A polêmica envolvendo o filme “Lindinhas” (“Cuties”), da Netflix, ganhou novos contornos no Brasil. Nesta segunda-feira (21), o governo federal pediu a suspensão da veiculação do premiado filme francês, após acusações do longa “hipersexualizar” crianças. A medida vem depois de semanas de críticas à plataforma de streaming, por conta da produção.
O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos pediu que a exibição do filme fosse suspensa no Brasil, além de solicitar a apuração da responsabilidade pela distribuição e oferta desse conteúdo. O pedido foi encaminhado à COPEIJ (Coordenação da Comissão Permanente da Infância e Juventude), do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais. Segundo o UOL, a ministra Damares Alves afirmou que pretende frear conteúdos que “coloquem as crianças em risco ou as exponham à erotização precoce”.
“Crianças e adolescentes são o bem mais precioso da nação e o mais vulnerável. É interesse de todos nós botarmos freio em conteúdos que coloquem as crianças em risco ou as exponham à erotização precoce. O governo do presidente Jair Bolsonaro não vai ficar parado nessa luta. Vamos tomar todas as medidas judiciais cabíveis. A nossa luta é para direitos humanos para todas as crianças do Brasil”, disse ela.
O secretário Maurício Cunha, da Secretaria Nacional de Direitos da Criança e do Adolescente (SNDCA), considerou que as cenas de danças da protagonista de “Lindinhas” e de outras personagens seriam “pornografia infantil”. “[O filme] apresenta pornografia infantil e múltiplas cenas com foco nas partes íntimas das meninas enquanto reproduzem movimentos eróticos durante a dança, se contorcem e simulam práticas sexuais”, pontuou o ofício assinado pela SNDCA.
“A SNDCA vê com extrema preocupação a perpetuação do conteúdo que, longe de ser entretenimento ou liberdade de expressão, na verdade, afronta e fragiliza a normativa nacional de proteção à infância e adolescência”, disse o texto. Apesar dos argumentos, “Lindinhas” não conta com nenhuma cena de sexo explícita, real ou simulada, e nem exibe órgãos sexuais de crianças. Entretanto, a postura das personagens deram o que falar.
Entenda a polêmica envolvendo o filme
“Lindinhas” conta a história de Amy, uma garota muçulmana de 11 anos que começa a descobrir novos hobbies e realidades quando entra para o grupo de dança da sua escola. As garotas da equipe vão contra os valores rigorosos da mãe da protagonista. Nesse contexto, algumas cenas foram taxadas por parte do público como “hipersexualizadas”.
Confira o trailer:
Com a divulgação, a reação do espectadores não foi das mais calorosas. Semanas atrás, a hashtag #CancelNetflix (“Cancelem a Netflix”) esteve entre os assuntos mais comentados do Twitter, rendendo uma série de críticas e ameaças de boicotes à empresa. Até mesmo petições online foram criadas para barrar o filme. Após a polêmica, a Netflix se manifestou e defendeu a permanência da produção no catálogo.
Em um comunicado à Variety, um porta-voz da Netflix explicou que “Lindinhas” seria justamente uma crítica social sobre esse assunto. “‘Lindinhas’ é uma crítica social sobre a sexualização de jovens crianças. É um filme premiado e uma história poderosa sobre a pressão que as jovens meninas enfrentam nas redes sociais e da sociedade, de modo geral, quando estão crescendo. Nós encorajamos qualquer um que se importe com esses assuntos importantes a assistir ao filme”, disse o texto.
Diretora do filme tenta justificar produção
A diretora francesa, Maïmouna Doucouré, revelou ao Deadline que até já recebeu ameaças de morte desde que “Lindinhas” foi divulgado pela Netflix. No entanto, num especial chamado “A história sobre Mignonnes”, ela contou que a trama é um retrato de sua vida. “Nossas garotas veem nas redes sociais que, quanto mais uma mulher é sexualizada nas redes, mais elas são bem-sucedidas… E sim, isso é perigoso”, disse ela.
Vencedora do Prêmio do Júri de direção no Festival Sundance deste ano por “Lindinhas”, a cineasta explicou como enxerga a trajetória da personagem de seu filme. “Amy acredita que ela pode encontrar liberdade naquele grupo de dançarinas e na hipersexualização delas. Mas isso é liberdade de verdade? Especialmente quando você é criança? É claro que não”, avaliou Doucouré. Assista ao vídeo aqui:
Na semana passada, durante o painel “10 Talents to Watch”, da UniFrance, Doucouré afirmou: “O mais importante é assistir ao filme e entender que nós temos a mesma luta”. A cineasta reforçou que sua intenção seria alertar as pessoas sobre o perigo dessa questão com as crianças. “Nós precisamos proteger nossas crianças. O que eu quero é abrir os olhos das pessoas para esse assunto e tentar corrigir isso”, defendeu ela, segundo a Variety.
Contudo, a diretora mostrou-se surpresa com a recepção negativa da narrativa. “Eu pensei que o filme seria aceito. Ele foi exibido em Sundance [Festival de Cinema] e foi assistido por norte-americanos. Eu me encontrei com o público e eles realmente viram que o filme era sobre uma questão universal”, assumiu ela. “Não é sobre a sociedade francesa – a hipersexualização de crianças acontece pelas redes sociais, e as redes sociais estão por todo mundo. Pessoas [em Sundance] concordaram com isso”, desabafou.