CPI da Covid: Intérprete de libras se emociona com depoimento de jovem órfã, e precisa ser substituído ao vivo; assista

CPI da Covid (Reprodução/G1)

A CPI da Covid passou por um dia emocionante e desolador nesta segunda-feira (18). A comissão se dedicou a ouvir pessoas que tiveram ou perderam familiares para o vírus. Entre os perfis variados que estavam no local, um caso ficou marcado: o de Giovanna Gomes Mendes da Silva, de 19 anos. Enquanto a jovem contava sua história aos senadores, o intérprete de libras que estava acompanhando a sessão não conseguiu finalizar a tradução e teve que ser substituído por um colega.

“Eu, meus pais e minha irmã, nós éramos muito unidos, quem conhece sabe, onde a gente estava, nós estávamos juntos. Então, quando meus pais faleceram, a gente perdeu as coisas que a gente mais amava. E eu precisava da minha irmã e ela precisava de mim. Eu me apoiei nela, e ela se apoiou em mim”, disse Giovana, que ficou com a guarda da irmã mais nova, de apenas 10 anos de idade.

Neste momento, a jovem precisou interromper a fala, pediu desculpas e o intérprete, visivelmente sem condições de continuar, anunciou que precisaria ser substituído. “A partir daí eu pensei que não poderia mais ficar sem ela, assim como ela não poderia ficar sem mim”, disse Giovana, já com outro tradutor em cena. Assista ao momento em que outro profissional assume o trabalho:

 

Na fala, a jovem descreveu que os pais tinham comorbidades e afirmou que encontrou dificuldades para o tratamento dos dois. Enquanto a mãe era transplantada e precisava de hemodiálise, o pai sofria de câncer. “A minha mãe era transplantada e até conseguir a doação de rim, vivemos uma tempestade. E quando pensávamos que voltaríamos a uma vida normal, veio essa outra tempestade da Covid. Por ela ser transplantada, o quadro de saúde agravou bastante. Inclusive, quando ela estava com o oxigênio, eu não sei se o nome é máscara concentradora, mas ela passou uma noite com essa máscara furada. Então, acho que isso, com certeza, deve ter agravado o quadro de saúde dela. Tanto que esse detalhe quem percebeu fui eu que estava lá. Trocaram, mas de qualquer forma o quadro dela acabou se agravando. Ela passou oito dias intubada, até que veio a óbito”, contou.

“Meus pais estavam internados no mesmo hospital. Meu pai se recuperou da Covid, mas ele tinha câncer e piorou disso em seguida. Então, quando ele saiu do tratamento da Covid, ele foi internado de novo, porque o câncer dele tinha se generalizado por todo o corpo, não tinha mais nem como começar o tratamento. Dois dias depois que a minha mãe faleceu, ele voltou a ser internado e eu não pude nem chorar a morte dela para mostrar que estava tudo bem, mostrar força [para ele]. Então, ele passou acho que 13 dias internado e veio a óbito também, foi uma diferença de 14 dias do meu pai pra minha mãe”, continuou, com a voz embargada pelas lágrimas.

Intérprete de libras se emociona e precisa ser substituído na CPI da Covid (Foto: Reprodução/ Twitter)
Intérprete de libras se emocionou e precisou ser substituído na CPI da Covid (Foto: Reprodução/ Twitter)

Giovanna lembrou os impactos que as perdas causaram a ela e à irmã, e atribuiu a responsabilidade ao governo federal: “O governo tem responsabilidade por essas vidas. Assim que tudo aconteceu, eu senti dois impactos: tivemos um impacto emocional e também o financeiro. Emocional porque diante do contexto, de tudo que aconteceu, a gente não estava bem psicologicamente, assim como a gente não está até hoje. E financeiro porque a gente tinha os dois esteios da nossa vida, os nossos pilares, as pessoas que cuidavam da gente, que sustentavam, que faziam tudo, né? Passamos a ter a responsabilidade de nos sustentar. Pessoas próximas, familiares e amigos da minha mãe que, com o pouco que tinham, passaram a ajudar a gente”. Assista:

https://twitter.com/whatwouldlbdo/status/1450208363250429962

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Além de Giovanna, ainda foram ouvidos Katia Shirlene Castilho dos Santos, que perdeu os pais para a Covid, Márcio Antonio do Nascimento Silva, que perdeu o filho, e Mayra Pires Lima, que perdeu a irmã para o coronavírus. “A dor é grande, mas a vontade de justiça é maior. Estou aqui hoje para representar as várias famílias que passaram pela dor que passamos. É por isso que estou tão emocionada de estar aqui. São vidas, sonhos, histórias encerradas por tantas negligências. E nós queremos justiça. O sangue de cada uma das vítimas escorre nas mãos de cada um que subestimou o vírus”, afirmou Katia.

Ela ainda fez um apelo emocionado à população: “Tome a vacina. Por favor, aproveite essa oportunidade. Meus pais não tiveram essa oportunidade e poderiam estar aqui conosco ainda hoje. Por favor, tomem a vacina”.

Mayra é enfermeira e perdeu a irmã, que deixou quatro filhos, no auge do colapso da saúde pública em Manaus, quando faltou oxigênio em janeiro deste ano. “Em cinco dias de sintomas, na fase inflamatória da doença, ela precisava de UTI, e, infelizmente, a UTI demorou dez dias enquanto ela estava no hospital. A cidade de Manaus virou um deserto. As únicas pessoas que andavam em Manaus eram os profissionais de saúde, a polícia e os serviços essenciais, porque, se a população toda adoece, você pode mandar uma grande quantidade de oxigênio que você não vai resolver”, lembrou ela, segundo o G1.

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Já Márcio cobrou um pedido de desculpas do presidente Jair Bolsonaro: “Eu acho que nós merecíamos um pedido de desculpa da maior autoridade do país. Porque não é questão política – se é de um partido, se é de outro. Nós estamos falando de vidas de pessoas. Cada depoimento aqui, eu acho que, em cada depoimento, um sentiu o depoimento do outro e acrescentou o que o outro tinha para falar, entendeu? Então, a nossa dor não é mimimi, nós não somos palhaços, entendeu? É real, sabe?”.

Ainda de acordo com o G1, ao longo dos depoimentos houve uma série de críticas ao comportamento de Bolsonaro, que durante a pandemia deu declarações que contrariavam a ciência, como críticas ao uso de máscara e afirmações contra a vacinação, ambos aconselhados pela Organização Mundial da Saúde. Neste momento, o país soma mais de 603 mil mortos pela Covid e 21,6 milhões de casos confirmados. A leitura do relatório final da CPI da Pandemia foi adiada para a próxima quarta-feira (20).