Mourão comenta assassinato de homem negro em supermercado e afirma: “No Brasil não existe racismo”; assista

Após o brutal assassinato de João Alberto Silveira Freitas, que foi espancado até a morte em um supermercado em Porto Alegre (RS), o vice-presidente do Brasil afirmou que “não existe racismo” no país. Na tarde de hoje (20), Hamilton Mourão repetiu a frase por diversas vezes, enquanto comentava o crime que tem causado revolta em pleno “Dia da Consciência Negra”.

Mourão falava com a imprensa, quando classificou o caso como “lamentável” e criticou a posturas dos seguranças do supermercado Carrefour. “Lamentável, né? Lamentável isso aí. Isso é lamentável. Em princípio, é segurança totalmente despreparada para a atividade que ele tem que fazer”, disse. Pouco depois, ele engatou na fala revoltante sobre racismo: “Para mim, no Brasil não existe racismo. Isso é uma coisa que querem importar aqui para o Brasil. Isso não existe aqui”.

Hamilton Mourão não só afirmou, como REPETIU, que não existe racismo no Brasil. (Foto: Reprodução/G1)

Questionado pelos repórteres por repetidas vezes, o vice-presidente repetiu sua opinião descompensada, supondo que a morte de João Alberto não teria a ver com a questão racial. “Não, eu digo para você com toda a tranquilidade: não tem racismo aqui”, declarou.

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Foi então que Mourão tentou argumentar citando experiências que ele teria vivido na década de 1960, nos Estados Unidos. Sim, um argumento baseado em algo de mais de 50 anos atrás. “Eu digo para vocês o seguinte, porque eu morei nos EUA: racismo tem lá. Eu morei dois anos nos EUA, e na escola em que eu morei lá, o ‘pessoal de cor’ andava separado. Eu nunca tinha visto isso aqui no Brasil. Saí do Brasil, fui morar lá, era adolescente e fiquei impressionado com isso aí. Isso no final da década 60”, mencionou ele.

“Mais ainda, o ‘pessoal de cor’ sentava atrás do ônibus, não sentava na frente do ônibus. Isso é racismo. Aqui não existe isso. Aqui você pode pegar e dizer é o seguinte: existe desigualdade. Isso é uma coisa que existe no nosso país. Nós temos uma brutal desigualdade aqui, fruto de uma série de problemas. Grande parte das pessoas de nível mais pobre, que tem menos acesso aos bens e as necessidades da sociedade moderna, são ‘gente de cor’, apesar de nós sermos uma sociedade totalmente misturada”, concluiu o vice-presidente.

Assista ao discurso aqui:

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O presidente da Fundação Palmares – órgão do governo federal criado para promover valores culturais e sociais da influência negra no Brasil – também alegou que não existe um racismo estrutural no Brasil. “Não existe racismo estrutural no Brasil; o nosso racismo é circunstancial — ou seja, há alguns imbecis que cometem o crime. A ‘estrutura onipresente’ que dia e noite oprime e marginaliza todos os negros, como defende a esquerda, não faz sentido nem tem fundamento”, disse Sérgio Camargo em uma rede social.

https://twitter.com/sergiodireita1/status/1329874897078771714?s=20

Contudo, não é isso que os dados expõem. De acordo com a Agência Brasil, o Atlas da Violência 2020 apontou que os índices de assassinatos de pessoas pretas e pardas cresceu 11,5% entre 2008 e 2018. Enquanto isso, a violência contra não negros – brancos, amarelos e indígenas – caiu 12,9% no mesmo período. Os números são do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).

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Infelizmente, a morte de João Alberto é mais uma das que entraram para essas tristes estatísticas… Ao contrário do que o governo pode tentar dizer, os números do Brasil deixam claro que as pessoas pretas têm sofrido cada dia mais com a violência e com o preconceito. E isso tem um nome: racismo. Racismo existe. Racismo mata!

Entenda o caso

Um homem negro de 40 anos foi espancado até a morte na noite dessa quinta-feira (19), por dois homens brancos, no estacionamento do supermercado Carrefour, localizado no bairro Passo D’Areia, em Porto Alegre (RS). O episódio aconteceu às vésperas do ‘Dia da Consciência Negra’ e, com razão, vem gerando grande revolta nas redes sociais.

Ambos suspeitos, um de 24 anos e outro de 30, foram presos em flagrante. De acordo com o G1, um deles é policial militar e foi levado para um presídio militar, enquanto o segundo, segurança da loja, foi encaminhado para um prédio da Polícia Civil. A Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) de Porto Alegre investiga o caso e trata o crime como homicídio qualificado.

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Em respeito à vítima, identificada como João Alberto Silveira Freitas, o hugogloss.com não replicará o vídeo aterrorizante da agressão. O registro – de revirar o estômago – mostra também uma ambulância do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) chegando ao local e tentando reanimar “Beto”, como era conhecido, mas ele não resistiu. A perícia no local já foi feita e a polícia, agora, analisará as imagens de câmeras de segurança e colherá depoimentos.

João Alberto, de 40 anos, foi espancado e morto por dois homens brancos em Porto Alegre. (Foto: Reprodução/Instagram)

Em nota, a Brigada Militar do Rio Grande do Sul informou que o espancamento começou após um desentendimento entre a vítima e uma funcionária do supermercado. João teria ameaçado bater na trabalhadora que, por sua vez, acionou a equipe de segurança. “A esposa [da vítima] referiu que eles estavam no mercado fazendo compras, que o marido fez um gesto, que ela não soube especificar, para a fiscal. E ele teria sido conduzido para fora do mercado”, declarou a delegada Roberta Bertoldo.

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“Informações que foram colhidas com a equipe de peritos desse caso, que não ainda o laudo concluído, apontam suposições sobre a causa da morte, e que ele (João) possa ter tido um ataque cardíaco em função das agressões, porque ficou custodiado com duas pessoas em cima. Talvez tenha sido essa a causa da morte”, prosseguiu ela.

Ainda segundo o comunicado, o PM envolvido na agressão é “temporário” e estava fora do horário de trabalho. As atribuições do agressor na corporação são limitadas a “execução de serviços internos, atividades administrativas e videomonitoramento” e “guarda externa de estabelecimentos penais e de prédios públicos“. A Brigada não informou o que ele fazia no mercado.

Confira a nota da Brigada na íntegra, o posicionamento do Carrefour e as reações de revolta pelas redes sociais, bem como a organização de protestos sobre o caso, clicando aqui.