A auxiliar doméstica Mirtes Renata Santana de Souza, mãe de Miguel Otávio, de 5 anos, escreveu uma nota para a ex-patroa Sarí Gaspar Côrte Real, indiciada na morte do menino por homicídio culposo. O garoto caiu do 9º andar de um prédio, que faz parte de um conjunto conhecido como “Torres Gêmeas”, em Recife, após a primeira-dama de Tamandaré o deixar andar sozinho de elevador, sem qualquer supervisão de um adulto.
O texto de Mirtes, composto com ajuda do advogado Rodrigo Almendra, é uma resposta ao pedido de desculpas feito por Sarí anteriormente, numa carta encaminhada à imprensa na última sexta (5). “Não recebi qualquer pedido de desculpas. A carta de perdão foi dirigida à imprensa, o que me faz pensar que eu não era destinatária, mas sim a opinião pública com a qual ela se preocupa por mera vaidade e por ser esse um ano de eleição”, supôs a doméstica, sobre as verdadeiras intenções da esposa do prefeito Sérgio Hacker (PSB).
Gaspar foi presa por homicídio culposo, mas responde pelo crime em liberdade, após pagar uma fiança de R$ 20 mil. Em seu pronunciamento, Souza pediu por justiça: “Quando eu grito que quero justiça, isso significa que eu preciso que alguém assuma a minha dor, lute minha luta, seja o destilado da cólera que eu não quero e nem posso ser. Eu não tenho forças neste momento, não tenho chão. Não tenho vida!”.
A mãe ainda considerou o pedido de desculpas da ex-patroa “desumano”. “Sabemos que ela não trataria assim o filho de uma amiga. Ela agiu assim com o meu filho, como se ele tivesse menos valor, como se ele pudesse sofrer qualquer tipo de violência por ser ‘filho da empregada'”, lamentou.
“A aplicação de uma pena será libertadora, abrandará o meu sofrimento, permitirá o meu recomeço e abrirá espaço para o que foi pedido: perdão. Antes disso, perdoar seria matar o Miguel novamente”, concluiu Mirtes.
Também nessa quarta (10), segundo o Uol, o zelador do condomínio onde tomou local o acidente, prestou depoimento ao delegado responsável pelo caso, Ramon Teixeira. Nenhum dos dois falou com a imprensa. De acordo com a assessoria de comunicação da Polícia Civil de Pernambuco, a instituição só se pronunciará ao final do inquérito policial.
Confira a carta de Mirtes Renata na íntegra:
“SOBRE O PERDÃO PEDIDO POR SARI
Eu não recebi qualquer pedido de desculpas. A carta de perdão foi dirigida à imprensa, o que me faz pensar que eu não era destinatária, mas sim a opinião pública com a qual ela se preocupa por mera vaidade e por ser esse um ano de eleição.
Eu não tenho rancor. Tenho saudade do meu filho. O sentido da vida de quem é mãe passa pelo cheiro do cabelo do filho ao acordar, pelo sorriso nas suas brincadeiras, pelo ‘mamãe’ quando precisa do colo e do abrigo de quem o trouxe ao mundo. Uma mãe, sem seu filho, sofre uma crise, não apenas de identidade, como também de existência. Quem sou eu sem Miguel? Ela tirou de mim o meu neguinho, minha vida, por quem eu trabalhava e acordava todos os dias.
Quando eu grito que quero justiça, isso significa que eu preciso que alguém assuma a minha dor, lute minha luta, seja o destilado da cólera que eu não quero e nem posso ser. Eu não tenho forças neste momento, não tenho chão. Não tenho vida!
Após poucos dias é desumano cobrar perdão de uma mãe que perdeu o filho dessa forma tão desprezível. Afinal, sabemos que ela não trataria assim o filho de uma amiga. Ela agiu assim com o meu filho, como se ele tivesse menos valor, como se ele pudesse sofrer qualquer tipo de violência por ser ‘filho da empregada’.
Perdoar pressupõe punição; do contrário, não há perdão, senão condescendência. A aplicação de uma pena será libertadora, abrandará o meu sofrimento, permitirá o meu recomeço e abrirá espaço para o que foi pedido: perdão. Antes disso, perdoar seria matar o Miguel novamente”.