No “Fantástico” deste domingo (28), Michele de Lima Teixeira, mãe de Carlos Teixeira Gomes Ferreira Nazara, falou pela primeira vez sobre a morte do filho, aos 13 anos. Ela recordou as agressões que o adolescente sofreu na escola em que estudava e um comentário dele sobre as práticas de bullying. A polícia investiga se esses atos foram os causadores do óbito de Carlinhos.
Carlos era aluno do sexto ano de uma escola pública. Ele dançava break, adorava ir ao sítio e, mais recentemente, aprendeu a andar de patins. À reportagem, Michele contou uma mudança na vida do garoto ao deixar o antigo colégio e começar a estudar na Escola Estadual Julio Pardo Couto, em Praia Grande, no litoral de São Paulo.
“Meu filho era um garoto muito, muito doce. A vida dele era jogar no computador. Não saía para a rua, ficava só jogando”, lembrou a mãe. Ela também citou uma conversa que teve com Carlinhos, em que ele disse ter achado a nova escola muito diferente da anterior. Segundo o adolescente, o motivo era a violência que acontecia lá dentro. No entanto, por ser o maior da turma, queria ficar forte para poder defender os colegas menores dos agressores.
“Ele falou pra mim: ‘A gente não pode entrar no banheiro’. E eu falei: ‘Por quê?’. E ele: ‘Não pode, mãe, porque quem vai para o banheiro apanha”, relatou Michele. Em seguida, ela comentou quando os outros alunos teriam começado a implicar com Carlinhos. “Ele falava que as crianças olhavam feio pra ele. Teve uma vez que meu filho foi sentar em uma mesa e, não foram um, dois, três, foram vários, sentaram em volta do meu filho, encarando ele”, narrou.
A primeira agressão física aconteceu no dia 19 de março, dentro da instituição de ensino. “Foi por causa de um pirulito. O menino arrancou da mão dele e, quando ele pediu de volta, o menino deu dois socos no nariz dele. O arrastaram pelo pescoço e foi para dentro do banheiro, onde fizeram aquele vídeo”, descreveu a mãe. Nas imagens, é possível ver o adolescente levando um mata-leão e sendo empurrado por outros alunos. Assista:
— v v v v videos (@Meduavideos) April 29, 2024
À época, os pais procuraram a direção do colégio, exigindo providências, e quiseram tirar o filho de lá. “Ele falou assim: ‘Mãe, eu não quero sair porque eu sou o maior da minha turma’. Falava isso porque os amigos dele eram menores, pequenininhos, e ele era grandão pela idade dele. Ele falou que queria defender os amigos. Ele falou: ‘Mãe, eu quero ficar forte. Quero correr. Corre comigo’. Eu falei que ia correr com ele, mas não corri”, lamentou Michelle.
Agressão
De acordo com os responsáveis de Carlinhos, que completou 13 anos em 7 de abril, dois dias antes de sua morte, a constante perseguição chegou ao extremo dentro da própria sala de aula. De acordo com eles, dois estudantes pularam com violência nas costas do filho. O pai de Carlos chegou a gravar um vídeo com o garoto, já em casa, no qual ele reclama de dores. “Quando eu respiro, dói as costas”, afirmou o jovem, aos prantos.
Os pais foram com o adolescente até o Pronto-Socorro Central de Praia Grande, administrado pela prefeitura. Ele foi atendido e liberado cinco vezes. Michele, então, recordou como foi o tratamento que eles receberam na ocasião. “Meu filho não fez um exame de urina, não fez nada. Meu filho gemendo por falta de ar, sem respirar”, pontuou.
Carlinhos, então, foi levado para uma outra unidade médica municipal, mas não teve melhoras no quadro de saúde. “O meu filho não conseguia tomar banho sozinho, não conseguia se vestir sozinho. Eu vestia ele”, destacou Michele. A prefeitura informou que abriu um “processo administrativo para apurar os procedimentos adotados nos atendimentos. E se for constatada alguma irregularidade, as providências cabíveis serão tomadas”.
O menino de 13 anos foi internado na UTI da Santa Casa de Santos e, sete dias depois das agressões, teve três paradas cardíacas e morreu. Conforme o Instituto Médico Legal (IML), Carlos Teixeira morreu em decorrência de uma broncopneumonia bilateral. O atestado de óbito concluído pelo órgão também mencionou uma celulite infecciosa – tipo de infecção bacteriana – no cotovelo do jovem. “Eu só estou aqui de pé por Deus, porque eu sei onde o meu filho está. Meu filho está com Deus”, desabafou a mãe.
Investigação
Até o momento, a polícia já ouviu dez pessoas, entre elas, a vice-diretora da escola, professores e dois suspeitos, que são menores de idade e estavam acompanhados de parentes. Os investigadores já têm os nomes da maioria dos alunos que participou das agressões contra Carlinhos. O inquérito, por sua vez, apura se houve homicídio com dolo eventual, que é quando a pessoa assume o risco de matar.
Agora, a polícia aguarda o resultado da perícia para concluir o que causou a morte do adolescente. “É o que vai definir se a morte se deu em decorrência dessas agressões que ele possa ter sofrido ou se foi uma causa independente”, declarou o delegado Alex Mendonça. Para o “Fantástico”, Michele Teixeira já definiu sua opinião. “Pra mim a culpa é da escola. Um adulto vê as crianças apanhando, não só o meu filho, e fechar os olhos, fingir que nada aconteceu”, disse ela.
Qual era o real estado de Carlinhos?
Segundo Thomás Resende, gestor do Programa de Melhoria da Convivência e Proteção Escolar da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, o governo instaurou uma comissão para apurar os fatos e eventuais responsabilidades. “A gente está no início dos trabalhos, mas a realidade atual é de que nenhuma evidência, nem por vídeo monitoramento, nem por oitivas realizadas, trazem informação de que aconteceu alguma coisa dentro do ambiente escolar no dia 9 de abril”, informou.
Resende relatou que, de acordo com as imagens obtidas pela secretaria, Carlinhos deixou a instituição onde estudava “aparentemente bem”. O gestor explicou, ainda, que as escolas estão em processo de construção de um plano de convivência. “A gente trabalha com a questão de proteção escolar, com a melhoria da convivência, que é sem dúvida alguma a nossa principal preocupação. Para que cada vez mais nós consigamos desenvolver esse estudante, a ponto de eles se perceberem pertencentes e colaboradores na construção desse ambiente escolar saudável”, concluiu Thomás.
Grupinho do terror
O dominical da TV Globo também conversou com outro aluno que estudava na Escola Estadual Julio Pardo Couto, e já foi vítima do “grupinho do terror” no banheiro da mesma unidade. “Foram sete pessoas: duas pegaram pelo meu braço e os outros cinco começaram a me bater. Lá não tem câmera. Eles têm um grupinho chamado ‘Grupinho do Terror’. [A direção] conhece, mas não faz nada. Tem medo deles”, afirmou o jovem, cuja identidade não foi exposta.
“Eu não quero mais sair de casa. Estou apavorado com isso”, confessou. A mãe dele contou que o bullying começou desde que o filho entrou na escola, há pouco mais de 1 ano. “Eu relatei várias vezes para a subdiretora, para a pedagoga, para o diretor. Nunca ninguém tomou nenhuma providência. Eu já tirei o meu filho dessa escola e não quero mais ele por lá”, cravou a mulher.
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