Emprego dos sonhos? Nem tanto! Em artigo divulgado pela revista Times, nesta segunda-feira (21), a roteirista de “Friends“, Patty Lin, fez alegações surpreendentes sobre os bastidores “tensos e infelizes” da sitcom tão adorada pelo público.
No texto, que é um trecho retirado de sua biografia, Lin explicou por que decidiu abandonar Hollywood e relembrou os anos em que integrou o “writers’ room” (sala de escritores) da série da NBC, entre 2000 e 2001. Patty entrou para o time de “Friends” na reta final da atração, quando a 7ª temporada ainda estava no ar. “No início, fiquei entusiasmada porque pude estar na mesma sala que o elenco, que eram grandes estrelas. (…) Mas a novidade de ver as ‘Grandes Estrelas’ de perto passou rapidamente”, admitiu ela.
Segundo a escritora, nessa época, o elenco principal – formado por Jennifer Aniston, Courteney Cox, Lisa Kudrow, David Schwimmer, Matt LeBlanc e Matthew Perry – estava frustrado com o rumo da trama e frequentemente questionava o trabalho dos roteiristas, o que rendia uma série de momentos “desanimadores e humilhantes”.
“Os atores pareciam infelizes por estarem acorrentados a um programa antigo e cansado, quando poderiam estar expandindo seus trabalhos, e eu senti que eles estavam constantemente se perguntando como cada roteiro os serviria especificamente”, detalhou ela.
Lin explicou que, durante as mesa-leitura (etapa da produção quando uma leitura organizada do roteiro é realizada com todos os atores), grande parte das piadas era descartada. Isso acontecia com mais frequência quando um dos atores principais não gostava do material e arruinava a cena propositalmente.
“Todos sabiam como fazer rir, mas se não gostassem de uma piada, pareciam afundá-la deliberadamente, sabendo que a reescreveríamos. Dezenas de boas piadas seriam descartadas só porque um deles murmurou a frase com a boca cheia de bacon. David e Marta nunca disseram: ‘Essa piada é engraçada. O ator só precisa vendê-la'”, explicou Patty.
A roteirista ainda detalhou o processo diário ao longo dos dois anos em que esteve na equipe: “Terminada a primeira reescrita [do roteiro], fazíamos uma revisão no set, onde os atores ensaiariam e trabalhariam no bloqueio com o diretor. Então, todos se sentavam no apartamento de Monica e Chandler e discutiam o roteiro. Esta era a primeira oportunidade dos atores de expressarem suas opiniões, o que fizeram com veemência”.
Lin alegou que os atores “raramente tinham algo de positivo a dizer” e, quando levantavam problemas, “não sugeriam soluções viáveis”. “Vendo a si mesmos como guardiões de seus personagens, eles costumavam argumentar que eles nunca diriam isto ou aquilo. Isso às vezes era útil, mas no geral essas sessões tinham uma qualidade terrível e agressiva, que carecia de toda a leveza que você esperaria de uma comédia”, desabafou.
Apesar de passar por clássicos da TV norte-americana, como “Freaks and Geeks”, “Desperate Housewives” e “Breaking Bad”, Patty reforçou que “Friends” é, até hoje, o título mais conhecido de seu currículo. O sucesso, entretanto, não impediu que ela enfrentasse a “síndrome de impostor”, especialmente ao se dar conta de que era a única pessoa de origem asiática entre os roteiristas da sitcom.
Ela também teria sido vítima de sexismo nos bastidores, já que David Crane – um dos criadores da série – usava somente o material de seus escritores homens.
Por muito tempo, Lin questionou se sua contratação não haveria acontecido apenas para “preencher cota”, já que na época a NBC – emissora responsável por “Friends” – havia acabado de lançar um programa de diversidade e inclusão no canal, com o intuito de contratar mais escritores não-brancos.
“A princípio, apoio políticas afirmativas porque acredito que superar o racismo institucional sem isso é impossível. Mas na prática? É uma grande confusão mental. Você não sabe se está conseguindo o emprego por causa do seu talento ou da sua raça. Naturalmente, me perguntei se fui contratada para ‘Friends’ por causa do programa de diversidade ou porque era a pessoa certa para o trabalho”, admitiu.
Quatro anos após o fim da série, em 2008, Lin abandonou a carreira de roteirista e disse que nunca mais quer trabalhar em uma sitcom.