Uma moradora de Cariacica (ES) desabafou nas redes sociais sobre a discriminação pela qual passou durante uma entrevista de emprego. Samara Braga, de 32 anos, revelou que o recrutador se atrasou três horas, além de ter sido irônico quando ela afirmou que não poderia mais participar e pediu para remarcar o processo seletivo para um novo horário.
Segundo a postagem de Samara, ela está desempregada há dois meses e compartilhou o seu currículo em busca de uma vaga. Uma companhia se interessou por seu perfil e marcou uma entrevista online para 8h. Todavia, o recrutador não apareceu. Ele entrou em contato no dia anterior via WhatsApp, mas não passou detalhes sobre a oportunidade.
Após não comparecer no horário agendado, ele surgiu três horas depois pedindo para realizar o processo naquele momento. Quando Samara disse que não podia, pois tinha outro compromisso, o recrutador se recusou a remarcar a conversa. Leia a íntegra do ocorrido:
Samara [07:51]: Bom dia, Fábio. Tudo bem? Pode enviar o link que já estou aguardando.
Samara [08:44]: Ei, tudo certo?
Recrutador [11:00]: Bom dia. Podemos começar?
Samara [11:04]: Olá, infelizmente não consigo agora. Estava marcado para às 8h e me organizei para este horário. Agora já são 11h. Teria a possibilidade de ser no final do dia?
Recrutador [11:05]: Tenho muitos compromissos. Não consigo.
Samara [11:05]: Entendo, também tenho alguns compromissos agora.
Recrutador [11:05]: Posso imaginar a rotina de tantos compromissos de um desempregado. Obrigado.
Samara [11:06]: Marrapaz. Não é porque estou desempregada que tenho que ficar disponível o dia todo. Neste momento estou [me] organizando pra levar meu filho pra escola e também estou fazendo um pudim que me encomendaram.
Recrutador [11:09]: Sempre difícil contratar quem tem filhos mesmo. Uma dica: foque no que quer.
Samara [11:11]: Não acho difícil trabalhar com quem tem filhos não, difícil é trabalhar com quem não tem compromisso e não respeita o tempo do outro. Estou muito focada, neste momento meu foco é pagar minhas contas e não morrer de fome. Também tenho muitas dicas de gestão pra te dar, mas eu cobro por elas. Se quiser, vai ter que pagar. Boa sorte na sua contratação, principalmente pra quem for contratado, a pessoa vai precisar.
Recrutador [11:14]: Você não é o profissional que estou buscando.
Samara [11:14]: 🙌🏼👍🏼
A mulher, então, decidiu compartilhar o caso no LinkedIn como um alerta para outros profissionais da área. Até esta quarta-feira (13), a postagem já contava com mais de 3 mil comentários. “Aconteceu comigo e estou sem acreditar que exista profissional assim. Não é o tipo de publicação que as recrutadoras gostam de ver no perfil [da rede social], mas é necessário compartilhar”, escreveu ela.
“Postei [no LinkedIn] para que outros recrutadores não façam isso. Pensem que do outro lado tem uma pessoa que está desempregada, mas que tem uma rotina. Essa pessoa trabalha de alguma outra forma, em casa, cuidando de um filho, fazendo um extra, fazendo um bico. Então a pessoa não está à toa”, contou.
Ao g1, a administradora contou que este não foi um fato isolado e que ela tem amigas que já passaram por situações similares, principalmente em relação ao questionamento sobre maternidade. “Precisamos de um amparo maior para exercer essa maternidade com mais tranquilidade. Ter liberdade para trabalhar sem ser questionada se temos filhos, com quem deixamos. Essas perguntas são frequentes nas entrevistas para mulheres, mas não são perguntadas para homens”, observou.
Samara também revelou que, apesar de ter um filho de seis anos, é possível conciliar as funções da sua vida pessoal com o trabalho. “Me senti ofendida, discriminada, humilhada de ter que estar me desdobrando para colocar comida dentro de casa e ainda precisar passar por isso. A mulher precisa ter que se reinventar, ter que empreender a todo momento para poder sobreviver. Um filho não impede uma mulher de trabalhar, pelo contrário, ele é uma motivação”, falou.
Lei Trabalhista
De acordo com o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), toda prática de discriminação em qualquer fase do contrato de trabalho é vedada pela lei trabalhista, até mesmo durante o processo seletivo e de contratação: “Critérios como estado de gravidez, situação familiar, entre outros, não podem ser utilizados como fatores que ensejem prejuízos ou desvantagens dos candidatos às vagas de emprego”.
Samara declarou à publicação que não pretende fazer uma denúncia formal sobre o caso. Ela também decidiu não revelar o nome da empresa ou do recrutador. No entanto, a advogada Bianca Martins Juliani, especialista em direito trabalhista do escritório Abe Advogados, explicou que em caso de abuso, uma situação vexatória ou discriminatória, é possível pedir indenização na Justiça por danos morais na área trabalhista.
Um candidato que passar por esse tipo de situação pode entrar em contato com a Inspeção do Trabalho do MTE, que tem uma área própria para o enfrentamento dessas práticas, a Coordenação Nacional de Combate à Discriminação e Promoção da Igualdade de Oportunidades no Trabalho. Para isso, basta enviar um e-mail para denuncia.sit@mte.gov.br.