Uma jovem de 28 anos, cuja identidade segue em sigilo, foi vítima de uma tentativa de estupro na segunda-feira (14). Ela contou que fazia uma viagem com um carro do aplicativo 99 Táxi, entre Bragança Paulista, no interior de SP, e São Matheus, na zona leste da São Paulo. O motorista foi denunciado, e áudios e fotos dela machucada foram divulgados pela TV Globo. O Ministério Público de SP investiga o caso.
Segundo a jovem, ela estava com uma amiga, que desceu do carro primeiro, em Guaianases. Logo após, o condutor começou a fazer investidas abusivas e elogios a ela, solicitando que mudasse de lugar. “Nós deixamos ela na casa dela e, assim que ela entrou no prédio e que ele saiu com o carro, o motorista falou pra eu ir pro banco da frente do carro. E eu falei não ia pro banco da frente”, recordou a vítima.
Ela acrescentou que quando ficou sozinha com o homem no veículo, ele começou a se comportar de maneira abusiva. “Ele olhou pra trás e falou ‘quero ver seu rosto’. Então, aí eu já estava cismada, já estava com medo”, relatou. Em uma gravação exibida pelo SPTV, o funcionário de aplicativo diz: “Você tem que se valorizar. É um pedaço de mau caminho”.
Um outro áudio revela as investidas contínuas do motorista. “Você gosta de homem mais maduro ou mais jovem?”, pergunta ele para a passageira. A jovem, então, percebeu que o homem tinha desviado o trajeto quando estavam na rua Buritizinho, em Cidade Tiradentes. Eles começaram a adentrar uma rua deserta e cheia de árvores.
No momento de desespero, ela saltou do carro ainda em movimento e caiu em um barranco. “Eu sabia que ele ia fazer alguma coisa. Sentia que ele ia fazer alguma coisa e já estava bem desesperada. Em algum momento, ele olha pra trás e coloca a mão na minha perna. Quando ele fez isso, eu já abri o carro e pulei”, contou a moça.
Mesmo ferida, a vítima fugiu do lugar e conseguiu buscar ajuda em um condomínio na região. Imagens da câmera de segurança do local mostram ela chegando na rua com os ferimentos pelo corpo, e sendo acolhida por um morador local. “Eu chego no prédio começo a chacoalhar o portão pedindo por ajuda, por socorro. Esse morador foi um anjo na minha vida, ele me coloca pra dentro do prédio”, afirmou.
A amiga acompanhava a situação de longe, angustiada, e tentava ajudar. “Acordei meu pai desesperada e ele começou a chamar o Uber pra ir até ela. Eu vi na localização que ela estava a 13 minutos longe de mim”, detalhou, aos prantos.
O que diz a 99?
Em nota, a 99 Táxi lamentou “profundamente” o ocorrido. “Assim que a empresa tomou conhecimento do caso, bloqueou o motorista da plataforma (…) Uma equipe especializada realizou contato com a passageira oferecendo acolhimento, auxílio para despesas médicas e apoio psicológico”, declarou.
“Uma coisa é você entrar em um carro que você não conhece ninguém. Outra coisa é você estar viajando com um aplicativo que é para sua segurança. Na hora eu só pensava na minha filha, na minha família”, desabafou a jovem, por fim.
A Secretaria da Segurança Pública informou que o caso foi registrado como importunação sexual. Ao “Bom Dia, SP”, nesta quarta (16), a moça disse que foi orientada por policiais a fazer um boletim de ocorrência online.
Esse já é o segundo caso de abuso dentro de um carro de aplicativo na capital, em menos de um mês. O outro ocorreu em 16 de setembro, com uma jovem de 17 anos que foi estuprada, na zona sul de SP. O motorista de aplicativo foi preso.
Assista à íntegra:
MP abre inquérito
Após esse caso, o Ministério Público de São Paulo abriu hoje um inquérito civil público para investigar as empresas Uber e 99, por condutas criminosas praticadas por motoristas que prestam serviço através das duas plataformas.
A vereadora Silvia Ferraro, da Bancada Feminista do PSOL na Câmara Municipal de São Paulo, acionou a promotoria e pediu que ambas empresas sejam investigadas sobre as normas e políticas que estão sendo conduzidas. O objetivo é dar um fim no comportamento abusivo de parte de seus colaboradores.
Segundo a Promotoria, as investigações também irão servir para verificar a necessidade de adequação das condutas das empresas para assegurar a segurança dos consumidores, sobretudo mulheres, crianças e adolescentes e idosos.
Ao instalar o inquérito contra a Uber, por exemplo, o promotor Marcelo Orlando Mendes, da Promotoria de Defesa do Consumidor, deu um prazo de 15 dias para que sejam apresentados “quais são os mecanismos de segurança adotados em sua plataforma, a fim de salvaguardar os direitos de seus usuários, elucidando suas funções de forma pormenorizada”. Também foram tornados públicos, os autos dos relatórios de denúncias registradas no aplicativo, referentes a condutas praticadas pelos motoristas parceiros.
As plataformas também devem informar se as funcionalidades de gravações de vídeos e áudios estão disponíveis a todos os prestadores de serviço. Caso negativo, devem esclarecer o porquê, detalhando os critérios adotados para sua disponibilização.
“Matérias jornalísticas, veiculadas nos anos de 2020, 2021, 2022, 2023 e 2024, demonstram que o episódio noticiado nestes autos não se restringe à empresa 99 Táxi e não se trata de acontecimento isolado, mas sim de práticas reiteradas, perpetradas por motoristas cadastrados nas plataformas de aplicativos de viagem. Neste caso, na plataforma da UBER, fato este que demonstra, por si só, a falha na prestação de serviço”, argumentou o promotor.
Plataformas se pronunciam
Em comunicado divulgado pelo g1, a Uber informou que “segurança é uma prioridade para a Uber e inúmeras ferramentas atuam antes, durante e depois das viagens para torná-las mais tranquilas. Evitar que algo aconteça sempre é uma prioridade para empresa, que também investe em iniciativas de produção e distribuição de conteúdo para conscientização de motoristas parceiros, baseada no Código da Comunidade Uber, em parceria com organizações como o MeToo Brasil e o Instituto Promundo”.
“No entanto, a Uber entende que a violência de gênero é um problema social complexo e sistêmico que demanda ação conjunta de toda a sociedade. Por isso, a empresa possui, desde 2018, um compromisso público de enfrentamento à violência contra a mulher, que se materializa em uma série de parcerias com especialistas e autoridades no assunto para colaborar na construção de projetos e iniciativas para enfrentar essa realidade no aplicativo e na sociedade como um todo”, acrescentou a empresa.
Por fim, a Uber também disse que “possui diversas parcerias de enfrentamento à violência de gênero e apoio às mulheres vítimas de violência doméstica com o Ministério das Mulheres do Governo Federal, Conselho Nacional de Justiça, Instituto Maria da Penha, Ministério Público da Bahia e Fórum Brasileiro de Segurança Pública, entre outras”.
Já a 99 declarou que “se une à indignação e repúdio à cultura do estupro que acomete o país e reforça que possui uma política de tolerância zero sobre qualquer forma de violência sexual”. “A empresa trabalha incansavelmente para identificá-los e coibi-los. Segurança é prioridade para a 99, que investe continuamente em prevenção por meio de ferramentas que possam apoiar uma mobilidade urbana cada vez mais segura para todas as mulheres, passageiras e motoristas”, reforçou no texto.
“A plataforma conta com mais de 50 funcionalidades de segurança. Entre elas estão um botão de emergência que permite ligar diretamente para a polícia, gravação de áudio, câmera de segurança e compartilhamento de rota com contatos de confiança”, afirmou. A empresa ainda citou outros meios de prevenção.
“O aplicativo utiliza ainda inteligências artificiais que identificam passageiras em situação de maior vulnerabilidade, como viagens à noite e originadas em bares e casas noturnas, e direciona a chamada para motoristas mulheres ou condutores mais bem avaliados. Devido a todas essas iniciativas, 99,9% das corridas na plataforma são concluídas sem incidentes”, completou a 99.