No feriado da Independência do Brasil, comemorado no dia 7 de setembro, o sargento Renato Kenjiro Tamaki, de 41 anos, manifestou em um grupo do WhatsApp sua opinião a respeito dos manifestantes que saíram às ruas em defesa de pautas antidemocráticas e do governo de Jair Bolsonaro (sem partido). De acordo com a Folha de São Paulo nesta sexta-feira (8), o episódio fez com que o oficial se tornasse alvo de uma sindicância da Polícia Militar de São Paulo e recebesse diversas ameaças.
Segundo a publicação, Renato estava de folga naquele dia e gravou um vídeo de 39 segundos que foi compartilhado no grupo do WhatsApp com colegas de jiu-jitsu, cerca de 50 pessoas. O policial afirmou que o país entraria para o livro dos recordes mundiais por conta “da maior concentração de cornos por metro quadrado”. “Não faça parte desse Guinness aí não: é vergonhoso. Celebre o dia da Independência do seu país, não a celebração da cornaiada”, disse. Tamaki não usava o uniforme da corporação e não fez qualquer menção ao seu trabalho na gravação.
Após as manifestações, os superiores do sargento o comunicaram que ele seria alvo da sindicância por conta do vídeo tido como ofensivo contra os atos bolsonaristas. O policial destacou que, no dia 5 de setembro, ele compartilhou em suas redes sociais um vídeo similar e nas mesmas circunstâncias — sem qualquer menção à PM —, e não teve nenhuma repercussão. No entanto, o tenente-coronel Alípio de Lima Rios, do 20º batalhão, em Barueri (Grande SP), afirmou nos documentos da ação que a atitude de Renato prejudicou a imagem da corporação.
Com 21 anos de carreira e trabalhando em Barueri desde fevereiro de 2020, o sargento foi transferido para Caucaia do Alto, em Cotia, a mais de 40 km de Santana de Parnaíba, cidade na região oeste do estado onde ele mora. Para a Folha de São Paulo, Renato explicou que a mudança impactou drasticamente sua rotina, então ele decidiu pedir afastamento por um ano, enquanto enfrenta a sindicância. Tamaki afirmou que tem sido hostilizado e recebido mensagens de pessoas que estão “na febre”, por isso optou por deixar as redes sociais também.
“Não esperava nenhum tipo de posicionamento por parte da PM por conta de expor a minha ideia. Afinal de contas, estava na minha casa, na minha folga e fiz uma crítica aos manifestantes, se é que posso chamar de manifestantes, que iriam para uma pauta antidemocrática. Não tinha noção da proporção que isso iria tomar“, explicou. Renato Tamaki relatou ainda nunca ter feito post ofensivo sobre a Polícia Militar ou diretamente contra o presidente Jair Bolsonaro, destacando que na eleição presidencial de 2018, ele votou no político, mas se decepcionou com a gestão, principalmente na distribuição de cargos dentro do governo.
A Polícia Militar confirmou que o sargento foi remanejado de unidade e responde a procedimentos internos que podem gerar sanções administrativa-disciplinares, mas não se pronunciou sobre perseguições a Tamaki. “Legalista e fiel cumpridora das suas missões constitucionais, a PM é uma instituição de Estado e não compactua com desvios ou infrações por parte de seus agentes”, escreveu na nota enviada para o jornal.
A Folha de São Paulo ouviu alguns especialistas que divergiram em suas opiniões. A Conselheira do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Isabel Figueiredo, acredita que por não existir nenhum elemento que identifique Renato como PM no vídeo, não seria o caso de serem aplicadas essas medidas. Glauco Carvalho, coronel da reserva e ex-comandante da PM na cidade de São Paulo, que é crítico ao bolsonarismo, defendeu a sindicância como um ato coerente. “Não deve haver manifestações nem a favor e nem contra”, afirmou, recordando o caso recente do coronel Aleksander Lacerda, exonerado por ter usado as redes sociais para convocar manifestantes para os atos bolsonaristas do 7 de Setembro, além de fazer críticas ao governador João Doria (PSDB).