Hugo Gloss

Brasileiras são resgatadas de rede de exploração sexual em Londres e revelam detalhes do pesadelo: “15 a 20 programas por dia”

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(Foto: Pixabay)

O tipo de história que mais parece um filme de terror… Em março de 2020, três brasileiras receberam uma “oportunidade” que parecia um sonho: a chance de estudar inglês na Inglaterra, com curso, acomodação e passagens pagas. No entanto, o intercâmbio se tornou um pesadelo quando o trio foi surpreendido por um casal britânico, que as manteve presas em um cotidiano de trabalho análogo à escravidão.

Segundo reportagem da BBC News Brasil, o caso, que é um exemplo claro dos graves riscos ligados a promessas fáceis de viagens e estudos no exterior, começou depois que as brasileiras, que tiveram suas identidades preservadas, chegaram à Inglaterra para um suposto curso de inglês. “Me venderam um sonho que virou um pesadelo”, declarou uma das vítimas.

Mesmo sem detalhes de como as jovens foram abordadas, a polícia britânica afirmou que o trio se tornou vítima de um lucrativo, abusivo e assustador esquema de tráfico humano. Em depoimentos à equipe de Escravidão Moderna e Exploração Infantil da Met Police, de Londres, uma delas relatou que, pouco após o início do curso de inglês, localizado em Manchester, ela foi “convocada” a viajar para Londres. O convite foi feito pela mesma mulher com quem havia negociado a bolsa, identificada como Shana Stanley.

Durante a conversa, a criminosa intimidou a vítima não identificada, informando-a que teria de assinar um contrato. O documento em questão forçava a brasileira a “vender seu corpo”. Aos investigadores, a jovem afirmou não ter alternativas e que assinou o documento com medo, já que Shana lhe disse que, caso contrário, ela “não poderia voltar para o Brasil”, “teria que viver nas ruas de Londres” e “nunca mais veria sua família”. A história se repetiu com outras duas brasileiras e uma jovem britânica.

A partir da assinatura, o terror começou. Durante os dias, as jovens tinham todos os seus passos monitorados por um celular e eram observadas 24 horas por uma câmera, que ficava escondida nos aposentos delas. Segundo relatos, elas eram constantemente ameaçadas a terem vídeos íntimos enviados para seus familiares caso “não fizessem o que foram pedidas”, pois todos os encontros sexuais eram filmados por Shana e seu parceiro, Hussain Ednanie. Além disso, as jovens tiveram seus passaportes, documentos e dinheiro apreendidos, e o contato com amigos proibido.

O controle sobre a vida das vítimas, no entanto, não parou por aí: pelo celular de trabalho, elas recebiam, através do WhatsApp, informações sobre horários de clientes. O aparelho servia, também, para monitorar os movimentos das jovens por GPS. Por algum tempo, elas foram obrigadas a irem acompanhadas até o curso de inglês, mas logo foram forçadas a abandonar as aulas para se dedicaram à prostituição.

No tempo de cativeiro, elas precisavam ganhar £500 (cerca de R$3.500) diariamente com programas e, em retorno, recebiam um pagamento semanal de £250 (cerca de R$ 1750) e outras £50 (cerca de R$ 350) para alimentação. Para alcançar a quantia, as vítimas eram forçadas a fazer sexo com cerca de 20 clientes diariamente.

O restante do valor era recolhido pelos traficantes de humanos, que alegaram que o dinheiro estava custeando a viagem que todas acreditavam ter ganhado gratuitamente. De acordo com a ONU, o tráfico humano afeta 2,5 milhões de pessoas todos os anos e movimenta mais de US$ 30 bilhões.

O fim da tortura

A investigação para dar fim ao pesadelo do trio de brasileiras começou em 2020, quando uma das vítima recorreu à polícia local, após uma discussão com sua captora, Stanley. Durante o embate, a vítima tentou contatar as autoridades, mas foi empurrada pela criminosa, que voltou a ameaçá-la. “Você assinou seu próprio atestado de morte”, teria dito Shana.

Na sequência, a brasileira conseguiu falar com a polícia, mostrou fotos da exploradora e obteve proteção das autoridades, além de incentivar o início das investigações contra seus sequestradores e abusadores. No mês seguinte à denúncia, em abril do ano passado, a polícia londrina finalmente conseguiu cumprir mandados de busca e apreensão em endereços do casal.

Nos locais, foram encontrados celulares, documentos, tabelas de preços e caixas de preservativos. Além disso, milhares de libras, todos depósitos feitos em dinheiro vivo, foram identificados nas contas bancárias de Stanley e Ednanie. “Graças a coragem e bravura das vítimas, conseguimos reunir evidências irrefutáveis que fizeram com que Edani e Stanley não tivessem outra opção a não ser se declarar culpados, o que impedirá que eles prejudiquem outras pessoas”, revelou o detetive Pete Brewster, um dos responsáveis pela investigação.

Após as buscas, os policiais conseguiram identificar uma das vítimas — uma jovem inglesa, que acreditava ter sido “escoltada” por uma agência de modelos e que, após receber presentes e ter despesas pagas pelo casal, se viu forçada a “pagar a dívida” e obrigada a se prostituir.

“Edani e Stanley atraíram vítimas com falsas promessas para manipulá-las e explorá-las para ganhos financeiros pessoais. Eles não tinham absolutamente nenhum respeito pelas vítimas ou seu bem-estar, inclusive fazendo-as trabalhar longas horas por muito pouco em troca — mesmo quando elas não se sentiam bem”, pontuou o detetive. “A única coisa que importava para eles era quanto dinheiro poderiam ganhar”, acrescentou.

A complexa investigação finalmente chegou ao fim em 9 de agosto deste ano, quando Shana Stanley, de 29 anos, e Edanie, de 31, confessaram seus crimes de controle de prostituição e organização de viagem com intuito de exploração. Os criminosos foram condenados e presos em seguida. O parceiro cruel recebeu uma sentença de 8 anos e Shana ficará atrás das grades por 3 anos e 7 meses.

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