Nesta quinta-feira (4), o “Linha Direta” voltou para a programação da Globo, sob comando de Pedro Bial. No primeiro episódio, o programa abordou o “Caso Eloá“. Em 2008, a jovem Eloá Cristina Pimentel, de 15 anos, foi mantida refém pelo ex-namorado, Lindemberg Alves Fernandes, de 22. Além dela, outros três adolescentes estavam no local. Após cinco dias, a tragédia terminou com a morte de Eloá. No “Linha Direta”, o promotor Antonio Nobre Folgado elencou os erros da polícia durante a negociação e criticou o papel da imprensa na conclusão do caso.
Eloá e Lindemberg haviam namorado por dois anos e sete meses até o fim do relacionamento. Arrependido do término, o rapaz tentou reatar o romance e não aceitou quando a ex resistiu. Ele passou a persegui-la, chegando a agredir a menina fisicamente. Ao não conseguir o que queria, o jovem fez planos de matá-la, tudo por não admitir que a adolescente “vivesse sem ele“. O crime começou no dia 13 de outubro de 2008, uma segunda-feira, por volta das 13h.
Erros da polícia
Os primeiros a serem liberados por Lindemberg foram Iago Vieira e Victor Lopes. Após três dias de sequestro, o criminoso também soltou Nayara Rodrigues da Silva. No dia seguinte, porém, a polícia permitiu que Nayara voltasse ao apartamento para ajudar nas negociações, após um pedido do criminoso. Segundo o promotor Antonio Nobre Folgado, responsável pela acusação, esse foi o primeiro e principal erro da polícia. Lindemberg garantiu que libertaria Eloá em seguida, o que não aconteceu. Na época, Nayara também era menor de idade.
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De acordo com o promotor, a menina não deveria ter sido novamente envolvida no caso. “Esse foi o grande erro da polícia, a volta da Nayara. Se trata de uma menina de 15 anos, uma menor, foi trazida ao palco dos acontecimentos sem autorização da mãe e foi convencida a subir sozinha no apartamento. O acordo, feito na presença dos policiais, era ela chegar próximo à porta, estender a mão e trazer Lindemberg e Eloá para fora. Uma menina de 15 anos de idade ia resolver um caso que o Brasil inteiro estava assistindo e que a própria polícia não conseguia resolver?”, questionou.
“Ela tinha sob o Lindemberg uma certa ascendência e essa menina sentia isso. Ela sentia que podia resolver esse caso. O Lindemberg, de maneira ardilosa, fez com que ela entrasse no cativeiro apontando uma arma para a cabeça da Eloá. Ela não teve alternativa a não ser entrar”, acrescentou.
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Após 100 horas de sequestro, a invasão dos policiais começou a ser preparada e foi transmitida ao vivo. A versão da polícia aponta que houve um disparo dentro do apartamento, o que teria motivado a decisão dos agentes. No entanto, investigações independentes constataram que a arma do criminoso não foi usada antes da ação. Peritos negaram qualquer barulho de disparo vindo do local. Em entrevista, Nayara confirmou que Lindemberg só atirou quando os policiais entraram no apartamento. De acordo com Antônio Nobre, esse era mais um erro da polícia, que ainda teria inventado a história.
“Não houve disparo nenhum. Essa história do disparo foi inventada porque teve um resultado trágico, como se a polícia precisasse ter um motivo para entrar no apartamento. E não precisava”, disse o promotor. Segundo ele, o caso estava próximo de ser resolvido: “Dez minutos antes da invasão, o Lindemberg começou a proferir frases de tom suicida. São falas que demonstram que algo estava para acontecer”.
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Um atirador de elite também foi acionado no prédio em frente, mas a neblina atrapalhou a ação. Foi quando os agentes decidiram ir para o “plano B” e invadir o local, em 17 de outubro. De acordo com o promotor, porém, o assassino percebeu que a invasão estava em andamento e se preparou para revidar. “A invasão feita sem o elemento surpresa corre um sério risco de não dar certo, e não deu”, afirmou, apontando novos erros.
“O que ele faz: pega uma mesa de centro e escora a porta. Essa mesa faz com que a polícia demore 15 segundos para conseguir entrar no apartamento. É uma eternidade, porque com quatro segundos ele já está efetuando os disparos na Eloá. Dois na Eloá e um na Nayara. Antes da porta ser derrubada, um dos policiais do GATE consegue colocar uma espingarda e efetua o quarto disparo, que atinge a parede ao lado do Lindemberg. Ele só não efetuou mais nenhum disparou porque acabou a munição”, explicou.
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Por fim, segundo o promotor, os policiais também falharam por serem muito “benevolentes” com o criminoso nas negociações. “Um excessivo tempo dado ao Lindemberg. A polícia foi muito benevolente com ele nas negociações. A invasão teria que ser feita bem antes, aproveitando um período de descanso dele, o que não aconteceu”, lamentou.
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Atuação da imprensa
O “Linha Direta” também falou sobre a atuação “muito próxima” da imprensa no caso. Com a cobertura intensa da mídia, o criminoso conseguiu acompanhar tudo o que se passava do lado de fora do prédio, inclusive a ação da polícia. Segundo o promotor, uma apresentadora de TV também atrapalhou as negociações entre o assassino e os agentes. Apesar do programa não citar nomes, nas redes sociais, internautas apontaram Sônia Abrão como a responsável. Na época, ela conversou com Lindemberg Alves duas vezes.
“Teve um momento em que uma apresentadora de televisão se colocou como negociadora e interrompeu a negociação com a polícia. Nesse dia, no dia 15, à tarde, havia um acordo feito entre o capitão, o irmão da Eloá, o Douglas, e o próprio Lindemberg para ele se render. Quando entra essa apresentadora tentando resolver a situação, o Lindemberg percebe que está ao vivo e resolve prolongar tudo porque ele era o centro das atenções. Então prejudicou a polícia”, afirmou Antonio Nobre Folgado.
"Teve um momento em que uma apresentadora de televisão se colocou como negociadora e interrompeu a negociação com a polícia. Nesse dia, no dia 15, havia um acordo feito entre o capitão, o irmão da Eloá e o Lindemberg para ele se render.“ #LinhaDireta
— Dantas (@Dantinhas) May 5, 2023
A própria Globo se envolveu no caso, e mostrou trechos da repórter Zelda Mello falando com o criminoso. A imprensa acompanhou o caso em tempo real, durante os cinco dias de sequestro. O jornalista César Tralli, um dos entrevistados, disse que os policiais deveriam ter dificultado o trabalho da mídia, o que não aconteceu.
“A polícia não estabeleceu limite para o trabalho jornalístico, o que eu vi como um equívoco muito grande. Como jornalista, tudo que você quer é estar o mais próximo possível do fato. O trabalho da polícia seria dificultar a aproximação dos jornalistas para você poder trabalhar aquela situação com o máximo de tranquilidade possível”, opinou Tralli.
Na época como apresentadora do “Hoje em Dia”, Ana Hickmann chegou a pedir que o sequestrador fosse até à janela para acenar como um sinal de que tudo estava tudo bem. O jornalista Reinaldo Gottino, do “SP Record”, também conversou com o assassino.
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De acordo com Antonio Nobre, policiais e imprensa deveriam ter trabalhado juntos. “Tem que noticiar, mas sem atrapalhar. Existe um conflito entre dois princípios: o da preservação da vida e o do direito à informação. No choque entre eles, o mais importante, que é o direito à vida tem que prevalecer”, explicou.
Para ele, a cobertura do caso permitiu que o criminoso estivesse por dentro de todas as movimentações, e o desfecho poderia ter sido diferente. “A imprensa deveria ceder, permitir que os policiais trabalhassem sem que, como ocorreu no caso, o sequestrador visse toda a movimentação do lado de fora. Sem essas filmagens eles poderiam atuar e no final ia ao ar. Tem que haver uma conjunção entre o trabalho da polícia e dos repórteres, e não houve”, concluiu.
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Desfecho trágico
Enquanto Nayara foi atingida no rosto, Eloá foi atingida na virilha e na cabeça, e levada imediatamente para a cirurgia em estado grave. A jovem teve morte cerebral confirmada no dia 18 de outubro, um dia após a invasão.
O criminoso, em contrapartida, saiu ileso e foi levado pelos policiais. “Lindemberg foi condenado a 98 anos de prisão. Em 2013, o Tribunal de Justiça de SP reduziu a pena para 39 anos de reclusão, menos da metade da primeira. Em 2021, Lindemberg conseguiu o benefício do regime semiaberto, em que o detento pode trabalhar durante o dia e voltar pro presídio durante à noite”, disse o apresentador.
“O benefício foi revogado depois de 4 meses porque laudos psiquiátricos provaram que Lindemberg apresenta comportamentos antissociais e agressivos. Hoje Lindemberg está de novo em regime semiaberto. Mas o Ministério Público recorreu e a decisão ainda é esperada”, finalizou.
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