Enquanto o skate brilhava nas Olimpíadas de Tóquio, por trás da narração, era a voz de Karen Jonz que dava o que falar. Em entrevista à Marie Claire, a renomada skatista brasileira recordou seus momentos virais como comentarista. Além disso, a estrela do esporte fez um sensível relato sobre já ter enfrentado transtornos alimentares após sentir-se incerta quanto a sua identidade de gênero.
Bulimia x Identidade de gênero
De acordo com Karen, as questões referentes a sua identidade surgiram ainda na adolescência. “Nunca tive nenhuma dúvida em relação à minha orientação sexual, mas tive bastante confusão de gênero, de identidade de gênero”, afirmou ela. “Aos 17 anos, eu também tinha bulimia, então tudo que era relacionado ao meu corpo era complicado”, revelou.
A skatista relatou que se sentia mais confortável longe de uma aparência mais “feminina”. “Sempre me atraí exclusivamente por homens. Mas isso era bem diferente em relação ao meu gênero, tinha muita confusão com a minha aparência. Gostava de parecer um homem”, disse Jonz. “Para me aproximar, queria ser igual. Queria passar despercebida como mulher, ser reconhecida pelas manobras e pela habilidade, não pela aparência. Era um jeito de me camuflar. Achava superbonito ser neutra, não parecer nem mulher nem homem”, continuou.
Foi neste período que Karen desenvolveu bulimia, enquanto se sentia incomodada e receosa de que seu corpo chamasse atenção. “Tive problemas em me tornar mulher. O distúrbio alimentar tinha muito a ver com o lance da bunda e do peito. Tinha vergonha de ter bunda grande. Aí o peito começou a cresceu e também não queria, amarrava eles”, explicou.
Até mesmo no universo do skate, esses pensamentos se intensificaram para a atleta. “E essas coisas me incomodavam também no skate, andar e ter uma bunda ali para ser observada. A bulimia surgiu bem em meio a essa confusão de gênero. Na minha cabeça, se fosse muito magra, a bunda não iria crescer, o peito sumiria e eu ficaria neutra”, relatou Jonz.
Karen recordou que teve de lidar com o transtorno alimentar por anos, até que conseguiu controlar essa condição. “Não tive nenhum tipo de ajuda ou acompanhamento para me curar da bulimia. Consegui superar sozinha. Passei anos da minha vida comendo e vomitando. Aí simplesmente chegou uma hora em que não quis mais, era ruim, não estava me fazendo bem e decidi parar”, mencionou. Entretanto, é importante ressaltar que bulimia é um transtorno alimentar muito sério, portanto, é essencial buscar algum acompanhamento profissional.
“Xerecou” na Olimpíadas
O nome de Karen Jonz virou assunto nas redes sociais no final de julho, quando ela comentava a transmissão do Skate Street feminino nos Jogos Olímpicos. No ar no canal SporTV, a atleta soltou um “xerecou” ao vivo e divertiu com o comentário inusitado. Segundo ela, a expressão apenas brotou em sua cabeça. “Posso dizer que sou espontânea, sim. No caso do ‘xerecou’, nunca tinha falado antes. Foi um neologismo que veio na minha cabeça na hora, nem pensei e soltei”, contou ela.
XERECOU NO CAMPEONATO pic.twitter.com/Rucr3BSKAE
— ma (@gelinhaaa) July 26, 2021
Parte do choque das pessoas, para Karen, se deve a uma mentalidade ainda sexista. “O poder feminino e uma vagina imponente ainda não são coisas facilmente assimiladas pelo patriarcado: as mulheres terem tanto destaque, falarem o que pensam e terem controle sobre os próprios corpos causa estranhamento”, refletiu.
Maternidade e questionamentos
Outro ponto importante da vida de Karen veio em 2016, quando ela deu à luz a pequena Sky, fruto de seu relacionamento com o músico Lucas Silveira, da banda Fresno. Hoje, a garotinha tem cinco anos de idade. Mesmo sendo tetracampeã mundial e uma das brasileiras pioneiras no cenário do skate, Jonz relata ter sido subestimada apenas por conta da maternidade.
“Depois que virei mãe, ouvi de um monte de gente que eu ‘já era’. O tempo todo a mãe que pratica skate – aliás, as mulheres em geral – têm que provar que podem continuar trabalhando tão bem quanto antes. Já fui diminuída por isso e sigo sendo”, disse ela. Com seu talento, Karen provou que todos estavam errados já no ano seguinte, em 2017, quando venceu a primeira etapa do campeonato brasileiro “Vert Battle”. Uma mulher realmente poderosa! Leia a entrevista na íntegra, clicando aqui.