Hugo Gloss

‘Fantástico’ revela palavras e expressões usadas como códigos de pedófilos para comentar em fotos de crianças nas redes

Reprodução/Globo

Neste domingo (7), o “Fantástico” exibiu uma reportagem que revela palavras-chave usadas como códigos de pedófilos. Segundo o jornalístico, os abusadores usam expressões, como “Perdoe, pequena” e “Errei, fui Raulzito”, para marcarem fotos de crianças que chamam a atenção deles nas redes sociais.

A princípio, os comentários parecem inofensivos. “Perdoe, pequena”, por exemplo, remete a uma fala do personagem Thanos em “Vingadores: Guerra Infinita”. A fala não tem nenhuma conotação sexual no filme. Já “Errei, fui Raulzito” faz referência ao influenciador Raulino de Oliveira Maciel, que foi preso em 2021 por crimes sexuais contra menores.

A equipe do jornalístico acompanhou salas de bate-papo e grupos de trocas de mensagens durante quatro meses. O influenciador Jonas de Carvalho revelou que se deu conta dos comentários enquanto mostrava a rotina com os filhos nas redes sociais. “Só que a internet é um perigo. Os comentários, às vezes, passam a ser maldade. Assédio, essa é a palavra. Algumas pessoas que me seguem começaram a me mandar o significado, eu não sabia. Dói na alma e o meu desabafo é no choro“, lamentou.

A prática criminosa de compartilhar imagens e vídeos de abuso sexual infantil ocorre desde a década de 1980, com o surgimento da internet. Para Thiago Tavares, presidente da Safernet Brasil, as tecnologias proporcionaram aos abusadores a monetização do conteúdo. “O fenômeno da comercialização, ou seja, você monetizar, você ganhar dinheiro de forma tão aberta e disseminada, como a gente está vendo acontecer hoje no Brasil, é um fenômeno muito recente“, declarou.

Criminosos ganham dinheiro com registros infantis e lives das vítimas. (Foto: Reprodução/Globo)

O “Fantástico” recebeu denúncias de abuso sexual contra crianças na internet, em que criminosos ganham dinheiro exibindo essas vítimas em lives para pedófilos e obedecendo aos pedidos do cliente. Em sites indicados pelos denunciantes, os usuários publicam anúncios sobre vendas de imagens de exploração sexual infantil.

Um dos anúncios informa: “O que eu faço é ilegal. Tenho 70 mil vídeos no meu acervo, se eu mostrar a cara eu me lasco, né?“. O criminoso também revelou que qualquer negociação tem que ser por meio do Telegram, aplicativo de mensagem em que ele ainda consegue permanecer anônimo.

Em outra conversa, uma mulher ofereceu ligar a câmera para mostrar a suposta filha, de 8 anos, durante 30 minutos, pelo valor de R$ 200. Mais uma vez, o ato teria de ser migrado para o Telegram. “Esses agressores usam plataformas que tenham uma maior audiência para depois iniciar um diálogo privado“, explicou Tavares. “Vendido e comercializado como se fosse uma feira livre, a ponto de crianças serem colocadas em situação de exploração sexual e tenham as imagens do abuso transmitidas ao vivo, via Pix“, acrescentou.

Bate-papos e grupos de mensagens foram acompanhados por 4 meses. (Foto: Reprodução/Globo)

A equipe de reportagem encerrou as conversas e não adquiriu qualquer material. Só em 2024, cinco mães foram presas no país por esse tipo de crime. De acordo com dados do International Center for Missing and Exploited Children (ICMEC), o Brasil é um dos países que mais compartilha material sexual de abuso infantil pela internet.

No ranking mundial, ele aparece em terceiro, perdendo apenas para México e Colômbia, em primeiro e segundo, respectivamente. Segundo os dados, há tanto pessoas produzindo esse tipo de material quanto consumindo. “Mais de 70% dos casos de abuso sexual no Brasil acontecem dentro de casa. Geralmente é o pai, o padrasto, o tio, o vizinho, um primo, alguém que tenha acesso direto à criança“, contou Tavares.

Alerta aos pais

Mônica Areal, delegada da Delegacia de Atendimento à Mulher, no Rio de Janeiro, alertou sobre a produção e compartilhamento do conteúdo. “Compartilhar essas imagens também é crime, ter essas imagens também é crime. Então, não ache que você vai se aproveitar. A polícia vai bater à sua porta de manhãzinha e você vai pra cadeia“, avisou.

Os especialistas ouvidos pelo “Fantástico” também sinalizaram aos pais os riscos de expor fotos e vídeos dos filhos na internet. “Se a tentação de postar foto do seu filho for irresistível, adote uma série de cuidados. Restrinja o acesso ao seu perfil apenas aos seus amigos; ao fotografar uma criança, use algum acessório, um chapéu, um boné, um óculos, até mesmo para evitar que essa foto seja utilizada para montagens em contextos pornográficos ou sexo explícito“, pontuou Tavares.

Ele acrescentou: “Crianças na piscina, dançando, em parquinhos, escorrendo, ou comendo alguns alimentos, tomando sorvete“. O uso da Inteligência Artificial também foi citada pelos especialistas. “Hoje, com a IA, por mais séria que você possa colocar a foto de seu filho, a IA vai dar movimento ao seu filho, vai fazer imagens, posições que você nunca colocou“, completou Wanderson Castilho, perito em crimes digitais.

O que dizem as redes sociais

Em nota, o Telegram informou que “modera ativamente conteúdo prejudicial em sua plataforma, incluindo materiais de abuso sexual infantil e aceita denúncias de usuários para remover tal conteúdo“. O comunicado afirmou, ainda, que “mais de 62 mil grupos e canais foram removidos do aplicativo por compartilharem esse tipo de conteúdo em junho“.

Já o TikTok disse que “tem uma abordagem de tolerância zero para conteúdo de abuso e exploração sexual infantil on-line e compartilhamento de material“. “Assim que identificado, este tipo de conteúdo é imediatamente removido, as contas encerradas e os casos reportados para órgãos responsáveis“, completou a plataforma.

Por sua vez, a Meta, responsável pelo Facebook, Instagram e WhatsApp, esclareceu que “não tolera conteúdos que explorem ou coloquem crianças em risco e que trabalha de forma proativa para eliminar esse tipo de material de suas plataformas“. “A empresa usa uma combinação de tecnologia e revisão humana para identificar e remover interações abusivas em seus serviços e coopera com autoridades locais nesta área“, finalizou. Para denunciar casos de abuso ou exploração sexual, ligue para o Disque 100 ou acesse o site www.denuncie.org.br

Assista à reportagem completa: 

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