ao remake de ‘Vale Tudo’ e vão dizer que gostam mais da original. Eu não me atreveria [a fazer remake] por uma questão de respeito”, completou.
20 anos de Senhora do Destino
Um dos maiores sucessos de sua carreira, “Senhora do Destino”, completa 20 anos em 2024. Para Silva, a novela deixou um legado na teledramaturgia brasileira. “Os personagens são realistas. Não há nada que seja fake em ‘Senhora do Destino’. As pessoas não estavam acostumadas com isso. Naquela época, as novelas ainda eram muito melodramáticas ou tinham um estilo de crônica. Aí apareceu uma novela sobre uma mulher batalhadora como tantas que existem no Brasil e o público se identificou com aquela história de verdade”, relembrou.
Silva ainda explicou a construção da inesquecível Nazaré, personagem de Renata Sorrah: “Eu não deveria dizer isso, mas Nazaré tem um pouco de mim e muito da Renata. Eu acho que não seria possível criar uma Nazaré [nos dias de hoje]. Ela é debochada, tem uma linguagem incorreta. Uma Nazaré, hoje em dia, seria aceita pelo público, mas as redes sociais se veriam na obrigação de cancelar a personagem como se não houvesse pessoas assim”.
Ele também contou que a vilã quase não foi vivida pela atriz porque a ideia original era que Susana Vieira desse vida à loira. “Quando entreguei a sinopse da novela, tinha na cabeça que Maria do Carmo seria Regina Duarte e Nazaré, a Susana Vieira. Wolf Maya, que era o diretor, não queria Regina por alguma razão e começou a trabalhar nos bastidores para que essa escalação não acontecesse. Ele criou obstáculos para Regina ser a protagonista e ela desistiu. Aí, ele me sugeriu: ‘Por que a gente não põe Suzana Vieira como Maria do Carmo e a Renata Sorrah como Nazaré?’. O resultado todo mundo conhece. A hostilidade e a rivalidade entre as personagens eram tão verdadeiras que beiravam a vida real”, revelou.
Questionado se teria mudado alguma coisa no folhetim, ele garantiu que não. “Não teria feito nada de diferente. Eu confesso que a novela fluiu como o rio. Eu não mudaria nada. Existem novelas em que não há o que mexer. É o caso de ‘Senhora do Destino’ e ‘Vale Tudo'”, completou. E finalizou: “Minha carreira como novelista ainda não terminou”.