O casal que viralizou desde domingo (05), quando apareceu humilhando um fiscal da Vigilância Sanitária diante das câmeras do “Fantástico”, concedeu uma entrevista ao G1, publicada nesta quinta-feira (09). Na conversa, Nívea Valle Del Maestro e Leonardo Santos Neves de Barros alegam que foram mal-interpretados e lamentam as consequências do episódio em suas vidas.
Durante a reabertura dos bares no Rio de Janeiro, no último fim de semana, Nívea foi filmada enquanto dizia que o marido era superior ao fiscal, que estava fazendo seu trabalho, por conta da formação universitária.
Na gravação que viralizou na web, os fiscais apontaram que um estabelecimento não cumpria as determinações de distanciamento social e de regras de higiene após uma inspeção. Foi então que os dois clientes vieram tirar satisfação. “Cadê sua trena? Eu quero saber como você mediu as pessoas?”, disparou Leonardo. O fiscal tentou responder: “Cidadão…”. Até que a mulher o interrompeu: “Cidadão não, engenheiro civil, formado, melhor do que você”. Assista:
Bolsonaristas que estavam descumprindo regras sanitárias em bares na pandemia agridem fiscais.
"Cidadão não! Engenheiro civil formado, melhor dq vc", disse a Bolsonarista para o agente.
"A gente paga vc filho!"
Deprimente viver na mesma sociedade, com pessoas tão ignorantes. pic.twitter.com/YsN7r16ayE— Rudá Morcillo🦑 (@RudaMorcillo) July 6, 2020
Questionada se estava arrependida da reação acalorada, Del Maestro negou. “Não é arrependimento. Hoje posso reconhecer minha alteração de voz e meu tom foi mal interpretado. Se a gente se arrepende de alguma coisa é de ter saído de casa”, pontuou ela, que tentou explicar sua versão dos fatos.
“Ele (o fiscal) respondia: ‘Cidadão, vai lá na prefeitura para ver o procedimento’. Aquilo dava a entender que ele não tinha obrigação de responder. Então, esse ‘cidadão’ se tornou algo pejorativo, não era um substantivo. Senti aquilo de uma forma agressiva”, justificou Nívea. “Naquele momento, eu interferi e disse que era um engenheiro civil formado. Quando disse ‘melhor do que você’, quis dizer que ele sabe o que fazer aqui e fiscal, não. Ele não dava provas técnicas do que estava fazendo”, apontou ela.
“O que eu quis naquele momento foi, de forma alguma, humilhar aquela pessoa. Eu nem conheço aquela pessoa. Ali, eu estava nervosa, queria defender meu marido. Minha frase ficou descontextualizada. Sei que tenho tom de voz alta, tenho sangue italiano, e às vezes se torna agressivo no calor da emoção. Mas em momento algum eu desacatei ou quis diminuir o rapaz”, afirmou a engenheira química, que acabou demitida após o episódio.
“Continuamos achando que temos o direito de questionar os servidores públicos. Não é afrontar – é questionar tudo aquilo que possa ser considerado arbitrário. Isso nós não podemos perder. Do contrário, as pessoas vão ficar com medo de agir. Nunca vou me arrepender de questionar. Talvez eu possa reconhecer que houve um excesso que, descontextualizado, ficou ainda pior. Dentro do contexto, nem acredito que tenha acontecido tanto excesso assim. Mas realmente, eu quando olho aquela cena fico com raiva daquela mulher. Não é possível que uma pessoa, do nada, aja daquela maneira. Mas não foi do nada. Existe um contexto, existe uma história. Existem atos antes e depois”, declarou.
Leonardo, por sua vez, pontuou ter ido falar com o fiscal apenas para entender por que não podia mais ficar no bar. “É um bar que sempre frequentamos. Eu estava respeitando todo o espaçamento – usei o celular porque não sabia o que poderia acontecer. É o momento em que fui de (sic) encontro ao Flávio Graça”, contou. “Questionei por que deveríamos sair dali. Queria saber como ele sabia que ali havia duzentas pessoas. Eu só queria permanecer no bar. Quero ter o direito de chegar ao ente público e questioná-lo”, explicou.
Tanto Nívea, que trabalhava como especialista em planejamento e controle em um projeto de construção, quanto Leonardo, que trabalhava com gerenciamento de risco, foram demitidos. Os dois apontaram que devem se mudar de casa, já que não têm mais como pagar o aluguel, e lamentaram o “linchamento virtual” que estão recebendo.
“Nós já estamos sendo condenados sem direito de defesa. Nossa vida acabou. Perdemos nossos empregos e estamos sendo achincalhados. Estou recebendo ameaças por telefone e todos os nossos dados pessoais foram parar na internet. Os efeitos que isso causou na gente são desproporcionais. Há um linchamento virtual, todas as mensagens que recebo no celular de pessoas me agredindo. A coisa chegou a um nível no qual, além de perdermos nossos empregos, querem que não trabalhemos nunca mais. O que querem mais? Querem que a gente morra?”, questionou a mulher.
Leonardo disse que também teme por seu filho. “Tenho filho que fez aniversário e fiquei com medo de sair na rua para poder abraçá-lo. Já descobriram até o endereço da mãe dela. Todos os nossos dados foram vazados. Precisei sair de todas as redes sociais”, desabafou. “Estamos pedindo a amigos médicos que nos prescrevam calmantes para podermos dormir. Por mais que a gente tenha cometido um erro, o que está acontecendo com a gente é desproporcional. Uma coisa é receber uma crítica – outra é essa condenação que estamos recebendo. A gente perdeu tudo, a gente perdeu tudo”, completou Nívea.