Na última quinta (19), às vésperas do dia da Consciência Negra, um episódio lamentável e absurdo parou o Brasil: João Alberto Silveira Freitas, um homem negro de 40 anos, foi espancado até a morte por dois seguranças brancos no supermercado Carrefour, em Porto Alegre. Nesta segunda (23), a apresentadora Fátima Bernardes dedicou o “Encontro” à discussão de pautas antirracistas e conversou com uma das filhas de João Alberto, Thaís.
Thaís descobriu a morte do pai por uma ligação, quando o vídeo da agressão já circulava pela internet. “Eu soube quinta-feira de noite, que me ligaram, me avisando dos vídeos que estavam rolando na internet, que até então eu não tinha visto. Recebi [as imagens] logo que eu desliguei o telefone. Horrível”, contou ela, relembrando a sensação de revolta causada por aquele momento. “Senti uma raiva, porque aquilo ali não se faz com ninguém, mesmo que a pessoa esteja certa, errada, isso não se faz. Não precisava de toda aquela agressividade deles”, dividiu.
Ao ser questionada sobre conversas com o pai sobre racismo e discriminação, ela relatou que esse não era um tópico entre os dois. “Nunca. Até porque quando ele morava aqui, antes de morar com a atual esposa, não tinha quem não gostasse dele”, ressaltou. Ainda segundo Thaís, o fato de João Alberto ser negro teve clara influência no caso.
Já em relação à repercussão de sua morte, que motivou vários protestos por todo o país, Thaís não escondeu sua surpresa. “Eu entendo que, pela nossa cor, por nós sermos negros, que muita gente ia pegar e fazer tudo que tá fazendo, mas não cheguei a imaginar [a proporção]”, confessou a mulher, afirmando, em seguida, que espera que o ocorrido mude a situação do racismo no Brasil.
A jovem tem uma filha de seis anos, que ouviu sobre a morte do avô por meio da televisão. “Quando ela viu a foto dele na televisão, ela perguntou o que que ele tava fazendo na televisão. Aí fui obrigada a explicar”, descreveu Thaís. E completou: “Comentei por cima, porque ela tinha olhado os vídeos na televisão, falei que ele tinha ido encontrar a mãezinha dele, a vó dela, que ela gosta muito, por conta da nossa cor. Que a gente não pode ter vergonha. Quem tem que ter vergonha é quem não gosta da gente por conta da gente ser negro”, descreveu.
Pensando no futuro que deseja para a filha, agora sem um avô presente, Thaís foi direta e concisa. “Que não tenha mais esse negócio de racismo, de olhar as pessoas [de forma] diferente pelo fato de ser negra. Nós somos todos iguais, independente da cor”, finalizou.
Homenagens
O programa matinal de Fátima Bernardes mostrou ainda as homenagens deixadas para João Alberto no Carrefour e cobriu a reabertura do mercado após o assassinato. O repórter correspondente falou com um pedestre que passava por ali. “Já não é a primeira vez que acontece, uma vez que comprei aí dentro, eu entrei e eles (os seguranças) começaram a me encarar. Eu baixei a cabeça e deixei para lá. Isso dói muito”, indicou o entrevistado.
O “Encontro” trouxe ainda o especialista Felipe Freitas, doutor em Direito, que discorreu sobre o assassinato. “Infelizmente esse não é um caso isolado. O que aconteceu com João Alberto representa o cotidiano de toda uma população negra. É muito importante a gente reconhecer e se indignar. Independentemente do que houve, aquele grau de crueldade tem um complemento racial e aquele medo é o que as pessoas negras sentem”, pontuou Felipe.
Confira um trecho da participação de Freitas:
"É muito importante que as pessoas negras possam falar na sociedade e é muito importante que a sociedade tenha compromisso de ouvir o que essas pessoas estão falando. Isso é central pra vida democrática, isso é a única condição para o Brasil avançar." #Encontro pic.twitter.com/wODnYw9K2x
— TV Globo 📺 (@tvglobo) November 23, 2020