Cozinheira negra é agredida por moradora de prédio de luxo em São Paulo, e denuncia racismo: “Negra estranha”; assista

As câmeras de segurança flagraram os golpes desferidos pela agressora

Racismo (1)

Uma moradora da rua Oscar Freire, área nobre de São Paulo, é acusada de agressão e injúria racial após dar tapas, chutes e puxões de cabelo em uma cozinheira negra que trabalhava no local. O caso ocorreu em outubro do ano passado, mas somente agora a Polícia Civil teve acesso às imagens de segurança do edifício, que registrou toda a ação.

Em um primeiro momento, Eliane Aparecida de Paula, estava sentada em um banco no lado externo do prédio. Segundo a Band News, ela aguardava um carro de aplicativo para voltar para casa, quando Patrícia Brito Debatin a interpelou. “Ela me aborda com uma frase muito difícil: ‘Que mulher esquisita, que negra estranha. O que essa negra está fazendo aqui?’ Eu tento dialogar com ela, em um primeiro momento, e ela continua com as ofensas“, contou a vítima ao canal de TV.

Depois disso, é possível ver pelo vídeo que Patrícia entra no hall do prédio e desbloqueia a porta para chegar nos elevadores. “Ela fala esse monte de coisas e sai. Quando eu a chamo e falo mais firme ela me dá um primeiro empurrão. Eu falo que isso é crime e que vou chamar a polícia. Eu penso que se ela subir, ela vai fugir. Quando ela abre a porta, eu decido fechar, porque ela teria que fazer o processo de novo. No momento que eu faço isso, ela fica muito furiosa“, continuou Eliane.

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As câmeras registraram as agressões. A vítima foi empurrada para a parede e recebeu muitos golpes da moradora, além de puxões de cabelo. Segundo a cozinheira, o zelador do prédio foi quem conseguiu separar as duas. Mesmo assim, Patrícia continuou visivelmente nervosa. Theodoro Balducci, advogado de Eliane, contou à Band que as imagens foram solicitadas menos de uma semana após o ocorrido, mas o condomínio não as forneceu espontaneamente, sendo necessária uma decisão judicial.

Eliane lamenta o ocorrido

Em entrevista à Universa, do UOL, Eliane deu mais detalhes sobre o episódio de racismo que sofreu. “Eu tentei explicar que o que ela estava fazendo era um crime e que estava me fazendo mal. Ela tentou me convencer que não era racismo e tinha amigas negras. E dizia que eu só queria causar, queria o dinheiro dela. Quando decidi falar com ela, eu não tinha esse sentimento de dizer ‘chega’, eu queria dizer que eu não poderia passar por aquilo. Perdi meu filho recentemente e só queria evitar mais aquela dor. Eu não tinha condições“, relembrou.

Em 29 de dezembro de 2020, a mulher perdeu seu filho de 23 anos, por causa de um acidente de carro. “Após a morte dele, tentei voltar a me reconstruir. Todos dias, eu acordo pelos meus outros dois filhos. Tenho um propósito de vida, todos os dias junto forças para estar de pé, junto muitas energias para fazer os pratos que faço com amor. Então, eu não tinha condições para lidar com mais aquilo“, lamentou.

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O episódio de violência, então, teve um peso ainda maior na vida da cozinheira. “A gente nasce negro, sofre muitos racismos, mas a gente não sabe e nem percebe. Quando começamos a ter informação, percebemos que uma pessoa negra normalmente sempre sofre racismo. Mas eu nunca havia sofrido um nível de violência como o desta situação. Fiquei pensando onde falhei, se eu deveria mesmo ter sentado naquele banco para pedir o carro. Senti que tinha feito algo. Mas eu estava ali só existindo, essa é verdade“, pontuou.

A agressão deixou traumas. Hoje, Elaine evita ficar sentada sozinha nas dependências dos condomínios em que trabalha e só transita pelos locais acompanhada pelos clientes. “Sinto muita dificuldade. Eu ainda estava tentando me reconstruir de outro trauma. Espero que o Judiciário faça um trabalho bem feito para que a sociedade seja educada. Palavras não convencem, mas exemplos, sim. Que o judiciário venha dar exemplo, independentemente do posicionamento financeiro das pessoas envolvidas. Quero receber um tratamento igual e digno“, observou ela.

Na última quinta-feira (31), Balducci entrou com uma representação por lesão corporal, que pode resultar de três meses a um ano de cadeia, e injúria racial, com previsão de um a três anos de detenção. No dia 1° de abril, a Polícia Civil instaurou um inquérito para investigar o caso.