A Polícia Civil investiga um novo golpe envolvendo a falsificação do Ozempic, um tipo de medicamento injetável que possui a semaglutida como princípio ativo. Na noite deste domingo (3), o “Fantástico” informou que teve acesso a diversos boletins de ocorrência por farmácias do Rio de Janeiro, desde agosto deste ano, denunciando e detalhando a ação dos criminosos.
O produto vem em forma de caneta. Cada clique libera uma dose de semaglutida, indicada para pessoas com diabetes tipo 2 e usada igualmente para perder peso, já que um dos efeitos colaterais é a diminuição do apetite. No lugar da substância, as canetas falsificadas tinham insulina, que tira a glicose do sangue.
Ação dos criminosos
De acordo com o dominical, o golpe começa com alguém ligando para a farmácia e pedindo a entrega de cinco ou seis canetas da medicação. Quando o entregador chega ao endereço, antes de se dirigir até a porta, ele é abordado pelo ‘suposto’ cliente. A pessoa é a mesma que fez o pedido, mas ela não mora no local. O golpista finge desistir da compra, retira uma sacola com a medicação trocada de dentro de um carro e a devolve ao entregador, que leva para a farmácia a caneta com insulina e não com semaglutida.
A farmácia é obrigada a devolver o dinheiro do cliente que comprou o produto falsificado. “Quem comprou o medicamento falsificado, óbvio, tem que ser ressarcido“, ressaltou Sérgio Mena Barreto, CEO da Abrafarma. Em nota, a Polícia Civil do Rio informou que “já ouviu vítimas e testemunhas, e que as investigações estão em andamento“. O novo golpe se estende a outros estados, como Minas Gerais e São Paulo.
Relato das vítimas
Três casos de pacientes que compraram a medicação, sem saberem que era falsificada, e passaram mal após a aplicação foram compartilhados pelo jornalístico. Uma mulher, que não teve a identidade revelada, estava usando o produto havia oito meses, com recomendação médica, para emagrecimento.
“Eu apliquei às 8 da manhã. 15 minutos depois, eu comecei a me sentir meia tonta. Deitei no chão, botei as pernas para cima… achando que tinha caído minha pressão. Às 11 horas, não estava normal. Estava muito branca, muito branca e os meus lábios estavam escuros. Eu não consegui colocar o sapato… não conseguia botar o cinto na calça, completamente zonza. E aí a minha funcionária ligou para a minha irmã e ela veio rápido, porque mora pertinho. Minha irmã falou: a gente tem que ir no hospital“, relembrou.
A endocrinologista responsável pela Rede D’or, Luciana Lopes, disse que a paciente chegou ao hospital com a fala arrastada, alteração no nível de consciência e uma “glicemia menor do que 20 miligramas por decilitro“, o que já pode provocar alteração neurológica e até parada cardiorrespiratória. Diante da situação da paciente na UTI, uma das médicas da equipe “logo pensou em ser um Ozempic adulterado, falsificado“.
“A semaglutida é uma substância que não leva a uma glicose muito baixa. O familiar trouxe a medicação pra gente. A gente viu que realmente não era uma caneta original de Ozempic. Na hora que ela injeta insulina, sendo uma paciente que não tinha diabetes, a glicose despencou, caiu demais, porque ela não precisava daquilo ali“, contou Lopes. Traumatizada, a paciente desabafou: “Eu poderia ter morrido e ter deixado um filho pequeno“.
O empresário Rafael Borsetto revelou que está muito assustado. Ele também usava o medicamento para perder peso, mas chegou a ganhar cinco quilos. “Veio no plástico certinho, com o selinho até escrito a nova fórmula“, comentou. Dib Nessin, de 70 anos, tem diabetes tipo 2 e controla a doença há 3 anos com aplicações semanais da caneta de semaglutida.
Nessin relatou que estava sozinho em casa nas duas vezes que passou mal e não quis pedir ajuda para não preocupar a família. Ao saber sobre o produto adulterado, ele ficou revoltado. “Saí dando chute em tudo. Fiquei chorando igual criança“, lamentou. “Tive a sensação de desmaio, sudorese, calafrios e perna bamba. Fiquei totalmente desnorteado. Falei: ‘Gente, estou indo agora? Será? Não é justo“, compartilhou.
Falso x Verdadeiro
Segundo Priscilla Olim Mattar, vice-presidente da área médica da Novo Nordisk Brasil, fabricante do produto, as falsificações vêm fazendo mais vítimas. “Foram cerca de 50 casos que chegaram. Mas 11 desses casos evoluíram com um quadro grave“, disse ela ao dominical. Priscilla também mostrou como os pacientes e as farmácias podem identificar a falsificação.
“Aqui eu tenho as duas canetas. Uma caneta que é a caneta original, a caneta genuína. Ela tem uma cor azul clara. Ela tem essa parte interna que é cinza claro e tem um botão aqui, aplicador, também em cinza. As doses que ela fornece, essa caneta aqui, de um miligrama, só aparece no demonstrador de dose, o número um. Eu tenho aqui uma caneta de insulina, que é azul escuro. A gente já percebe que a primeira grande diferença é a cor. Essa caneta por dentro é laranja, avermelhado. O botão também é da mesma cor, laranja. E quando a gente vai olhar a dose, nesse caso, ela vai de duas em duas. E nesse adesivo que eles estão usando para ‘readesivar’ a caneta, eles escrevem nova formulação“, explicou.
O laboratório também aprovou esta semana com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), uma campanha nas redes sociais e distribuição de cartazes para as farmácias, destacando a diferença entre a caneta original e a falsificada. “A gente quer que isso seja esclarecido o mais rápido possível, porque aqui é uma indústria de saúde. A gente vende medicamento para tratar doenças“, completou Priscilla.
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Veja o alerta da Anvisa: