Na última segunda-feira (25), a Justiça argentina acusou a médica brasileira Juliana Magalhães Mourão pela morte da modelo baiana Emmily Rodriguez, que caiu do sexto andar de um apartamento em Buenos Aires, em março de 2023.
De acordo com a imprensa local, Juliana é acusada de abandonar a amiga sem prestar socorro, mesmo sendo médica. Inicialmente, ela era apenas testemunha no caso da morte de Emmily, que faleceu após cair de uma altura de 21,5 metros.
“Durante todo o processo, a defesa evidenciou uma obsessão por manter Juliana como testemunha, porque era a única defesa de [Francisco] Sáenz Valiente [outro réu no caso]. Juliana tinha uma relação estável de amante do empresário. Era a única na qual ele confiava. O indiciamento rompe a estratégia da defesa e permite apontarmos para a nossa convicção de que a morte de Emmily foi um homicídio entre duas pessoas. Juliana não foi cúmplice, nem encobriu. Foi coautora”, afirmou Raquel Hermida, advogada do pai de Emmily, Aristides da Silva Gomes, à RFI.
Juliana será interrogada em 4 de dezembro e, até o momento, responde apenas por abandono de pessoa. No entanto, a defesa da família da modelo busca incluir outras acusações: “O caso de Juliana seria feminicídio e abuso sexual. Procuramos isso. Porém, mesmo se condenada por abandono de pessoa, uma médica pode perder o direito de exercer a profissão”.
O empresário argentino Francisco Sáenz Valiente, dono do apartamento de onde Emmily caiu, também foi acusado de abandono de pessoa. Ele havia sido detido por três semanas em abril de 2023, acusado de feminicídio, mas a Promotoria alterou a acusação em junho para homicídio culposo com fornecimento de estupefacientes e facilitação de local para consumo. Além disso, ele enfrenta acusações por porte ilegal de arma.
Com as novas movimentações no caso, Sáenz Valiente também foi acusado de abandono de pessoa por, segundo a Promotoria, não ter prestado socorro à vítima após o uso de drogas. “O indiciado organizou um encontro no seu domicílio particular, em coordenação com Juliana Magalhães Mourão, que facilitou a presença de mulheres para que lhe fornecessem serviços sexuais em troca de dinheiro. Nesse contexto, Sáenz Valiente facilitou cocaína e cocaína rosa, distribuída em pratos ou livros para que se consumissem as quantidades que desejassem”, detalha a ata de interrogatório à qual a RFI teve acesso.
“Entre as 7h e as 9h18 (horário da queda), continuou com o fornecimento de drogas e de bebidas alcóolicas à Emmily, apesar do grau de ausência de autodeterminação que ela possuía. E não deu assistência nem procurou a assistência médica que a danificada requeria”, diz o texto.
Na terça-feira (26), Sáenz Valiente pediu à Justiça que retire a tornozeleira eletrônica que usa desde junho de 2023. A decisão deve ser anunciada em até cinco dias úteis.
Entenda o caso
Emmily caiu do sexto andar do apartamento de Sáenz Valiente no dia 30 de março de 2023. Exames toxicológicos indicaram consumo de álcool, maconha, MDMA, cetamina e cocaína. A Promotoria argumenta que sua morte poderia ter sido evitada se ela tivesse recebido socorro adequado após apresentar sintomas de um lapso psíquico. Entre o início dos sintomas e sua morte, passaram-se mais de duas horas.
Testemunhos apontam que outras duas mulheres estavam no apartamento, mas Lía Figueroa Alves e Dafne Gutiérrez saíram antes da queda de Emmily. A acusação sustenta que “a danificada teve uma descompensação psiquiátrica que durou, pelo menos, duas horas, período durante o qual foi abandonada por Francisco Sáenz Valiente e por Juliana Mourão. Esta situação de perigo concreto na saúde da vítima, que atingiu um estado de excitação psicomotora criada pelo fornecimento de estupefacientes por parte do indiciado, determinou que Emmily caísse pela janela do sexto andar”.
“Durante o lapso de tempo no qual Emmily manteve esse estado de alteração psíquica, arriscado para si e para terceiros, tanto Sáenz Valiente quanto Magalhães Mourão decidiram continuar com a reunião sem pedir assistência médica necessária”, apontou a Promotoria. “Tudo isso transcorreu num contexto sexualizado no qual Emmily estava seminua no quarto de Sáenz Valiente, onde havia também preservativos usados, brinquedos sexuais, uma cama para massagens, entre outros elementos de conotação sexual. Saénz Valiente estava de cueca ou de calção com o tronco nu, enquanto escutavam música e consumiam drogas e álcool”, acrescentou.
Apesar do surto de Emmily, os dois mantiveram as atividades no apartamento e só buscaram ajuda às 9h09 e 9h13, quando vizinhos perceberam a situação e também acionaram as autoridades. “Emmily já estava num estado de desespero eufórico, de terror e de pranto, pedindo socorro aos gritos”, detalhou o documento. “As ações de auxílio concretas por parte de Francisco Sáenz Valiente e de Juliana Magalhães Mourão, ao serem tardias, privaram Emmily de uma assistência médica que poderia ter salvo a sua vida”, concluiu a acusação.
O Ministério Público também considerou a hipótese da família de Emmily, que diverge da Promotoria. “Foi um crime para se desfazerem de Emmily depois de um abuso sexual. Emmily não foi até o apartamento para ter relações sexuais. Francis Sáenz Valiente tinha uma obsessão por ela. Ela não quis ter sexo e isso a colocou numa situação na qual lhe injetam droga. Eles a colocaram num estado de alteração psiquiátrica. Ela não estava drogada quando chega ao apartamento e cai inconsciente”, explicou Hermida à RFI. “Se Emmily tivesse dado o consentimento, estaria viva”, afirmou.
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