Os policiais militares que agrediram o jovem negro Matheus Fernandes Biondi, de 18 anos, dentro do Ilha Plaza Shopping prestaram depoimento nessa segunda-feira (10) na 37ª Delegacia de Polícia, no Rio de Janeiro. Em suas versões, eles tentaram explicar o motivo por trás da abordagem ao garoto.
De acordo com os agentes da polícia, a agressão não teria sido motivada por racismo e, sim, porque o rapaz estava usando um boné do super-herói da Marvel, Hulk. Os PMs alegaram que o item seria uma alusão ao traficante Gilberto Coelho de Oliveira, que é apelidado pelo alter ego de Bruce Banner.
“Eles (policiais) disseram que desconfiaram do Matheus não pelo fato de ele ser negro, mas porque usava um boné que fazia referência ao Hulk, alcunha de um traficante também conhecido como Gil”, explicou o delegado Marcus Henrique, titular da 37ª DP, ao ‘Jornal Extra’.
Ainda segundo o delegado, os oficiais disseram que Matheus teria encarado ambos quando passou e que eles teriam suspeitado de um volume na cintura do entregador — que depois foi confirmado ser apenas a carteira do rapaz. No depoimento, eles ainda declararam que estavam sendo filmados e ficaram com medo de que descobrissem que eles eram militares.
O caso aconteceu na semana passada, quando Matheus foi tentar trocar o relógio que havia comprado para dar de presente no Dia dos Pais. Nas imagens do circuito de segurança da loja Renner, onde Matheus tentava trocar a peça, é possível ver que ele foi seguido por dois homens vestindo roupas comuns.
Em seguida, ele já começa a ser arrastado agressivamente pelo indivíduo que vestia uma camisa vermelha até saírem do estabelecimento. “Eu comecei a gritar que eu não sou ladrão, que você estava me confundindo, que eu estou aqui todo dia trabalhando. Eu não era ladrão e eles estavam me tratando como um”, relatou o rapaz para o JN.
Já na saída de emergência do shopping, o jovem começou a ser agredido, sendo que, neste momento, um segurança uniformizado acompanhou tudo e não prestou qualquer socorro. “O de camisa vermelha me deu uma banda e me imobilizou. Nisso que ele me imobilizou, ele sacou a arma e botou na minha cabeça”, recordou Matheus. Felizmente, um amigo do rapaz, que também trabalha como entregador de um restaurante do shopping, o encontrou e mobilizou clientes sobre o que estava acontecendo ali.
Nas gravações amadoras é possível ouvir a voz de uma mulher: “Solta ele! Tem que esperar. Não é assim que vocês têm que tratar ele não!”. Apenas quando o caso ganhou essa proporção que o jovem finalmente foi liberado. Matheus chegou a mostrar a nota fiscal do presente e falou que nunca teve esse tipo de problema no shopping quando entrava com a mochila do aplicativo de delivery para o qual trabalha. Ao aparecer como um cliente comum e com a embalagem do relógio nas mãos, viveu um grande trauma…
DELEGADO DEVE ENQUADRAR COMO CRIME DE RACISMO CASO DO JOVEM AGREDIDO NO ILHA PLAZA
O jovem Matheus Fernandes, de 18 anos, que denunciou, na quinta (6), ter sido agredido por dois homens no Ilha Plaza quando ele teria ido na loja Renner trocar um relógio que havia comprado (+) pic.twitter.com/kCqX3scBA1— Ilha Notícias (@ilhanoticias) August 8, 2020
Os dois homens que aparecem nos vídeos viralizados nas redes sociais não tiveram seus nomes completos revelados, mas foram identificados como os policiais militares Esaú e Silva, que trabalhavam para uma prestadora de serviços do shopping. Ao “Jornal Nacional”, a Polícia Militar informou que a Corregedoria já abriu uma apuração sumária para verificar a conduta da dupla.
Matheus prestou queixa na delegacia na semana passada e deu depoimento durante uma hora. “Tudo indica que o Matheus sofreu essa violência em razão da cor da sua pele. Por isso, a polícia tipificou esse fato como crime de racismo, pena de reclusão de um a três anos”, afirmou o delegado Marcus Henrique Alves. Para o “Jornal Nacional”, Dona Alice, mãe do jovem, desabafou sobre o caso e a dor de ver o sofrimento do filho.
“Eu posso ir no shopping, eu posso mexer em todas as roupas, eu posso comprar o que eu quiser. Eu posso, inclusive, provar as coisas de graça. Agora, se ele está sozinho, ele não pode fazer nada disso, como foi o que aconteceu. Ele sozinho não pode comprar um relógio. Será que sempre vai ter que estar com a mãe do lado? Tem que estar com alguém do lado, alguém branco?”, indagou.
O Ilha Plaza Shopping enviou uma nota para o telejornal dizendo que “repudia qualquer tipo de violência ou discriminação, lamenta profundamente o ocorrido e se solidariza com Matheus”. A empresa declarou que os homens no vídeo não fazem parte do seu quadro de funcionários e o comportamento inerte do segurança uniformizado no vídeo foi uma tentativa de contornar a situação pacificamente.
Após os novos desdobramentos, a loja Renner, em que Matheus Fernandes foi abordado inicialmente, declarou que espera que o shopping assuma sua responsabilidade no episódio e tome atitudes para que isso não se repita no futuro. “Aguardamos que o shopping forneça ao Matheus todo o apoio necessário neste momento e que peça desculpas pelo ocorrido. Em solidariedade ao seu cliente, a Renner também se colocou à disposição da família para acompanhar o caso”, anunciou.
“A loja reafirma que lamenta profundamente a agressão sofrida pelo Matheus. As investigações estão confirmando que a Renner não tem qualquer responsabilidade em relação ao episódio. A empresa reforça que não compactua com qualquer forma de violência e discriminação. A Renner é uma marca que valoriza a diversidade, que se inspira na igualdade, na pluralidade e no respeito”, finalizou. Assista à reportagem completa clicando aqui!