Nesta semana, a enfermeira Lucy Letby, de 33 anos, foi condenada a prisão perpétua por assassinar sete bebês e tentar matar outros seis. Os crimes ocorreram no Hospital Condessa de Chester, na Inglaterra, entre junho de 2015 e junho de 2016. Durante o julgamento, o tribunal ouviu os depoimentos comoventes dos pais das vítimas, que relataram histórias dignas de um “filme de terror”.
Além de aplicar injeções de insulina e ar nas crianças que estavam na UTI neonatal, Lucy deu leite à força e sem prescrição para os bebês. Enquanto alguns relatos foram lidos pelo juiz, outros foram enviados pelos casais em formato de vídeo. Segundo Judith Moritz, correspondente da BBC, muitos dos presentes choravam em silêncio. Os membros do júri, de acordo com a jornalista, também não escondiam o abalo emocional.
A enfermeira foi considerada culpada em 14 das 22 acusações, durante o julgamento no Manchester Crown Court. Nenhuma das vítimas ou suas famílias tiveram os nomes revelados. Letby se recusou a comparecer ao tribunal para acompanhar sua sentença, além de ouvir as declarações. Segundo o juiz James Goss, no entanto, ela vai receber uma cópia com todas as falas e observações.
Nos depoimentos, os pais dos bebês que sobreviveram afirmaram que as crianças ficaram com deficiências graves. O pai de uma menina expôs as sequelas da filha. “Ela ficou gravemente incapacitada, foi diagnosticada como cega, precisando ser alimentada por via intravenosa, com paralisia cerebral e escoliose progressiva. Ela nunca irá a uma festa do pijama, não frequentará a escola, não terá um namorado, nem se casará. E se ela viver mais que nós? Quem cuidará dela?”, questionou o homem, cuja filha foi atacada por Letby em setembro de 2015.
Outra mãe descreveu a filha como uma “criança saudável”, antes de ser morta pela enfermeira com uma injeção de ar na corrente sanguínea e no estômago. “Ela bebia mamadeiras completas no meu colo, estava muito alerta, sorria frequentemente e nunca chorava, era uma garotinha muito feliz”, relatou. Dias depois, ela e o marido foram informados que a bebê estava em “colapso” e precisava ser frequentemente “ressuscitada”.
“Fomos chamados e disseram que fôssemos ao hospital porque ela tinha sofrido outro colapso. Quase não comíamos nem dormíamos porque ela precisava ser constantemente ressuscitada. Ela era a nossa linda princesinha e não consigo expressar a dor de tê-la perdido. Uma parte de nós morreu com ela”, continuou.
Ela contou que mesmo após um ano da morte da filha, precisava usar óculos de sol para esconder as lágrimas dos outros herdeiros, além da dificuldade de sair em público, comer e dormir. “Senti todo o meu corpo tremer quando soube da prisão. Nunca vou me recuperar do fato de que nossa filha foi torturada até não ter mais como resistir”, desabafou.
Os pais do gêmeos atacados por Lucy também descreveram o triste episódio. Um dos meninos acabou morrendo nas mãos da enfermeira. Inicialmente, segundo eles, os médicos disseram que o que aconteceu com os filhos em 2016 era normal para bebês prematuros. Um ano depois, no entanto, a polícia revelou que o caso poderia ter sido uma tentativa de homicídio.
“Em um dos dias de julgamento, a bancada estava cheia de espectadores, e eles me colocaram em um lugar onde eu tinha uma visão direta de Lucy Letby, e ela ficava me olhando constantemente. Senti-me muito desconfortável e perturbado, e tive que mudar de lugar à tarde para não estar no campo de visão dela. Ela acreditou que tinha o direito de brincar de Deus com a vida dos nossos filhos”, lamentaram.
Os familiares de mais uma vítima relembraram o dia em que foram chamados na UTI neonatal. “Foi o pior dia de nossas vidas. Vendo nosso pequeno bebê lutando pela vida. Observando os médicos realizando reanimação cardiopulmonar em seu corpinho. A cada dia que passa, não deixamos de pensar naquele dia”, desabafou a mãe.
O menino sobreviveu à tentativa de assassinato, mas sofreu danos permanentes. Após o caso, ela e o marido desistiram de ter mais filhos. “Nós não queremos que ela saiba o dano que causou, nem queremos que ela tenha a satisfação da dor que infligiu”, acrescentou.
Pais de trigêmeos, o último casal a prestar depoimento afirmou que a enfermeira “destruiu suas vidas”. Dois dos meninos foram assassinados por Letby em 2016. “Comecei a me culpar. Que eu tinha transmitido uma doença aos três bebês, uma infecção”, lembrou a mãe. Ela relatou, ainda, que recebeu uma mensagem de Lucy após o falecimento das crianças e chegou a agradecer a enfermeira pelo apoio. No texto, Letby afirmou que estava “inconsolável” e tinha visto os bebês dormindo tranquilamente nos berços.
“Detesto o fato de que Lucy Letby tenha sido a última pessoa a segurar meu filho. Ela arruinou nossas vidas. Só tenho uma foto minha segurando os três bebês juntos. Tenho tido ataques de pânico que exigiram intervenção médica. O meu terceiro filho, à medida que cresce, está fazendo perguntas sobre seus irmãos”, contou.
O pai dos trigêmeos também falou sobre o “terror” de testemunhar a morte de uma das crianças. O bebê sobreviveu, mas faleceu logo após o batizado. “É uma imagem que nunca esquecerei, no fundo do meu coração sabia que não acabaria bem. Senti como se tivessem enfiado uma faca no meu coração, não há palavras para descrever como me sentia. Desejava que isso estivesse acontecendo comigo, e naquele momento, prontamente teria trocado de lugar com ele”, afirmou.
Matei de propósito
Condenada a prisão perpétua, Lucy negou as acusações e disse as mortes foram causadas pelas “condições de higiene do hospital”. A promotoria, porém, apontou que a mulher era uma oportunista que “iludiu” colegas para encobrir seus “ataques assassinos“. A polícia local continua examinando casos para identificar outras possíveis vítimas da enfermeira.
As ações de Letby vieram à tona quando médicos se preocuparam com o número de óbitos sem explicações e colapsos nos pacientes a partir de janeiro de 2015. Os profissionais não conseguiram encontrar uma razão clínica para elucidar as mortes e a polícia foi acionada. Após uma longa investigação, a enfermeira foi apontada como “presença malévola constante quando as coisas pioraram“, segundo o promotor Nick Johnson, autor da investigação.
Após a prisão, autoridades encontraram documentos e anotações médicas com referências às crianças envolvidas no caso na casa dela. “Eu os matei de propósito porque não sou boa o suficiente para cuidar deles”, escreveu Lucy em uma nota localizada por policiais. “Sou uma pessoa horrível e má”, disse. “Eu sou má, eu fiz isso“, acrescentou. Outras anotações supostamente falavam sobre sua inocência. Clique aqui para saber os detalhes.