Hugo Gloss

Mulher negra de 51 anos é pisada no pescoço e arrastada por policial em São Paulo; Vídeo exibido no ‘Fantástico’ causa revolta, e Dória se pronuncia sobre PM – Assista

(Foto: Reprodução/Globo)

Um caso exibido no “Fantástico” nesse domingo (12) comoveu e revoltou os telespectadores. Um policial foi flagrado pisando no pescoço de uma mulher negra de 51 anos, enquanto ela estava imobilizada no chão, no dia 30 de maio em Parelheiros, na zona sul de São Paulo. Em entrevista ao programa, a mulher revelou que ainda teve sua perna quebrada e negou as alegações do PM de que ela teria tentado agredi-lo com uma barra de ferro.

Viúva, com cinco filhos e dois netos, a comerciante que vive de um pequeno bar não quis se identificar com medo de que os policiais voltassem para se vingar. De acordo com seu depoimento, ela estava trabalhando quando um cliente chegou e ligou o som alto. O barulho incomodou os vizinhos, que ligaram para a polícia.

“Eu pedi que ele abaixasse um pouco o som e eu fiquei dentro do bar atendendo. Quando eu saí, tinha uma viatura mais à frente, parada, e um policial agredindo um amigo meu”, relembrou a senhora. “Aí eu fui pedir pro policial não bater mais nele porque ele tava desfalecido já, sentado no chão e o policial dando joelhada no rosto dele”, completou ela sobre a cena.

De acordo com a comerciante, assim que ela abordou os oficiais, já começou a ser agredida. “Eu pedi pro policial para parar. O policial me empurrou na grade do bar, me deu três socos. Ele foi me dar uma rasteira, para me derrubar, e quebrou a minha tíbia”, descreveu ela, sobre o osso da perna.

A partir daí, ela foi imobilizada no chão, com um dos PMs pisando no pescoço dela. Em um determinado momento, o policial chega a tirar o pé direito do chão e coloca todo o peso no pé esquerdo, que está no pescoço da mulher. “Eu [ficava] me debatendo e quanto mais me debatia mais ele apertava a botina no meu pescoço”, detalhou ela.

A cena não parou por ali. Na sequência, o oficial começou a algemar a senhora, enquanto a arrastava pelo asfalto até a calçada. Ali, ela continuou imobilizada por ele. “Ele colocou o joelho direito no meu pescoço e o esquerdo nas minhas costelas. Eu cheguei a desmaiar quatro vezes. Quando eu acordei já estava jogada na outra calçada do bar”, contou ao ‘Fantástico’. Assista:

O policial João Paulo, que pisou no pescoço da mulher, e seus colegas de trabalho registraram um boletim de ocorrência naquele dia por desacato, lesão corporal, desobediência e resistência. No relato deles, a comerciante foi classificada como “uma senhora descontrolada”, que estaria “utilizando uma barra de ferro para agredi-los”. De acordo com o B.O., ela ainda teria ameaçado os PMs com um rodo de limpeza.

Em entrevista ao programa, João Paulo não considerou que houve exagero em sua reação contra a mulher. “Meu parceiro que foi agredido por ela. Ela estava sendo contida e levada até a calçada. Não [houve excesso]. Ali foi um meio necessário”, declarou ele.

A declaração foi rebatida pela viúva, que foi direto para o hospital após o caso, ferida no rosto, nas costas e com a perna quebrada. Após ter alta, ela seguiu para a delegacia, onde ficou detida até o dia seguinte. “Ele alegou lá na delegacia que eu arranquei uma barra de ferro da minha grade e agredi ele. Não fui eu que arranquei essa barra de ferro. Quando eu acordei, eu vi essa barra de ferro na mão dele”, contou.

Um mês depois, a senhora ainda precisou passar por uma cirurgia na perna e levou dezesseis pontos. “O fato de ele ter machucado o meu rosto, fraturado a minha perna, que eu não sei se ela vai voltar a ser a mesma, eu supero. Mas o meu psicológico, eu não vou superar nunca na minha vida”, desabafou.

A senhora ainda está se locomovendo com o auxílio de muletas após a cirurgia (Foto: Reprodução/Globo)

O advogado da comerciante, Felipe Pires Morandini, afirmou que vai levar o caso à Justiça. “Nossos primeiros esforços serão no sentido de provar a inocência dela em juízo. Para isso temos as imagens, temos testemunhas e tomaremos todas as medidas que forem necessárias neste sentido“, garantiu. Confira a reportagem:

https://www.youtube.com/watch?v=MFzNkHDzF3A

As imagens mostradas pela TV lembraram a abordagem que levou à morte de George Floyd, nos Estados Unidos. Na ocasião, o policial Derek Chauvin ficou por mais de oito minutos com o joelho sobre o pescoço de Floyd, ignorando seus avisos de que não conseguia respirar. O caso provocou uma onda de protestos contra o racismo nos Estados Unidos e em alguns países da Europa.

Na web, muitas pessoas comentaram a semelhança dos episódios, revoltaram-se pela violência e lamentaram o sofrimento vivido pela comerciante. “Policial militar ESTRANGULA uma mulher negra de 51 anos com uma botina. O que aconteceu com George Floyd nos EUA acontece no Brasil todos os dias, com mulheres, homens, LGBTs e jovens negros. Vidas negras importam pra quem mesmo?”, questionou uma internauta. “Notícia do dia: Policial pisou no pescoço de uma mulher negra que já estava rendida aqui em SP. Vidas negras importam????”, perguntou a atriz Pathy Dejesus.

“No Brasil tem George Floyd há cada 23 minutos”, lamentou uma mulher. “Um policial pisando, suspendendo o corpo sobre o pescoço de uma mulher negra de 51 anos em SP e a arrastando no asfalto. Impossível não lembrar do caso George Floyd. O que vão dizer dessa vez? Que foi legítima defesa ‘imaginária’ de novo, que é mais um ‘caso isolado’ de sempre?”, desabafou a deputada federal Fernanda Melchionna.

“Fui informada pelos seguidores que a mulher negra que foi sufocada pela polícia pediu para não ser identificada por medo de represálias. Ok. Vamos pensar então o que isso nos informa senão que o Estado brasileiro fornece um total de zero direitos para pessoas pretas e pobres?”, declarou a ativista e escritora Winnie Bueno. “Um policial pisou no pescoço de uma mulher negra. Quando pesquiso sobre com algumas palavras chaves só encontro três notícias. Nenhuma com o nome dela. Escolha da vítima ou não, essa ausência do nome é mais uma violência em um Estado que não protege e silencia mulheres negras”, pontuou a influencer Lare.

Diante da repercussão, o governador de São Paulo, João Doria, usou as redes sociais para afirmar que os policiais militares flagrados agredindo a comerciante foram afastados do cargo. Ele ainda repudiou o episódio. “Os policiais militares que agrediram uma mulher em Parelheiros, na Capital de SP, já foram afastados e responderão a inquérito. As cenas exibidas no Fantástico causam repulsa. Inaceitável a conduta de violência desnecessária de alguns policiais. Não honram a qualidade da PM de SP”, declarou no Twitter.

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