Nesta quarta-feira (21), o guarda civil municipal Cícero Hilário entrou com uma ação na 10ª Vara Cível de Santos por danos morais, após ser humilhado pelo desembargador Eduardo Almeida Prado Rocha de Siqueira. Em julho, enquanto fazia seu trabalho, o guarda foi desrespeitado e chamado de “analfabeto” pelo magistrado – que até mesmo lhe deu uma carteirada, dizendo “saiba com quem está se metendo”.
De acordo com o UOL, Cícero pede uma indenização de R$ 114 mil pelo episódio, que também circulou nas redes sociais. “Entendemos que o comportamento dele ao ser abordado pelo Guarda Municipal Cícero Hilário fugiu da normalidade e demonstrou que a sua intenção naquele momento era humilhar, constranger, inferiorizar e intimidar o Guarda Municipal que estava no exercício de suas funções”, declarou o representante de Hilário, Jefferson Douglas de Oliveira.
Para a defesa do agente, a ação por danos morais pode servir de alerta e ajudar no combate ao abuso de autoridade. “Infelizmente é mais comum do que imaginamos casos de abuso de autoridade, só que nem sempre a pessoa que se vê abusada procura os seus direitos”, reconheceu o advogado.
“Acreditamos que a repercussão que o caso tomou, a iniciativa do Conselho Nacional de Justiça e do Ministério Público em apurar o incidente, trazem mais segurança e esperança no combate ao abuso de autoridade, justamente por isso entendemos que a conduta do Sr. Eduardo Siqueira merece ser apurada tanto na esfera administrativa, como judiciária cível e criminal, para que sofra as consequência de seus atos”, completou Oliveira.
Segundo o UOL, o processo segue em tramitação normal. Procurado pela reportagem, o representante do desembargador Siqueira, Marcos Barone, afirmou que ainda não havia sido notificado sobre a ação.
Relembre o caso
O desembargador Eduardo Almeida Prado Rocha de Siqueira, do Tribunal de Justiça de São Paulo, foi flagrado na tarde de sábado, 18 de julho, humilhando um guarda civil municipal de Santos, no litoral do estado, após ser multado por não utilizar máscara facial de proteção enquanto caminhava na praia. Um vídeo que circulou nas redes sociais mostra o momento em que ele diz que o GCM não tem autoridade, fala que ele é “analfabeto” e ainda dá a “carteirada” de “saiba com quem está se metendo”.
No início da abordagem, o oficial educadamente pede para que o desembargador coloque a máscara, seguindo um decreto municipal. “Olha, eu, por hábito, não uso. Decreto não é lei”, dispara Eduardo, já alterado. Após uma segunda insistência do guarda, ele parte para a grosseria e falta de educação. “Outro dia aconteceu isso comigo, aí ele fez a multa, eu peguei, amassei e joguei na cara dele. O senhor quer que eu jogue na sua cara, então faz aqui”, ameaça.
Então, Siqueira segue debatendo e disparando ofensas ao GCM, liga para o Secretário de Segurança Pública do município, Sérgio Del Bel, na intenção de que ele “intimide” o guarda municipal e, por fim, aceita a multa apenas rasgá-la e jogá-la no chão. Assista às cenas aqui:
O caso teve uma grande repercussão nacional, até que, em 25 de agosto, o Conselho Nacional de Justiça anunciou a abertura um procedimento administrativo disciplinar para apurar a conduta do desembargador. Com a decisão, ele foi afastado das suas funções até o fim do processo, que também avaliará se houve a famosa “carteirada” durante sua atitude desrespeitosa.
“Não existe autoridade acima da lei e da Constituição. Ele [Eduardo] não falou ali como cidadão, ele falou como autoridade superior, agiu com muita prepotência, com muita arrogância, com muito autoritarismo, fugindo às regras da boa convivência e das regras estabelecidas, em primeiro lugar a defesa da vida e da saúde”, falou Humberto Martins, corregedor Nacional de Justiça. O ministro também elogiou a postura do guarda municipal de exigir que o desembargador utilizasse a máscara de proteção. “O policial estava em defesa de quê? De garantir a saúde e a vida das pessoas. Mais de 110 mil pessoas atingidas pela Covid”, apontou.
Mesmo com a investigação, Eduardo Almeida continuará sendo remunerado normalmente. O magistrado, por sua vez, emitiu uma nota lamentando o episódio. “Eu me exaltei, desmedidamente, com o guarda municipal Cícero Hilário, razão pela qual venho a público lhe pedir desculpas”, escreveu. Seu comportamento foi resultado de “uma profunda indignação com a série de confusões normativas que têm surgido durante a pandemia — como a edição de decretos municipais que contrariam a legislação federal — e às inúmeras abordagens ilegais e agressivas que recebi antes, que sem dúvida exaltam os ânimos”, alegou.