Após ter se manifestado contra o governo de Jair Bolsonaro, a jogadora de vôlei de praia Carol Solberg foi denunciada nesta segunda-feira (28) pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD). Segundo o Globo Esporte, a atleta foi enquadrada nos artigos 191 e 258 do Código Brasileiro de Justiça Desportiva.
No último dia 20, Carol recebeu a medalha de bronze no Circuito Brasileiro Open de Vôlei de Praia. Na ocasião, quando entrevistada pelo SporTV 2, a atleta disse ao vivo: “Fora, Bolsonaro!”. O ato pode ser considerado uma infração ao regulamento da competição – o que pode lhe render uma multa de R$ 100 a R$ 100 mil. A segunda violação faz alusão a uma conduta “antidesportiva”, ou seja, “assumir qualquer conduta contrária à disciplina ou à ética desportiva não tipificada”, passível de uma “suspensão de uma a seis partidas, provas ou equivalentes”.
O Subprocurador Geral do Superior Tribunal de Justiça Desportiva do Voleibol, Wagner Dantas, encaminhou a denúncia para a secretaria do STJD. Ela será agora autuada e designada para a sessão de julgamento, que ainda não teve uma data marcada pelo STJD. No entanto, espera-se que isso aconteça nos próximos dias – o que depende da disponibilidade de auditores e da comissão que avaliará o caso. Carol também será intimada para apresentar sua defesa.
Assista ao vídeo aqui:
Carol Solberg manda o recado: #ForaBolsonaro pic.twitter.com/Uu9QtJmkyG
— Mídia NINJA (@MidiaNINJA) September 20, 2020
Com a manifestação de Solberg, a Confederação Brasileira de Voleibol (CBV), havia emitido uma nota em repúdio ao ato e se declarou contrária a manifestações de cunho político no meio esportivo: “O ato praticado neste domingo (20.09) pela atleta Carol Solberg em nada condiz com a atitude ética que os atletas devem sempre zelar”.
“Aproveitamos ainda para demonstrar toda nossa tristeza e insatisfação, tendo em vista que essa primeira etapa do CBVP OPEN 2020/2021, considerada um marco no retorno das competições dos esportes olímpicos, por tamanha importância, não poderia ser manchada por um ato totalmente impensado praticado pela referida atleta”, disse a instituição no comunicado.
A confederação continuou, destacando que “tomará todas as medidas cabíveis para que fatos como esses, que denigrem a imagem do esporte, não voltem mais a ser praticados“. O termo “denegrir” utilizado pela CBV, ainda é considerado racista, visto que confere um ar difamatório e negativo para algo que se torna negro.
Quanto ao uso do termo racista, a CBV apenas afirmou que “depois de tantos anos defendendo e liderando a seleção brasileira dentro de quadra na função de capitã, a atleta sabe que nunca houve e não há nenhum tipo de discriminação por parte da entidade”, segundo o UOL Esporte.
Repercussão do caso
O vídeo de Carol Solberg viralizou nas redes na semana passada e dividiu opiniões. Perfis que fazem oposição ao governo do atual presidente deram respaldo à fala. Já internautas pró-Bolsonaro pediram que o Banco do Brasil deixasse de patrocinar a jogadora. Isso, entretanto, não seria possível, já que a parceria nem sequer existe.
Durante o jogo, Carol apenas usou um top com a marca do banco estatal gravada porque, no Circuito Brasileiro de Vôlei de Praia, a parte de cima do uniforme é fornecido pelo organizador (no caso, a Confederação Brasileira de Vôlei) e de uso obrigatório às duplas. O Banco do Brasil é, há muitos anos, o patrocinador máster do vôlei brasileiro, em um contrato que termina no final do ano, e não patrocina Solberg, especificamente.
Confira a nota de repúdio da CBV na íntegra:
“A Confederação Brasileira de Voleibol (CBV), vem, através desta, expressar de forma veemente o seu repúdio sobre a utilização dos eventos organizados pela entidade para realização de quaisquer manifestações de cunho político.
O ato praticado neste domingo (20.09) pela atleta Carol Solberg durante a entrevista ocorrida ao fim da disputa de 3º e 4º lugar da primeira etapa do Circuito Brasileiro Open de Volei de Praia – Temporada 2020/2021, em nada condiz com a atitude ética que os atletas devem sempre zelar.
Aproveitamos ainda para demonstrar toda nossa tristeza e insatisfação, tendo em vista que essa primeira etapa do CBVP OPEN 2020/2021, considerada um marco no retorno das competições dos esportes olímpicos, por tamanha importância, não poderia ser manchada por um ato totalmente impensado praticado pela referida atleta.
Por fim, a CBV gostaria de destacar que tomará todas as medidas cabíveis para que fatos como esses, que denigrem a imagem do esporte, não voltem mais a ser praticados”.
Comissão de Atletas de Vôlei de Praia também se manifesta
Na manhã de 21 de setembro, a Comissão de Atletas de Vôlei de Praia (CNAVP) emitiu um comunicado sobre o caso, reforçando que lutará para que esse tipo de situação não se repita: “A Comissão Nacional de Atletas vem, através desta, ressaltar que não é favorável a nenhum tipo de manifestação de cunho político em competições esportivas. Por isso, a mesma lamenta o ato realizado pela atleta Carol Solberg neste domingo – em jogo válido pela primeira etapa do Circuito Brasileiro Open de Vôlei de Praia Temporada 2020/2021 – e lutaremos ao máximo para que este tipo de situação não aconteça novamente”.
Alvo de críticas, Carol se manifesta
Em entrevista concedida ao jornal O Globo, Solberg disse não se arrepender da manifestação, que ainda pode render punição da CBV. A jogadora, que tem sofrido ameaças de apoiadores do presidente nas redes sociais, avisou que teme “pela democracia”.
“Não me arrependo, nem um pouco. Foi totalmente espontâneo, um grito mesmo, uma coisa que está entalada há muito tempo, por conta das coisas que estão acontecendo no nosso país. Está no peito, na garganta… e sinto que nós atletas temos a obrigação de usar a nossa voz. E o momento em que estou em quadra é o momento que tenho voz. Como cidadã me sinto na obrigação de me manifestar e exercer a minha cidadania mesmo”, declarou a atleta.
“Amo o que eu faço, amo jogar vôlei, mas ser punida por me manifestar? Me sinto totalmente no meu direito de fazer isso. Teve outra história no vôlei, do Wallace, que não sofreu punição”, declarou ela, referindo-se ao apoio de Wallace de Souza e Maurício Souza, que há dois anos, posaram para fotos após uma partida no Mundial de Vôlei, na França, fazendo com as mãos o número 17, em referência ao PSL, antigo partido de Bolsonaro. Na ocasião, a CBV também repudiou o ato, mas não puniu os jogadores. “Sei que isso pode acontecer, mas acho errado. Estou esperando para falar sobre punição. Porque não tenho ideia do que vai acontecer”, finalizou Carol.
De acordo com o UOL, quando questionada sobre o caso de Wallace e Maurício, a assessoria de imprensa da CBV emitiu parte da nota que já havia publicado na época e reforçou: “A CBV repudia qualquer tipo de manifestação discriminatória, seja em qualquer esfera, e também não compactua com manifestação política. Porém, a entidade acredita na liberdade de expressão e, por isso, não se permite controlar as redes sociais pessoais dos atletas, componentes das comissões técnicas e funcionários da casa”.