Os brasileiros Phelipe de Moura Ferreira, de 26 anos, e Luckas Viana dos Santos, de 31, foram resgatados após fugirem de uma organização criminosa especializada em golpes cibernéticos em Mianmar, no Sudeste Asiático. Ambos estão agora sob custódia das autoridades na Tailândia e aguardam os trâmites para retornar ao Brasil. Segundo familiares, os dois foram vítimas de agressões enquanto estavam sob o controle da máfia.
O pai de Phelipe, Antônio Carlos Ferreira, relatou ao g1 ter falado com o filho por videochamada na manhã desta quinta-feira (13) e viu as marcas da violência sofrida por ele. “Ele ligou para mim e mostrou o machucado dele. Está com a perna toda vermelha, braço todo vermelho, de tanto choque e paulada que levava lá. Aqueles malditos”, desabafou.
A mãe de Luckas, Cleide Viana, também confirmou o contato com o filho e expressou alívio ao saber que ele está seguro. “Ele me ligou na madrugada e está bem, graças a Deus. E agora eu estou bem”, afirmou.
Resgate e fuga
A fuga dos brasileiros foi organizada com o apoio da ONG internacional The Exodus Road, que atua no resgate de vítimas de tráfico humano. No último sábado (8), Phelipe conseguiu avisar a família sobre a tentativa de fuga. Em mensagens enviadas pelo WhatsApp, ele revelou que cruzaria um rio com outras 85 pessoas e precisaria correr por dois quilômetros para escapar.
“Ora por mim e pede para minha vó, Iorrana e todo mundo orar por nós para que tudo dê certo. São 85 pessoas. Eu só quero que tudo dê certo. Eu te amo, pai. Se acontecer algo comigo, saiba que eu tentei ao máximo”, escreveu Phelipe ao pai antes de partir.
De acordo com Antônio Carlos, as mensagens foram enviadas de um número desconhecido em um momento de descuido da organização criminosa. “Ele me avisou sobre a fuga e à ONG também. Estávamos só na expectativa e, graças a Deus, o meu filho foi resgatado. Estou muito feliz, muito feliz mesmo. Você não sabe o que estou sentindo neste momento”, celebrou o pai.
Repatriação
Após serem resgatados, os dois brasileiros foram levados inicialmente para um centro de detenção em Mianmar e, posteriormente, transferidos para uma base militar em Mae Sot, na Tailândia. Segundo as famílias, a Embaixada do Brasil já está providenciando a retirada deles do local e a transferência para Bangkok neste sábado (15), onde os trâmites de repatriação serão finalizados.
“Ainda não temos previsão de quando vai vir pro Brasil, mas o que já sabemos é que logo serão retirados da base de onde estão pela embaixada. Depois vai ser feito o processo de repatriação”, explicou Antônio Carlos.
Relembre detalhes do caso
Em outubro de 2024, o paulistano Luckas Viana dos Santos se tornou vítima de tráfico humano no Mianmar após aceitar uma proposta de emprego internacional. Ele foi sequestrado rumo a uma “fábrica de golpes” no país asiático. O brasileiro contou que tinha uma rotina de mais de 15 horas de trabalho forçado, sob ameaças e castigos.
“Compartilhe fotos minhas em todas as redes sociais, minha vida corre perigo. Fale a todos o que aconteceu, todos precisam saber”, escreveu. Em outra mensagem, ele contou que foi punido com choques que o fizeram sangrar, após descobrirem um de seus pedidos de socorro. “Só quero ir embora. Me ajude, tenho muito medo de morrer. (…) Faz dois dias que não tomo banho. Nós trabalhamos mais de 15 horas por dia. Isso não é vida, não sei o que fazer. Eu quero ir embora ou morrer”, relatou.
Segundo a prima de Luckas, ele foi traficado para “aplicar golpes” em estrangeiros, envolvendo criptomoedas, jogos de azar e investimentos fraudulentos. “A última notícia que tivemos foi que ele estava cheio de hematoma, sem conseguir andar direito pelos castigos que sofreu”, disse um amigo.
Phelipe de Moura Ferreira revelou ao UOL que foi levado ao mesmo local no fim de novembro. “Eles agridem a gente toda hora. (…) Nem falar comigo ele [Luckas] pode, porque eles proibiram desde que eu cheguei aqui. Nos falamos escondidos. Também não podemos demonstrar tristeza, se não nos punem. Se eu sumir já sabe que fizeram algo comigo. Só por favor não manda mensagem para os chineses, não quero que ninguém mais se machuque”, disse o brasileiro nas mensagens enviadas para a sua irmã em dezembro.
“Eles vão tirar nossos órgãos. Como ficar calmo assim?”, escreveu Phelipe ao pai. Antônio revelou que o filho implora para que o resgate chegue logo, entretanto, ele se sente “impotente” diante da falta de informações sobre o que está sendo feito por parte das autoridades brasileiras e locais. Phelipe ainda contou à Antônio que acredita que ele e Luckas serão vendidos em breve: “Eles tiraram umas fotos nossas. Acho que vão vender a gente”.
Ao ser procurado pelo UOL sobre o caso de Luckas, o Itamaraty havia afirmado que “por meio das Embaixadas do Brasil em Bangkok e em Yangon, acompanha o caso, está em contato com as autoridades locais competentes e presta assistência consular aos familiares do brasileiro”. As famílias das vítimas alegaram que autoridades brasileiras dão apenas retornos “protocolares e vagos”.