Sempre trazendo discussões pertinentes, o “Papo de Segunda” desta semana tratou de diversos assuntos em destaque nos últimos dias, como as manifestações nos Estados Unidos, que começaram após o assassinato de George Floyd, e os primeiros protestos no Brasil, contra o genocídio negro e a favor da democracia.
Um dos momentos mais poderosos, foi quando o apresentador Fábio Porchat perguntou para o músico Emicida se estávamos em um caminho sem volta, se ficar em casa não basta mais, se é a hora de ir para as ruas protestar. Em um discurso forte, o artista declarou que a população negra passa por situações revoltantes de violência, o tempo todo. “Eu acho que a gente vive uma série de situações insustentáveis, né? A gente agora tá com pouco mais de 15 ou 20 minutos de programa, não sei, mas olha a quantidade de coisas que a gente elencou, e a gente tá falando da história recente desse país. Se a gente for se aprofundar em questões estruturais, tem muito mais morte, muito mais violência, muito mais destruição , que está afetando a vida de outras pessoas que estão longe dos meios de comunicação, saca?”, iniciou.
Em seguida, Emicida relembrou o assassinato de crianças nas mãos da polícia. “Semana passada a gente tava aqui falando o quão destruidor de futuro, não só das pessoas pretas, mas do futuro desse país, era viver em um lugar onde uma criança de 14 anos está cumprindo sua quarentena em casa, e é alvejada por uma bala de um grupo de outras 72 que arrebentaram sua casa, sacou? Eu fiquei pensando aqui antes que eu nem sou o cara mais antigo desse programa, mas só no tempo que eu tô aqui, quantas crianças pretas foram mortas pelo estado brasileiro? Ágatha, Davi, João, semana passada João Pedro, e esses são os casos que a gente vê ganhar visibilidade”, refletiu. E acrescentou: “Se a gente vai pro norte, se a gente vai pro centro-oeste, e pega a situação das tribos indígenas, a gente tem situações mais desesperadoras do que essa, que já faz a gente chorar”.
O músico ainda falou sobre a impunidade em crimes tão revoltantes. “Sabe o que acontece com quem mata um inocente nesse país, principalmente quando veste uma farda? Nada, mano!”, afirmou. Emicida também refletiu sobre a diferença com a qual a mídia trata casos de racismo no Brasil, e lá fora. “Tem outra coisa que eu achei extremamente triste, a gente entrou aqui falando sobre imprensa, mas é muito triste que a imprensa brasileira, quando vai cobrir um caso de racismo internacional, se refira à cor da pele da vítima, se refira que ele foi assassinado por um policial. Quando a gente trata de caso doméstico, toda essa percepção some, e aí se trata esse tipo de assunto como se ele fosse uma grande suposição. E se alguém levanta esse ponto e fala ‘Existe uma situação que estruturalmente assassina pessoas pretas’, a gente recebe colunista dizendo que é ‘vitimista’, político imbecil reverberando esse mesmo tipo de discurso. Até nisso o vira-latismo do Brasil impera”, analisou.
“A gente só aceita debater o racismo se a gente for pautado pelos Estados Unidos. O racismo do Brasil pode seguir matando à vontade. Nadando de braçada. Eu não tenho mais nem palavra pra descrever como é a situação que a gente vive”, falou, indignado. Emicida lembrou das duas filhas, falando sobre sua preocupação sendo pai de duas meninas pretas, e voltou a falar da menina Ágatha Vitória Sales Félix, assassinada no ano passado durante operação policial no Complexo do Alemão, enquanto voltava com a mãe da escola. “Era pra esse país estar pegando fogo mesmo, e o fato dele não estar, fala tudo que uma pessoa preta tem que saber sobre ele. A gente está em solo inimigo, a gente tem que se proteger como a gente puder, porque a gente está por nossa conta e risco, nesse grande projeto assassino de preto que é o Brasil”, concluiu. Assista ao discurso abaixo:
"Só no tempo que eu estou aqui, quantas crianças pretas foram mortas pelo Estado brasileiro?" @Emicida #PapoDeSegundaNoGNT pic.twitter.com/x6z4LHgF32
— Canal GNT (@canalgnt) June 2, 2020