Nesta quarta-feira (16), a Secretaria da Educação de São Paulo (Seduc-SP) anunciou o afastamento da diretora e da professora-mediadora da Escola Estadual Aníbal de Freitas, em Campinas, São Paulo.
Elizabeth Azevedo e Marinês foram responsáveis por repreender e disparar duras críticas ao pequeno Lucas, de 11 anos, depois do garoto sugerir que o colégio fizesse um trabalho com o tema LGBTQIA+. A decisão foi publicada nesta quinta-feira (17) na Imprensa Oficial do Estado. De acordo com o texto, Elizabeth e Marinês terão “atividades exclusivamente burocráticas“.
No dia anterior, a escola havia se pronunciado através de uma carta, no grupo de WhatsApp em que toda a situação ocorreu, lamentando. A Seduc afirmou que a diretora também enviou uma carta para a família da criança, “reafirmando a retratação e o compromisso de ações efetivas sobre o caso“. A Secretaria relatou ainda, em nota: “Também foi instituída uma comissão para apurar o caso pela Diretoria de Ensino e a conclusão será enviada à Pasta“. A família de Lucas registrou um boletim de ocorrência no último sábado (12).
Além disso, o Ministério Público de São Paulo (MP-SP) está apurando o caso. Um procedimento foi instaurado na terça-feira (15) e a escola recebeu um prazo de cinco dias para esclarecer o episódio. O promotor Rodrigo Augusto de Oliveira citou o artigo 5º da Constituição Federal, “que estabelece como livres a manifestação do pensamento e a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença“.
A Polícia Civil também investiga o acontecido com o estudante. A irmã de Lucas já foi ouvida pelas autoridades e repassou todas as mensagens para que a equipe do 7º Distrito Policial de Campinas possa analisá-las.
Entenda o caso
Em pleno mês de junho, época em que as pautas LGBTQIA+ ganham atenção especial, mais um caso de homofobia é registrado. Em Campinas, São Paulo, uma criança de apenas 11 anos precisou lidar com o preconceito e ignorância de pais de alunos e funcionários da Escola Estadual Aníbal de Freitas, após sugerir que um trabalho acadêmico tivesse como tema as vivências dessa comunidade em nossa sociedade. A história chegou ao conhecimento da Secretaria Estadual de Educação, que prometeu tomar as medidas cabíveis.
O caso aconteceu na última sexta-feira (11), e foi divulgado nas redes sociais no dia seguinte, graças a um post da irmã da criança. No grupo de WhatsApp da escola, o menino sugeriu como tema de um trabalho, o mês do Orgulho LGBTQIA+. Logo em seguida, pais de alunos e funcionários — que chegaram a se identificar como fazendo parte da diretoria — reagiram negativamente, pedindo para a mensagem ser deletada. “Sou mãe de aluno e esse mensagem acima é um absurdo”, disparou uma pessoa. “Tira essa pessoa do grupo, cada coisa que temos que ver”, reclamou outro. Um adulto chamou a atitude do aluno de “inapropriada” e afirmou que era uma questão de “se orientar”.
No Facebook, a irmã do garotinho explicou que descobriu o que estava acontecendo após encontrar o irmão chorando enquanto conversava com uma funcionária da escola pelo celular. “Eu nunca imaginei que um dia eu iria passar por isso na minha vida”, começou a mulher. “Ele foi massacrado com tanto preconceito, como se ele tivesse cometendo um crime. Uma senhora, que se diz coordenadora da escola, chamada Marinês, ligou para ele por volta das 20h30 da noite acabando com ele, falando para retirar o comentário que, no caso, foi uma ‘sugestão de estudo’, se não iria remover ele do grupo da escola. Falou para ele que era inapropriado, inadmissível, e que era um absurdo ele ter colocado no grupo, que ele precisava de tratamento”, detalhou.
Felizmente, a irmã conseguiu intervir, perguntou o que estava acontecendo para a criança e assumiu a conversa com a funcionária. “Perguntei quem era, porque achei mesmo que fosse algum pai de outra criança que não gostou e queria falar, mas não, era da escola, ligando e falando absurdos, jogando preconceito na cara do meu irmão que é apenas uma criança. Ela falou para mim o seguinte: ‘Você não acha um absurdo ele querer saber sobre o LGBT (sic)?’. Eu falei que não, pois aqui na minha casa nós não temos preconceito e já ensino o meu irmão a não ter também! Perguntei para ela se ele tivesse mandado uma sugestão de trabalho com o assunto ‘plantações’ se ela tinha ligado para ele e falado tanta coisa ruim do jeito que ela estava falando, vocês acreditam que ela falou que NÃO?!”, revoltou-se.
A irmã ainda reforçou o caráter inocente da sugestão do garotinho no grupo. “Cada um aqui sabe como criam os seus filhos, o meu irmão é somente um menino curioso, uma criança que tem muito o que aprender ainda. Ele não é homossexual e, mesmo que fosse, todos precisam de respeito. Ele só sugeriu um tema para estudo, a direção da escola acabou com ele, jogou tanto preconceito. Logo a escola que deveria ensinar e dar o exemplo”, destacou.
Em seu texto, a mulher ainda pedia que o caso ganhasse repercussão, justamente para afastar a funcionária preconceituosa, que sequer desculpou-se com a família e com o estudante. “Ela deveria ter ligado diretamente para os responsáveis pela criança e não coagir do jeito que ela fez, o meu irmão está triste! Ele já me pediu desculpa umas mil vezes, como se ele tivesse feito algo de errado, ele chora e eu choro junto!”, desabafou, acrescentando que o garotinho pediu para ser atendido por um psicólogo.
“Fiz um B.O. online, estou esperando eles me ligarem, mas queria avisar vocês, cuidado, fiquem sempre de olho, pois aquele que deveria cuidar e proteger uma criança, foi o primeiro a bater (falo isso referente ao grupo de escola) “, encerrou. Na segunda-feira (14), as advogadas que estão cuidando do caso ainda informaram que a funcionária da escola responsável pela ligação e identificada como Marinês, não é uma coordenadora, mas sim mediadora da instituição de educação. Segundo a Secretaria de Segurança Pública (SSP-SP), o boletim, registrado pela internet, foi direcionado ao 7º Distrito Policial, que ficará responsável por abrir ou não o inquérito.
Em nota ao G1, a Secretaria Estadual de Educação afirmou que “repudia qualquer tipo de preconceito dentro ou fora das escolas”. “Um supervisor de ensino será enviado amanhã à escola para apurar o caso e todas as medidas administrativas cabíveis serão tomadas. Equipe do Programa de Melhoria da Convivência e Proteção Escolar (Conviva SP) também será enviada para apoiar o estudante, sua família e a comunidade escolar”, escreveu a instituição, completando que o acompanhamento psicológico da criança também poderá ser feito na escola pelo programa Psicólogos na Educação.
“Como uma ação, a EE Aníbal de Freitas trabalha temas transversais, em parceria com a PUC Campinas, realizando diversas palestras relacionadas à temática LGBTQIA+, direcionadas à comunidade escolar. A administração regional e a direção da unidade estão à disposição dos pais ou responsáveis para quaisquer esclarecimentos”, finalizou a nota.
Manifestações de apoio ao estudante
Na terça-feira (15), a Escola Estadual Aníbal de Freitas abriu com cartazes em protesto contra os ataques homofóbicos no grupo. Na fachada do colégio, foram colocados papéis com dizeres que pediam mais respeito e menos preconceito: “Ou aceita ou respeita“, “Respeite as diferenças” e “Sinta orgulho de ser quem você é“.