Nesta segunda-feira (24), a 2ª Vara Criminal de Guarapari (ES) inocentou a jovem Lívia Lima Simões Paiva Pereira, acusada de cortar parte do intestino do namorado, Gabriel Muniz Pickersgill. O caso aconteceu em janeiro de 2022, quando o rapaz foi encontrado com um corte profundo na barriga e os órgãos expostos, na Praia do Ermitão. As informações são do UOL.
Na época, a denúncia do Ministério Público, com indiciamento da Polícia Civil, afirmou que ela agiu “por motivação desconhecida e impulsionada pelo uso de drogas”. Lívia foi denunciada por lesão corporal grave, mas respondeu à ação em liberdade. Segundo o relatório da polícia, o corte pode ter sido feito com caco de vidro.
Já nesta semana, o juiz Edmilson Souza Santos considerou que não existem provas suficientes contra Lívia. Segundo ele, os hematomas na coxa, na mão e na cabeça da jovem “não se configuram como provas de que ela seja a culpada”. “Nesse sentido, dois médicos ouvidos em contraditório judicial afirmaram que o corte na mão poderia tanto ser de ataque quanto de defesa”, diz a sentença.
A participação de uma terceira pessoa no crime também não foi descartada pelas autoridades: “Considerando que o acesso ao parque se dá pela portaria, pelas pedras e pelo mar, não se pode afirmar que apenas o casal se encontrava no local de fato. É possível que terceira(s) pessoa(s) estivesse(m) no local, quiçá praticando o crime”.
Além de 12 testemunhas ouvidas pelos magistrado, o próprio Gabriel defendeu a namorada, alegando ter sido atacado por outra pessoa. “Não verifiquei a certeza necessária para condenação, sobretudo porque não houve testemunha de viso e a vítima informou que não foi a denunciada quem o atacou. De se ver, que as provas a alicerçar uma condenação, obrigatoriamente, têm que ser robustas, desprovidas de dúvida, pois, do contrário, há de se aplicar o necessário ‘in dubio pro reo’, decretando-se a absolvição”, solicitou o juiz.
“Concluo pela inexistência de provas a consubstanciar um decreto condenatório não podendo prosperar, portanto, a pretensão punitiva do Estado deduzida na denúncia”, completou Souza Santos em sua decisão.
Após a sentença, a defesa de Lívia Pereira comemorou a vitória. “Sabíamos que até mais do que inocente, ela é vítima de terceiros. Isso a gente conseguiu provar nos autos com os ferimentos que ela sofreu. Ela foi bastante ferida, fato que conseguimos provar nos autos. Também conseguimos provar, através de vídeos, que tiveram pelo menos oito pessoas naquela noite dentro do parque”, destacou o advogado Lécio Machado ao g1.
Lécio confirmou que o casal segue junto e, apesar da decisão favorável do juiz, ainda existe um “sentimento de revolta” pela demora e acusações. “Até hoje eles namoram, eles estão juntos, ele está bem de saúde. A revolta é por causa da mídia social que a atacou. As pessoas colocaram ela como uma mulher terrível, uma mulher péssima, alguém que pudesse ter machucado. Mas, na verdade, é uma moça que foi vítima tanto quanto ele e passou quase um ano e meio para a Lívia conseguir provar a inocência dela”, justificou.
Relembre o caso
O jovem foi encontrado com um corte profundo na barriga e parte do intestino exposto, na Praia do Ermitão, em Guarapari (ES). O caso ocorreu na madrugada do dia 16 de janeiro de 2022, mas somente veio a público no dia 30, após vazamento de informações nas redes sociais. Segundo a Polícia Civil, o jovem teria ido até o local com a namorada para celebrar uma viagem de estudos que faria para fora do país.
De acordo com as imagens de câmeras de segurança, obtidas pelo g1, a dupla chegou à praia por volta das 20h do dia 15 de janeiro. Em outro vídeo, é possível ver o estudante sendo resgatado às 6h do dia seguinte. Ele foi socorrido pelo SAMU e levado, em estado grave, ao Hospital Estadual de Urgência e Emergência, em Vitória, onde passou por cirurgia.
Vídeos mostram casal chegando a praia de Guarapari e jovem sendo socorrido 🎥 Câmeras de videomonitoramento do parque registraram momentos antes e depois do jovem de 21 anos ter a barriga cortada e parte do intestino exposta. Assista: pic.twitter.com/pToS4rJhez
— A Gazeta ES (@AGazetaES) February 2, 2022
Em depoimento prestado à polícia, a namorada da vítima revelou que ambos “apagaram” após uso de droga e álcool. Ela declarou não lembrar do que ocorreu depois disso. Familiares dos jovens alegam que a dupla foi atacada, ferida e roubada por terceiros durante o “luau a dois”.
Em fevereiro, o prontuário médico, obtido pelo g1 e pela TV Gazeta, apontou vestígios de dosagem alta de fentanil no sangue da vítima. A substância – um anestésico e analgésico opioide de uso controlado – é 50 vezes mais potente que a heroína e 100 vezes mais forte que a morfina. “[O fentanil] Pode gerar uma sedação, passa mesmo uma euforia seguida de relaxamento muscular intenso. Numa única dose, ela pode matar”, alertou a psiquiatra Carolina Coser, à reportagem.
Com a repercussão e após se recuperar, Gabriel Muniz rebateu as acusações do Ministério Público e afirmou que a namorada não foi a autora das agressões. “É óbvio que minha namorada não tem nada a ver com isso, ela, assim como eu, é vítima desse acontecimento e fica claro que tinha uma terceira pessoa ali que fez isso com nós dois […] A gente foi roubado, isso é óbvio, é um fato, infelizmente isso parece que não foi nem levado em conta. Foi roubado de mim um celular e uma caixinha de som, e a minha namorada tinha na bolsa R$ 80, que foram deixados eu acho R$ 4 ou R$ 6 espalhados na areia”, relatou ele.
Muniz também apontou uma aparente “falha” na investigação da Polícia Civil. Para ele, os ferimentos de Lívia deveriam mostrar que, na verdade, ela também foi uma vítima e não a agressora. O estudante afirmou, ainda, que há um espaço dentro do Parque Morro da Pescaria, onde tudo aconteceu, em que seria possível sair sem ser registrado por câmeras. No relato, ele argumentou que a pessoa que os atacou provavelmente fugiu por esse local. Leia e assista ao vídeo, clicando aqui.