Débora Falabella se pronunciou pela primeira vez sobre a mulher que a perseguia desde 2015. Em entrevista a Maria Fortuna, do jornal “O Globo”, a atriz falou sobre a prisão da stalker ter sido revogada pela Justiça. Ela, ainda, revelou os “gatilhos” ao encenar a atual peça, que aborda violência sexual, e criticou o projeto de lei que equipara aborto a homicídio.
Em abril deste ano, a Justiça revogou a prisão de uma mulher presa por perseguir Falabella e descumprir medida protetiva. Ela foi declarada “inimputável” e, por ser ré primária, o tribunal autorizou que a mesma respondesse ao processo fora da prisão. Ao ser questionada a respeito da decisão, a atriz refletiu sobre a relação entre um fã e o artista. Débora contou que não conhece e nunca teve contato com a mulher.
“É algo de que evito falar. Porque tem a minha história e a história dela que, com certeza, tem problemas. Estão cuidando para que seja da forma melhor possível, tanto pra mim quanto pra ela. A gente viu ‘Bebê Rena’… Nunca tive contato, não a conheço. É essa relação de fã. É ruim. Tem uma perseguição atrás por um trabalho que faço e pelo qual essa pessoa chega até a mim. E tem a vida dela“, disse Débora.
A mulher, fã assumida da atriz, estava internada em uma clínica psiquiátrica, sendo portadora de distúrbios de origem psíquica e apresentando invalidez pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). A atriz desejou que a stalker receba o tratamento adequado e que fique bem. “Ela tem uma família que pode cuidar, tem condições de ser tratada. Espero que seja. Fico com medo, porque nunca se conhece o outro, nunca se sabe o que vai vir. Atinge muita gente, meu núcleo familiar. É chato. Chato por tudo, porque também quero que ela fique bem“, encerrou.
Gatilhos no palco
A entrevista também abordou os “gatilhos” acendidos pelo seu atual monólogo, “Prima Facie”, em cartaz no Rio de Janeiro. Na trama, Débora dá vida a Tessa, uma advogada bem-sucedida que tem acusados de abuso sexual entre seus clientes. Além de uma reflexão sobre valores e princípios, a obra, escrita por Suzie Miler, também aborda o sistema judicial e diversas condições femininas.
“A gente se dá conta dentro das próprias relações. Tenho 45 anos. Vejo minha sobrinha de 22 com outra cabeça, foi educada numa onda feminista. Até os 30, eu estava um pouco tapada, achando ‘sou artista, tenho liberdade’, mas não era muito assim. Fazer uma peça sobre abuso faz a gente olhar pra trás. E tem coisa que não quer nem mexer. Só que vem. No corpo, na sensação, na emoção. Há um expurgo na hora. Mas fico pensando no porquê de estar fazendo essa peça. Não é algo sobre o que quero falar porque passei. Não é algo claro na minha mente. Mas estou escolhendo por algum motivo. Ainda estou descobrindo“, explicou.
Falabella revelou que a peça a fez entrar em contato com situações que já viveu no passado. “Até porque, mostra que muitos homens não acham que estão cometendo aquela violência. Isso é cruel com a mulher. Com meus antepassados, sexo não consensual no casamento não era considerado estupro. Como mulher, fomos subjugadas dessa forma. Sinto esses gatilhos na hora em que faço o espetáculo. É importante discutir leis e rever onde deixamos essas coisas acontecerem“, ressaltou. Veja alguns trechos:
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A jornalista destacou que a frase da peça, “Só fique aí deitada e me deixe fazer amor com você”, é violenta e, muitas vezes, acaba sendo normalizada. E a atriz opinou: “Nessa hora, consigo escutar na plateia coisas como: ‘ihhh’, ‘hum’, ‘ai’. Você vê que o público conecta, tipo: ‘Rolou comigo’“. Para não absorver os casos que chegam até ela, Débora recorre à terapia.
“Com todas essas questões que hoje a gente vê levantadas, com o ‘Me Too’, etc., é difícil olhar e ver que não viveu algo assim. Nem lembro, não sei se minha mente apagou algum tipo de abuso. Sou atriz desde muito nova. Sempre fui muito fechada. Isso era péssimo, mas por outro lado, me protegeu“, refletiu.
“Pequenos abusos a gente vai ficando esperta, como os morais e os de gênero no trabalho. Questões como fazer o mesmo trabalho que o ator e receber menos é algo que temos que lidar a todo minuto. Melhorei um pouco, mas sou uma pessoa travada para emitir opiniões. Me encontrei no teatro por isso. Consigo emocionalmente e com meu corpo dar voz ao que não consigo falar publicamente. Digo que é complemento de terapia“, pontuou.
Projeto de Lei 1904/24
A artista, ainda, opinou sobre o projeto de lei que equipara aborto a homicídio, que teve regime de urgência aprovado pela Câmara dos Deputados na quarta-feira (12). A proposta estabelece a aplicação de pena de homicídio nos casos de aborto com mais de 22 semanas, inclusive estupros. Com o PL, as mulheres estupradas que abortarem passarão mais tempo na cadeia que seus próprios estupradores.
“Um absurdo. Desesperador. A maioria das mulheres que passa por isso são crianças, vulneráveis que foram estupradas. Aprovar essa proposta é como aprovar o estupro dessas meninas. Elas viram uma ré. Na peça, falamos desse sistema que não olha para as mulheres e ainda penaliza. […] Se houvesse um sistema que nos protegesse, não teríamos que nos expor publicamente. Leis são dadas como ciência exata. E não pode ser assim com agressão sexual. Porque as vítimas não têm visão exata do que aconteceu e ficam traumatizadas“, concluiu.
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